Entenda a situação delicada do Governo de Lula e a crise na relação com o Congresso Nacional após novos conflitos - Foto: Agência Brasil
Entenda a situação delicada do Governo de Lula e a crise na relação com o Congresso Nacional após novos conflitos - Foto: Agência Brasil

Brasília - O terceiro mandato do presidente Lula (PT) atravessa um dos momentos mais delicados na relação com o Congresso Nacional. Após sucessivas rusgas com o Senado, agora a crise se aprofunda também na Câmara dos Deputados, onde o presidente da Casa, Motta (Republicanos-PB), anunciou publicamente o rompimento com o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ). O gesto, segundo interlocutores, cristaliza um desgaste que vinha se acumulando nas últimas semanas e consolida um ambiente de desconfiança generalizada entre Executivo e Legislativo.

Motta afirmou que “não tem mais interesse” em manter qualquer tipo de relação com Lindbergh, passando a tratar com ele apenas de maneira estritamente institucional. Aliados do presidente da Câmara relatam incômodo crescente com o comportamento do petista, considerado exaltado nas reuniões e, principalmente, crítico duro da condução da Casa em votações sensíveis. Lindbergh, dizem, teria atuado como uma espécie de “líder informal do governo”, extrapolando sua função de comandante da bancada do PT.

Em resposta, o petista classificou a reação de Motta como “imatura” e afirmou que política “não é um clube de amigos”. Ele também devolveu a crítica, responsabilizando o próprio presidente da Câmara pelos ruídos com o governo em temas como o decreto do IOF, a PEC da Blindagem e a escolha de Guilherme Derrite (PP-SP) — secretário de Tarcísio de Freitas e potencial adversário de Lula em 2026 — como relator do projeto antifacção enviado pelo Executivo.

A escolha do relator, que produziu um texto duramente criticado pelo Planalto, agravou o clima. O governo orientou voto contra a proposta, mas saiu derrotado. O desgaste se irradiou pela Câmara, com líderes do centrão acusando o Executivo de narrativas falsas e ataques à Casa. Paralelamente, reclamam de promessas não cumpridas em cargos e execução orçamentária, além de acúmulo de tensões sobre projetos estratégicos.

No Senado

O cenário, porém, não é isolado. No Senado, o presidente Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) rompeu com o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), após Lula indicar Jorge Messias para o STF — contrariando setores que defendiam o nome de Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Horas depois do anúncio, Alcolumbre pautou uma “pauta-bomba” e avisou aliados que atuará contra a escolha do presidente.

O duplo rompimento — Senado e Câmara — explode em um momento político de alta sensibilidade: a prisão em regime fechado do ex-presidente Jair Bolsonaro. O movimento reacendeu discussões sobre anistia e fez a oposição reorganizar sua narrativa. O PL, maior bancada da Câmara, discute agora estratégias para blindar Bolsonaro e pressionar o governo. O Parlamento, fragilizado nas relações com o Planalto, hoje é uma incógnita sobre como reagirá a pressões vindas das ruas e de grupos bolsonaristas.

Sem maioria sólida

No centro do conflito, Lindbergh voltou ao foco. Na Câmara, passou a ser ironicamente chamado de “procurador da Casa”, pela recorrente prática de judicializar decisões internas no STF. O incômodo cresceu a ponto de Motta considerar insustentável manter diálogo político com o líder petista — um dos responsáveis, ironicamente, por articular o apoio do PT à eleição do próprio Motta no início do ano.

Sem maioria sólida na Câmara e com pontes abaladas no Senado, o governo Lula encara um teste de governabilidade. A tensão simultânea com os chefes das duas Casas legislativas, raro mesmo em momentos de disputa política intensa, revela um Congresso mais autônomo, reativo e disposto a impor sua agenda. Para analistas, o Planalto perdeu capacidade de coordenação e enfrenta agora um desafio central: reconstruir diálogo antes que a crise se converta em paralisia institucional em 2026, ano eleitoral decisivo.

“Afago” de Messias sai pela culatra e Alcolumbre esfria análise da indicação

A indicação do advogado-geral da União, Jorge Messias, para o STF (Supremo Tribunal Federal) abriu uma nova frente de tensão entre o governo Lula e o Senado. Ontem (24), o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP), divulgou nota protocolar em resposta a um elogio público feito por Messias. Sem citar o indicado de Lula, Alcolumbre afirmou apenas que tomou ciência da manifestação e que a sabatina ocorrerá “no momento oportuno”, com “absoluta normalidade” e total liberdade de voto aos senadores.

Nos bastidores, porém, a escolha de Lula não agradou o presidente do Senado, que defendia o nome do colega Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para a vaga deixada por Luís Roberto Barroso em outubro. A irritação tornou-se explícita após Messias publicar texto exaltando o papel institucional de Alcolumbre, numa tentativa de distensionar o ambiente. O gesto, contudo, não surtiu efeito.

Além da resistência da cúpula do Senado, Messias enfrenta críticas da oposição, que o considera “mais petista do que evangélico”, e de movimentos identitários, que esperavam a indicação de uma mulher negra para o STF — especialmente após Lula anunciar o nome justamente no Dia da Consciência Negra, o que elevou o tom das reclamações.

O líder do PL no Senado, Carlos Portinho, já antecipou que a oposição atuará com rigor na sabatina. Ele lembrou o placar apertado da recondução de Paulo Gonet para a PGR e afirmou que Messias deve contar prioritariamente com os votos da base governista.