De sólida potência olímpica, o atletismo da Rússia tornou-se um castelo de cartas que desmoronou em questão de meses. Banido de competições de internacionais desde novembro, por conta de um vasto esquema de doping, o país viu a suspensão ser mantida pelo conselho da Federação Internacional de Atletismo (IAAF) na sexta-feira, após reunião em Viena, na Áustria. A decisão barra uma constelação de atletas russos dos Jogos Olímpicos de 2016, no Rio, e impacta o quadro de medalhas.
Nomes como Yelena Isinbayeva, bicampeã olímpica no salto com vara, e Ivan Ukhov, ouro no salto em altura em Londres-2012, não disputariam a Rio-2016, hoje, graças ao veto da IAAF à Rússia. Na avaliação de Lauter Nogueira, técnico de atletismo e comentarista do Sportv, a ausência russa deve impactar ainda os pódios do revezamento 4x100m feminino e da marcha atlética, modalidades em que o país tinha potenciais medalhistas.
Resta saber se o desempenho dos nossos atletas vai ser suficiente para aproveitar essas ausências. Pode ser um facilitador para chegar ao pódio, mas continua difícil porque nossa expectativa já não era elevada ressalta.
Para o comentarista, as chances do Brasil melhoram nos esportes nos quais já brigava por medalha: salto com vara e a marcha atlética. Isinbayeva, única mulher que já saltou acima de 5 metros, era uma das maiores adversárias de Fabiana Murer, principal chance de pódio do Brasil.
No Mundial de Pequim, em 2015, sem a presença da russa, Murer ficou com a prata. Foi superada pela cubana Yarisley Silva, dona da segunda melhor marca de 2016 (4,84m). Neste ano, o melhor salto da brasileira foi 4,70m, o que a deixa bem atrás de rivais como as americanas Jennifer Suhr e Sandi Morris e a grega Ekaterini Stefanídi, que já saltou com a sarrafo a 4,86m na temporada.
Na marcha atlética, Caio Bonfim e Érica Sena ficaram, respectivamente, na sexta e quinta colocações no Mundial de Pequim. O banimento da Rússia pode ser o diferencial em uma briga por pódio na Olimpíada de 2016, mas Lauter lembra que os marchadores russos já não haviam participado daquela competição.
AUTORIZAÇÕES DO COI
Embora seja uma decisão significativa, o veto da IAAF ao atletismo da Rússia não necessariamente representará uma Olimpíada sem atletas russos. A decisão final sobre a participação de atletas caberá ao COI, que discute a situação neste fim de semana. Procurado pelo GLOBO, o comitê Rio-2016, responsável pela organização dos Jogos, informou que aguarda o veredicto do COI para se pronunciar sobre a suspensão da Rússia. Por enquanto, o país ainda enxerga uma fresta de chance de estar nos Jogos.
Isinbayeva é uma das que ainda não desistiu de competir no Rio. A bicampeã olímpica afirmou que a suspensão coletiva da IAAF é uma violação aos direitos humanos, e garantiu que vai recorrer. Para Lauter Nogueira, buscar um enfrentamento judicial não é a melhor estratégia para os atletas russos. Mas o comentarista aposta que a IAAF vai propor um acordo para não deixar que atletas de alto rendimento sem histórico de punições por doping, como Uhkov e a própria Isinbayeva, fiquem de fora dos Jogos Olímpicos.
Desse jeito ela (Isinbayeva) não vai conseguir nada. O (atual presidente da IAAF) Sebastian Coe veio com o intuito de limpar tudo, por isso a punição tem que ser exemplar. Mas o próprio Coe está costurando um acordo para atletas icônicos, como Isinbayeva e Ivan Ukhov, do salto em altura, poderem competir nos Jogos sob a bandeira olímpica afirma.
Mesmo se esta solução for adotada, é pouco provável que um número considerável de atletas russos seja agraciado. Com isso, a Rio-2016 terá no máximo fragmentos da delegação que foi a segunda maior medalhista no atletismo emLondres-2012, com sete ouros, quatro pratas e cinco bronzes (16 no total). O desempenho dos atletas russos na última Olimpíada só não superou os EUA.
As ausências abrem espaço para uma briga entre Jamaica e Quênia pela vaga de segunda potência do esporte. Esta última, por sinal, também é investigada pela IAAF, em parceria com a Wada (Agência Mundial Antidoping) por suspeitas de dopagem sistemática.
O país descumpriu exigências da Wada e é tratado com foco especial pela entidade, que tenta flagrar o maior número possível de atletas dopados e impedi-los de participar da Olimpíada. O caso da Rússia serve de alerta: em questão de meses, muita coisa pode acontecer.