BUENOS AIRES – Numa declaração ousada e que provocou uma enxurrada de críticas internas, na semana passada o ministro da Fazenda da Argentina, Alfonso Prat-Gay, pediu ?desculpas pelos últimos anos? a uma plateia de empresários espanhóis, em Madri. O gesto de Prat-Gay, que se referia, principalmente, à expropriação da companhia petrolífera Repsol-YPF em 2012, buscou reforçar a intensa campanha do governo Mauricio Macri para atrair novos investimentos que ajudem o país a sair da recessão ? este ano, analistas estimam que o crescimento será zero. De acordo com dados da empresa de consultoria Abeceb, nos primeiros quatro meses deste ano, empresas locais e internacionais anunciaram projetos em um total de US$ 5,6 bilhões. Na opinião de economistas, a Argentina voltou ao cardápio de países atraentes na América Latina, mas Macri ainda está longe de se tornar artífice de uma onda de novos investimentos.
? A Argentina está de volta… Prometemos regras de jogo previsíveis ? assegurou o ministro.
Mas Prat-Gay ? que foi questionado até por aliados da Casa Rosada, como a deputada Elisa Carrió, que considerou um ?absurdo? o pedido de desculpas aos espanhóis ? defendeu sua posição, convencido de que o governo Macri deve fazer tudo o que for necessário para recuperar a confiança e a credibilidade.
? Estamos reparando o vínculo e ordenando a situação interna. A Espanha é um país primordial para nós ? enfatizou Prat-Gay.
Todas as semanas, Macri se reúne com empresários argentinos e estrangeiros e faz a todos o mesmo pedido: novos investimentos. O presidente enfrenta uma pressão cada vez maior dos sindicatos, que já ameaçaram convocar greve geral caso o governo não consiga melhorar os indicadores sociais e econômicos, principalmente a taxa de desemprego, que pode chegar a dois dígitos até o fim do ano (atualmente, está em torno de 7,5%).
BRF VAI INVESTIR US$ 292 MILHÕES
Esteve recentemente na Casa Rosada o presidente da Exxon Mobil, Rex Tillerson, que saiu dizendo estar ?muito otimista pelas mudanças que estão ocorrendo na Argentina?. Tillerson, segundo informou o governo Macri, destacou a participação da companhia no projeto de Vaca Muerta, na província de Mendoza, onde já investiu cerca de US$ 200 milhões, e analisou com Macri um projeto piloto em Neuquén, na Patagônia, junto com a XTO Energy e a estatal Gás e Petróleo de Neuquén, que poderia representar investimentos superiores a US$ 10 bilhões, em um período de 20 a 30 anos.
Também estiveram com o chefe de Estado na semana passada representantes da BRF, uma das maiorias companhias de alimentos do mundo, que confirmaram os planos de expansão da empresa na Argentina e o desembolso de US$ 292 milhões este ano. O presidente global do Conselho de Administração da empresa, Abilio Diniz, foi recebido por Macri e, após a conversa, afirmou confiar ?no potencial da Argentina, especialmente em seu povo?. No mercado local, a BRF tem marcas emblemáticas argentinas como a Good Mark (hambúrguers) e Vienissima (salsichas).
? Finalmente estamos realizando tudo o que tínhamos planejado para a Argentina ? disse José Carlos Reis de Magalhães Neto, membro do conselho da BRF.
Nos últimos anos, países como Peru e Colômbia captaram investimentos que, em outro momento, teriam sido destinados ao mercado argentino. Macri, na visão do economista Ramiro Castiñeira, da Econométrica, ainda não conseguiu virar a página, mas voltou a colocar o país ?no cardápio latino-americano?.
? O governo está fazendo grandes mudanças. Antes, não havia estímulo para novos investimentos, apenas para o consumo. Muitas empresas foram embora ? lembrou Castiñeira.
Ele inclui na lista de medidas bem-sucedidas de Macri ?o fim do calote da dívida pública e da aplicação de medidas de controle cambial, além da abertura da economia?.
? Não tenho dúvidas de que os investimentos irão chegando, as coisas não podem mudar em cinco meses ? apontou o economista.
?O INTERESSE É GRANDE?
Para Fausto Spotorno, da Orlando Ferreres e Associados, ?a imagem da Argentina melhorou muito no exterior?:
? O que estamos vendo agora são muitos gerentes de grandes empresas vindo ao país para ver de perto como está a situação. O interesse é grande.
Nos últimos meses, representantes de multinacionais como Siemens e Coca-Cola, entre outras, passaram por Buenos Aires.
? São decisões que levam tempo, e a Argentina ainda tem problemas a serem resolvidos, além de um custo tributário altíssimo, um dos mais altos do mundo ? opinou o economista.
Na semana passada, Macri comunicou sua decisão de repatriar 18 milhões de pesos (cerca de US$ 1,3 bilhão) depositados por ele em uma conta nas Bahamas. Mais um gesto que busca gerar confiança entre investidores.
Além de Prat-Gay, outros funcionários e autoridades argentinos têm participado da campanha em busca de novos investimentos para uma economia ainda em recessão. A maioria dos analistas acredita que o Produto Interno Bruto (PIB) argentino não crescerá este ano, embora seja previsto um princípio de recuperação para os últimos meses de 2016.