O constante e exponencial aumento no número de casos confirmados de coronavírus no Brasil preocupa, principalmente quando vemos o exemplo da Itália. O país europeu teve os dois primeiros casos da doença diagnosticados no dia 30 de janeiro, em um casal de turistas chineses. Dezoito dias depois foi detectada a primeira transmissão local no país e menos de um mês, em 24 de fevereiro, já eram 224 casos. Daí em diante a escalada foi colossal. Nessa sexta foi registrado o pior dia da epidemia: 627 mortes em menos de 24 horas. Até a tarde de ontem, a Itália já tinha 4.032 pessoas que morreram em decorrência da doença, e 47.021 casos confirmados.
Todos os relatos que vêm da Itália são iguais: a população subestimou a doença, ignorou os apelos de isolamento e agora vive fechada sem nem conseguir velar seus mortos.
No Brasil, o primeiro caso importado da doença foi confirmado no dia 26 de fevereiro. Na quarta-feira (18), vinte dias após o diagnóstico desse paciente, o País tinha 428 casos confirmados, 11.278 pacientes em investigação por suspeita da doença e quatro óbitos. Embora na linha temporal o Brasil esteja à frente da Itália em número de casos (no 20º dia, o país europeu tinha apenas três casos confirmados), a adoção de medidas preventivas para conter a expansão da epidemia acontecem aqui com maior antecedência que lá. E é isso o que pode fazer a diferença.
Isolamentos
Diversos estados brasileiros, mas principalmente São Paulo e Rio de Janeiro, primeiros a apresentar transmissão comunitária da doença e com maior registro de casos, inclusive mortes, implementaram medidas para promover o distanciamento social (fazer com que as pessoas mantenham o máximo de distância umas das outras). Escolas e universidades suspenderam as aulas, shoppings, lojas e academias fecharam, empresas adotaram sistema de home office ou rodízio de turnos, igrejas e templos realizam missas e cultos ao ar livre, entre outras. As medidas foram adotadas por diversos estados, inclusive o Paraná.
Achatar a curva
Essas medidas são importantes para reduzir a circulação do vírus no País e fazer com que a epidemia perca força ou, no mínimo, se espalhe mais lentamente. A estratégia é chamada “achatar a curva” e é fundamental para que o sistema de saúde não fique sobrecarregado e consiga atender com eficácia todos os pacientes graves, que precisam de internação ou unidade de terapia intensiva (UTI).
Para se ter uma ideia, a Itália chegou nesse ponto de calamidade pública, com um número de mortes superior ao da China, justamente porque relutou em adotar tais medidas. Alguns governantes duvidaram da capacidade de transmissão do vírus e houve falhas na detecção de casos suspeitos por unidades de saúde. Medidas de isolamento e distanciamento social só foram adotadas em larga escala no país quando o vírus já havia adoecido milhares de pessoas, principalmente idosos, grupo que corre maior risco de morte pela doença.
A demora na resposta exigiu a adoção de medidas extremamente rígidas, semelhantes às adotadas na região de Wuhan, na China, epicentro da doença. Há semanas, a população italiana vive em rigorosa quarentena. As pessoas não podem se deslocar para outras cidades e até mesmo movimentações internas são controladas pelo governo.
Mas nem isso foi suficiente para aplacar a epidemia. A sobrecarga nos hospitais chegou ao ponto de médicos precisarem escolher quais pacientes serão internados e quais ficarão à própria sorte porque não há leitos suficientes para todos. “Além de a Itália ter a população mais velha da Europa, o país não tomou nenhuma medida de contenção. A alta taxa de mortalidade é resultado da associação desses fatores, que acabaram sobrecarregando o sistema de saúde”, explica o infectologista Celso Granato, diretor médico do Grupo Fleury.
Isolamento pode conter o crescimento da curva
Nesse cenário, a adoção de ações de distanciamento social quando o Brasil tem menos de mil casos confirmados é mais do que justificada. O número pode parecer baixo, em comparação a outros países, mas o aumento tem sido exponencial.
Esse crescimento exponencial é esperado em epidemias causadas por vírus novos. Mas, com bom senso e trabalho em conjunto, é possível fazer com que isso ocorra mais lentamente. Nesse sentido, o exemplo do país europeu serviu de alerta para o resto do mundo, inclusive para o Brasil, para evitar que por aqui se repita o ocorrido na Itália. Outros países, como Alemanha, Estados Unidos, Espanha e Portugal, também correm contra o tempo para tentar frear a epidemia e reduzir a velocidade de crescimento da doença.
Como acabar com uma epidemia
A única forma de combater uma epidemia viral é esgotar a capacidade de transmissão do vírus. Isso pode acontecer naturalmente, à medida que as pessoas contraem a doença e depois de recuperadas se tornam imunes, ou por meio de medidas de intervenção como vacinas, medicamentos, quarentenas, adoção de formas de prevenção e distanciamento social.
No caso do novo coronavírus, em que não há vacina nem tratamento, restam apenas as medidas de prevenção e isolamento físico para limitar a capacidade de transmissão do vírus e tentar acelerar o fim da epidemia.
Fonte: Revista Veja