
Cascavel - Ainda longe de um final, a novela do transporte público de Cascavel segue ganhando desdobramentos. Com contratos temporários e um sistema que parece funcionar no improviso, o Município já se prepara para mais um aditivo no contrato temporário, já que a licitação da nova concessão segue emperrada e sem data para ser realizada. Do outro lado, os usuários precisam arcar com os ônus de uma concessão que ainda não é consenso entre o Município, empresas e trabalhadores, utilizando um sistema com uma frota que, embora “em boas condições“, já ultrapassou a idade média recomendada.
O contrato original, que terminou em 2022, previa uma frota com idade máxima de oito anos. No entanto, sem a nova licitação, o Município precisou firmar um contrato temporário e sem qualquer exigência nesse quesito. Resultado? Hoje, a frota circulante tem idade média de 10 anos. “Ela está um pouquinho, não vou dizer defasada, mas um pouquinho atrasada”, admite a nova presidente da Transitar, Laura Rossi Leite.
A justificativa para a falta de exigência de renovação de frota é financeira. Segundo Laura Rossi, caso o Município exigisse a renovação da frota em um contrato de apenas um ano, não seria viável para as empresas.
R$ 20 milhões
A estimativa é que a renovação da frota custaria cerca de R$ 20 milhões. “O contrato tem vigência até dia 30 de junho de 2025. Então ficaria bastante difícil de a gente exigir que eles mantenham uma frota mais nova a partir do momento que eles teriam um ano só para se reembolsar desse investimento. E se o Município fosse subsidiar isso, ficaria fora de cogitação porque o valor seria muito grande. A gente não tem condição de fazer com que essa frota seja renovada. Mas o fato é que os ônibus estão funcionando, eles têm feito manutenções preventivas; eles estão rodando com qualidade e com segurança. Então a gente tem essa preocupação, que pese sejam ônibus um pouco mais antigos, mas eles estão em plenas condições de funcionar”, afirmou.
Por conta disso, o Município decidiu esperar a nova concessão ser finalizada para que a frota seja renovada. “Temos a expectativa de que a nova empresa que vencer a licitação venha com uma frota nova. Então, investir agora talvez não seja produtivo”, completou Rossi.
Elétricos que custaram R$ 43 mi “tampam buraco” da frota velha enquanto licitação segue enroscada
Em meio a esse impasse do transporte público, a Prefeitura de Cascavel apostou nos ônibus elétricos como solução parcial. Com 15 unidades adquiridas por R$ 43 milhões e um eletroterminal de R$ 9 milhões, os veículos que foram adquiridos, já com olhos para a nova concessão, estão em operação desde agosto do ano passado. No entanto, quem arca com os custos ainda é o próprio Município.
A estratégia foi simples: os ônibus foram cedidos às concessionárias por meio de uma “permissão de uso“. O Município banca a recarga elétrica e a manutenção, exceto em casos de imprudência dos motoristas ou em situações que as empresas deem causa. As empresas apenas fornecem os condutores e ganham por km rodado.
De acordo com a presidente da Transitar, Laura Rossi, a manobra ainda acaba sendo um benefício para os cofres públicos. “O Município acaba onerando menos, já que as empresas não colocam esses veículos na planilha de custos”, explica. Em outras palavras, a Prefeitura tira um custo das empresas e, em troca, reduz os subsídios pagos a elas.
Ajuda às concessionárias?
Na prática, os 15 ônibus elétricos substituíram veículos antigos, que também eram remunerados via subsídio. Com a mudança, o repasse que era feito para cobrir esses ônibus deixou de existir. “Dá a impressão de que o Município está ajudando a empresa, mas não é isso. Estamos ajudando o sistema de transporte coletivo. Quando concedemos os ônibus, estamos tirando custos da empresa e, consequentemente, reduzindo o subsídio que temos que pagar”, detalha Laura Rossi.
Na corda bamba
Com a nova licitação ainda indefinida, o transporte público coletivo de Cascavel caminha em uma corda bamba. A frota envelhecida permanece em circulação, com a expectativa de que a nova concessão saia do papel ainda neste ano. Enquanto isso, os elétricos operam sob um modelo de permissão que busca equilibrar os custos do sistema. Se, por um lado, a prefeitura defende a estratégia adotada, por outro, a ausência de uma definição clara da nova concessão acaba por remendar soluções, colocando em xeque a qualidade do serviço prestado à população que, afinal, segue pagando a conta.
A novela
A tentativa do Município de Cascavel de licitar o transporte coletivo segue se arrastando desde 2021, sem sucesso. Promessa do ex-prefeito Leonaldo Paranhos, o certame já sofreu diversas suspensões. Lançada pela primeira vez no final de 2022, a licitação foi barrada pelo Tribunal de Contas do Paraná em fevereiro de 2023, que exigiu alterações no estudo de viabilidade econômica.
Após ajustes, a licitação foi remarcada para dezembro de 2023, mas acabou deserta. Helio Camilo Marra Júnior, sócio da Pioneira Transportes, afirmou que o contrato era inviável economicamente. Simoni Soares, então presidente da Transitar, apontou que o risco de demanda, com remuneração baseada no número de passageiros transportados, afastou as empresas.
Em 2024, um novo edital foi lançado para 9 de dezembro, com valor máximo de R$ 251,8 milhões e contrato de 15 anos, divididos em dois lotes. No entanto, o TCE-PR suspendeu a concorrência atendendo à representação da Viação Capital do Oeste, que apontou falhas no equilíbrio econômico-financeiro do contrato. No mesmo dia, o Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Coletivos (Sinttacovel) obteve outra liminar contra a licitação, alegando irregularidades em uma cláusula do edital.
Foto ônibus: Paulo Eduardo/O Paraná
Energia limpa e milionária
Em dezembro do ano passado, a Prefeitura de Cascavel inaugurou a Usina Fotovoltaica, localizada no aterro sanitário da área rural do distrito de Espigão Azul, equipada com 5 mil placas solares com capacidade instalada de 3.300 kW. A energia gerada nela é utilizada para abastecer a frota de ônibus elétricos do transporte coletivo. A produção média mensal estimada da usina é de 437.500 kWh, o que equivale ao consumo de aproximadamente 1.620 residências populares. Com a produção anual estimada de 5.250.000 kWh, o investimento municipal na usina deverá ser recuperado em cerca de 5 anos.
O projeto foi bancado com empréstimo contratado pela Prefeitura junto a R$ 15 milhões, provenientes de um convênio com a Itaipu Binacional e o BRDE. A Copel investiu outros R$ 2,6 milhões.