A Proposta de Emenda à Constituição da reforma administrativa teve a admissibilidade aprovada pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados nesta terça-feira (25). Agora, o texto terá o mérito analisado por uma comissão especial.
O relatório favorável à admissibilidade da PEC foi aprovado por 39 votos a 26.
O parecer, elaborado pelo deputado Darci de Matos (PSD-SC), foi lido no dia 17, mas a oposição pediu vista. A proposta deveria ter sido discutida na última quinta-feira (20), mas a presidente da CCJ, Bia Kicis (PSL-DF), concordou em adiar o debate para segunda (24). Com isso, a votação ficou para esta terça.
Na comissão especial, que será presidida pelo deputado Fernando Monteiro (PP-PE), a PEC deve ser relatada pelo deputado Arthur Maia (DEM-BA). O colegiado terá até 40 sessões para propor mudanças ao mérito do texto.
Nesta terça, em evento do BTG Pactual, o presidente da Câmara, Arthur Lira, afirmou que pretende entregar a reforma ao Senado no início do segundo semestre.
O parecer de Darci de Matos concluiu que a proposta enviada pelo governo não viola princípios constitucionais.
O relator, no entanto, apresentou três emendas para suprimir trechos de dispositivos que foram considerados inconstitucionais: o acréscimo de oito princípios à administração pública direta e indireta de União, estados e municípios, o impedimento para que servidores possam acumular o cargo público com outras atividades remuneradas e o que dava ao chefe do Executivo o poder de extinguir ou fundir autarquias.
A Constituição hoje diz que a administração pública direta e indireta de União, estados e municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Na PEC, o governo acrescentou oito princípios: imparcialidade, transparência, inovação, responsabilidade, unidade, coordenação, boa governança pública e subsidiariedade. O relator suprimiu todos eles.
Segundo Darci de Matos, “a inclusão de novos princípios no texto constitucional, embora seja boa a intenção, pode gerar interpretações múltiplas e completamente divergentes, o que consequentemente gerará provocações ao Supremo Tribunal Federal para dispor sobre sua efetiva aplicabilidade em situações, por exemplo, de improbidade administrativa.”
“A eventual admissão das expressões propostas como princípios da Administração Pública levaria a uma excessiva abertura normativa não apenas indesejável, mas prejudicial à estabilidade jurídica e à própria Administração Pública e incompatível com a garantia constitucional fundamental da segurança jurídica, que tem sede última no postulado do devido processo legal”, escreveu.
Ele também retirou a vedação a que servidores acumulem cargo público com qualquer outra atividade remunerada.
Na avaliação de Darci de Matos, a expressão impede que um ocupante de cargo típico de Estado possa exercer uma atividade remunerada de músico, “mesmo que essa atividade não comprometa sua jornada e suas atividades no cargo público”.
“No entanto, impedir que esse servidor exerça qualquer outra atividade remunerada representa uma restrição flagrantemente inconstitucional que não se justifica por ser o único tipo de vínculo da presente Proposta de Emenda à Constituição a continuar tendo direito a estabilidade”, indicou o deputado.
Por isso, o relator suprimiu a expressão “a realização de qualquer outra atividade remunerada, inclusive”.
Outro trecho que considerou inconstitucional trata da extinção, transformação e fusão de entidades da administração pública autárquica. Darci de Matos disse não ser admissível do ponto de vista constitucional porque as “entidades desempenham atividades administrativas de forma descentralizada, elas são vinculadas e não subordinadas aos ministérios e possuem personalidade jurídica própria”.
“A possibilidade de extinção dessas entidades mediante decreto do chefe do Poder Executivo acarretaria grave alteração no sistema de pesos e contrapesos, ínsito ao modelo de separação de poderes e ao controle da Administração Pública pelo Poder Legislativo”, complementou.
Sobre o resto da proposta, o relator não viu inconstitucionalidade. Em relação ao vínculo de experiência para cargos típicos de Estado, por exemplo, afirmou que o tema deve ser aprofundado na comissão especial para que seja aprimorado.
No entanto, disse que não se pode afirmar juridicamente nesta fase do processo legislativo que criar o vínculo de experiência violaria direitos e garantias individuais. “Conforme demonstrado anteriormente, não há direito adquirido a regime jurídico para futuros servidores da Administração Pública”, ressaltou.
Além disso, ele afirmou que há possibilidade constitucional de aumentar o prazo do estágio probatório, “pela mesma lógica jurídica não há impedimento constitucional, para fins de juízo de admissibilidade da proposta, posto que o constituinte derivado cria um instituto anterior ao estágio probatório.”
Sobre a ausência de membros do Executivo, Legislativo, Judiciário e militares na PEC, o relator afirmou que a omissão não viola o dispositivo de direitos e garantias individuais da Constituição Federal.
“Além da diversidade jurídica dos regimes aplicáveis a cada segmento referido, já admitidos pela Carta Magna, competirá a Comissão Especial debater o tema, sugerindo eventuais emendas à Proposta de Emenda à Constituição.”
O deputado disse ainda que o vínculo por prazo determinado, mesmo que mereça mais discussão na comissão especial, não viola as Cláusulas Pétreas da Constituição. Darci de Matos também afirmou não ver na reforma nada que ofenda a forma federativa de Estado ou a separação de Poderes.
Ele afirmou que, na comissão especial, o governo se comprometeu a retirar do texto qualquer item que verse sobre direitos dos atuais servidores. Além disso, afirmou que no colegiado será conceituado o que é uma carreira típica de estado. As carreiras consideradas típicas de estado serão definidas em projetos de lei complementares.
Em 22 de fevereiro, Lira estimou que a reforma administrativa seria votada no plenário da Casa antes do fim do primeiro trimestre. No dia 10 de maio, afirmou que sua intenção era enviar o texto para o Senado até julho. A expectativa é que a PEC saia da comissão especial em agosto. Aliados do presidente Jair Bolsonaro veem chance de a reforma sair do papel só em 2023, depois das eleições.
A reforma proíbe progressões automáticas de carreira, como as gratificações por tempo de serviço, e abre caminho para o fim da estabilidade em grande parte dos cargos, maior rigidez nas avaliações de desempenho e redução do número de carreiras.
Sem efeito sobre os atuais servidores e dependente de futuras regulamentações para mudar regras consideradas sensíveis, a medida não deve gerar economia aos cofres públicos no curto prazo.
O pacote atinge futuros servidores dos três Poderes na União, estados e municípios, mas preserva categorias específicas. Juízes, procuradores, promotores, militares, deputados e senadores serão poupados nas mudanças de regras.
O governo argumenta que essas categorias obedecem a normativos próprios, que não podem ser alterados por sugestão do Poder Executivo. Eventuais mudanças para elas precisariam ser propostas pelos próprios órgãos ou incluídas pelo Congresso.
Nos planos do governo, também estão a redução das remunerações de entrada no serviço público e a ampliação do número de faixas de salário para evolução ao longo da carreira. Esses pontos devem ser tratados em projetos que serão apresentados em um segundo momento.
O texto torna mais rigoroso o processo de seleção para entrada em um cargo público. Hoje, a pessoa aprovada passa por três anos de estágio probatório, que usualmente não cria nenhum impedimento para a nomeação efetiva.
Com a nova regra, a pessoa passará por dois anos com um vínculo mais frágil, considerado de experiência, e mais um ano de estágio probatório. Após as etapas, o governo selecionará os aprovados de acordo com as vagas disponíveis e a classificação aferida após o período de experiência.
Fonte: Folha de São Paulo