No dia 6 de outubro deste ano acontece mais uma eleição municipal nos 5.568 municípios do Brasil. No entanto, apesar de ser ano eleitoral, o período de campanha eleitoral inicia apenas no dia 16 de agosto, um dia antes do prazo final para registro de candidatura e realização das convenções partidárias. Até lá, o período é denominado de “pré-campanha” e pretensos candidatos são vedados por lei de praticarem alguns atos, especialmente, o “pedido de voto”.
No feriado do dia 1° de maio, Dia do Trabalhador, uma situação chamou a atenção de toda mídia nacional. O presidente Lula, pediu votos para o pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, o deputado federal Guilherme Boulos, em um evento promovido pelas centrais sindicais e que teve patrocínio da Petrobras, Sesi e recursos da Lei Rouanet.
A equipe de reportagem do O Paraná conversou com especialistas na legislação eleitoral para detalhar o tema.
Vedações expressas
O advogado e professor universitário, José Roberto Martins, disse que 180 dias antes do pleito os pretensos candidatos podem assumir a nomenclatura de pré-candidatos, no entanto, a candidatura irá ser definida apenas nas convenções partidárias que serão realizadas entre o dia 20 de julho e 5 de agosto. Definidas as candidaturas, os partidos têm até o dia 15 de agosto para o registro na Justiça Eleitoral.
A propaganda eleitoral, com publicidade, só pode ser feita a partir de 16 de agosto de 2024, data posterior ao término do prazo para registrar candidaturas. A data é um marco para que todos iniciem as campanhas de forma igualitária. Até lá, qualquer publicidade ou manifestação com pedido explícito de voto pode ser considerada irregular.
Segundo o advogado, antes deste período, as vedações são expressas na legislação e também nas resoluções que regulamentam o pleito. “Dentre essa regulamentação existe a vedação expressa de propaganda antecipada, do pedido de voto. É necessária a articulação, mas não pode ser feito o pedido expresso de voto. E isso não se limita ao uso da locução ‘vote em mim’, mas pode ser inferido em outras situações”, explica.
De acordo com Martins, neste período, o pré-candidato pode fazer de tudo o que acha que deve ser feito, o que não pode acontecer é o pedido explicito de voto, sob pena de propaganda antecipada. “Ele pode participar de show, podcast, programa de televisão, o que não pode é solicitar o pedido explicito de voto.”
Estas vedações, continua, buscam equilibrar a disputa eleitoral. “Tudo que vem a vedar é para trazer um equilibro das campanhas ao pleito eleitoral. Por exemplo, os candidatos que já possuem cargos como vereadores ou prefeitos que irão à reeleição, têm de seguir algumas regras especificas. Por exemplo, candidato prefeito que vá à reeleição não pode se utilizar da maquina pública para fazer sua campanha. Nesse período ele não pode fazer publicações nas suas redes sociais ou nas redes sociais de municípios.”
Abusos do Poder
O presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) subseção Cascavel, Alexandre Gregório, explicou que a OAB presta suporte e esclarecimentos tanto para advogados ou para a população que queira encaminhar alguma denúncia por propaganda irregular. Gregório ainda informou que até o momento duas Representações por propaganda antecipada foram registradas em Cascavel, sendo que uma foi julgada improcedente e outra ainda aguarda decisão.
Ele ainda explica que além do pedido explicito de voto antes do dia 16 de agosto, outras situações podem gerar um desequilíbrio no pleito. Como é o caso do abuso de poder econômico ou político. “Aquele gasto elevado, promessa, tudo isso na pré-campanha pode ser caracterizado como abuso de poder econômico. Exemplo é o caso do processo contra o senador Sergio Moro ou da ex-juíza Selma Arruda, que foi cassada por abuso de poder econômico na pré-campanha”.
Apesar de nesse período de pré-campanha não haver um teto de gastos previsto na legislação, sempre se busca uma razoabilidade para vislumbrar esse valor. “Na campanha tudo o que é feito na pré-campanha pode ser feito e tudo o que pode ser feito na pré-campanha pode ser feito na campanha. Na pré-campanha não existe o teto de gastos que as candidaturas podem ter, mas sempre se busca uma razoabilidade para esse valor. E quando o pré-candidato ultrapassa os limites de razoabilidade ou abusa do poder político, se utilizar dessas prerrogativas, ocorre em propaganda irregular”, enfatiza.
Caso Lula/Boulos: “Houve manifesta violação da legislação”
No caso envolvendo o presidente Lula e o pré-candidato Guilherme Boulos, o advogado José Roberto Martins explica que houve manifesta violação da legislação eleitoral. “No caso de Boulos, ele estava em um evento patrocinado pelo Governo Federal e, além disso, houve o pedido explicito de voto por terceiro no mesmo palanque. É necessário analisar a situação por dois vieses. O primeiro, é que Boulos estava em uma situação de evidência, em um evento financiado pelo Governo Federal, ferindo o princípio da equidade. Ou seja, todos os candidatos devem ter a possibilidade de concorrer de maneira igual e quando, ele [Boulos], assume essa condição, mesmo ele não tendo pedido o voto, existe uma situação que gerou um desequilíbrio. O presidente Lula exercendo a função de Chefe de Estado, gerou desequilíbrio na disputa e isso pode vir a gerar uma propaganda irregular ou abuso de poder econômico”, explica.
Segundo o advogado, mesmo não sendo o próprio Boulos pedindo voto, a situação como um todo gera uma evidência. No primeiro momento, na avaliação dele, as sansões que podem ser aplicadas vão desde a retirada do vídeo da internet até a aplicação de multa no valor de R$ 5 mil até R$ 25 mil. “Não tem o pré-candidato pedindo votos, mas tem uma pessoal ao seu lado em total evidência, solicitando o voto. Com base nesse desequilíbrio pode haver sansão. O que pode acarretar? Basicamente não tem como punir a não ser a multa e a remoção do vídeo.”
O presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB, Alexandre Gregório também é categórico ao afirmar que a situação é claramente campanha antecipada. “Uma conduta que é campanha antecipada. Nesse caso específico, com base na lei, o presidente pode ser condenado em multa de R$ 5 a R$ 25 mil. Já para Boulos, eventualmente, ele pode incorrer em abuso de poder político, já que foi utilizada uma estrutura governamental. Demonstra que há ações de governo que foram utilizados em benefícios de candidatos, pode haver o questionamento na justiça que pode levar até cassação do registro da candidatura do Guilherme Boulos se comprovado o abuso de poder político”, salienta.
Ratinho e Renato Silva?
Aqui na região Oeste do Paraná, um vídeo do governador Ratinho Junior circula nas redes sociais, se referindo ao vice-prefeito de Cascavel e pré-candidato a prefeito Renato Silva, como o futuro prefeito da cidade. Segundo o advogado Alexandre Gregório, nessa situação específica, é necessário analisar o caso concreto para verificar se houve ou não uma antecipação de campanha.
No vídeo, Ratinho Junior apenas destaca os bons resultados da administração do prefeito Leonaldo Paranhos e seu vice, sem o pedido explícito de votos, como fez o presidente Lula.