Opinião

Ficar juntos é sempre o melhor?

Ficar juntos é sempre o melhor?

 

 

Dissemos em postagem anterior que a dinâmica padrão dos casais, quando o relacionamento entra em crise, é procurar pelas culpas e o culpado. É o momento em que o casal busca identificar o evento (ou eventos) que considera responsável pela crise. Obviamente, detrás de cada evento tido por causador está um culpado, que sempre é “o outro”.

No entanto, no trabalho terapêutico temos observado que os casamentos costumam não se desfazer porque um dos cônjuges fez algo muito grave ao outro, de modo que um deles é o “culpado” e o outro o “inocente”. Ainda que possa ter havido algo, um “motivo”, que supostamente levou à separação, também isso escapa ao controle do casal. Com efeito, explica Bert Hellinger, trata-se em grande parte das vezes de enredamentos em que um dos parceiros “está assoberbado por problemas da sua família de origem ou ambos caminham em direções opostas” (Hellinger, B. A simetria oculta do amor, p.87).

O que Hellinger nos diz aqui é algo que as Constelações Familiares costumam nos mostrar: um dos parceiros se converte em “inocente culpado”, por exemplo, devido a sérios enredamentos com sua família de origem ou da família do cônjuge. Isso, obviamente, não o isenta de suportar todas as consequências de suas ações. Além disso, como observa Hellinger, um dos dois talvez tenha se desenvolvido psicologicamente de uma maneira diferente da previsível no início da relação.

Detrás da ideia de que algo poderia ter sido feito que pudesse resgatar ou “salvar” o casamento, se esconde a imagem de um ideal: de que permanecer juntos é o melhor. No entanto, como podemos ter certeza de que ficar juntos é realmente o melhor (ou certo) a ser feito?

Na verdade, pondera Hellinger, “aquilo que consideramos felicidade frequentemente é o cômodo. A grandeza, no entanto, não se alcança no caminho do cômodo. São dois níveis diferentes. Por isso também me mantenho sereno quando vejo que um casal se separa. Ou se vejo que uma relação acabou. Não tento encobrir nada. Agindo assim os parceiros conservam sua dignidade” (Hellinger, B. Lograr el amor en la pareja, p. 206). Em suma, como Hellinger diz em outra parte, “a corrente da vida flui para frente e não para trás”.

As considerações de Hellinger nos apontam para um quadro muito conhecido que observamos nos processos de separação: um dos parceiros se coloca como o único que realmente se empenhou para “salvar” o casamento. A outra parte teria passivamente deixado as coisas desandarem sem nada fazer. Essa presunção de conseguir evitar o curso das coisas, de controlar o destino, como diz Hellinger, é uma presunção de poder e, no fundo, de soberba.

Detrás da pretensão de estar “salvando” o casamento, nos alerta Hellinger, se esconde o conforto do mais cômodo. Dispor-se à mudança seguindo a corrente da vida, que flui para frente e não para trás, aparece como demasiado trabalhoso, porque requer mudança profunda das rotinas, das relações de amizade do casal e, particularmente, das questões financeiras. Acontece que o caminho da comodidade não coincide com o caminho da felicidade. Assim, conclui Hellinger, aquele para quem o idealizado é manter o casamento a qualquer custo, no final das contas trabalha não apenas contra a sua própria felicidade, mas também contra a felicidade do parceiro.

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JOSÉ LUIZ AMES E ROSANA MARCELINO são terapeutas sistêmicos e conduzem a Amparar.