Existem temas e situações que envolvem profunda complexidade no seu enfrentamento. Isso se deve, em grande medida, às situações subjetivas envolvidas, diante da multiplicidade de fatores que envolvem os indivíduos bem como seus relacionamentos. Quando as pessoas se unem em matrimônio, não o fazem almejando seu fim, por exemplo, mas sim a felicidade envolvida no desenvolvimento dessa conformação familiar. No entanto, em alguns casos, o divórcio acaba por ser inevitável, a curto ou longo prazo.
Em geral, não se depara com a felicidade de qualquer das partes em um processo de divórcio, especialmente quando existem filhos envolvidos. Existe a dor do rompimento de uma fase, da quebra de uma expectativa e da incerteza sobre o futuro, além das mágoas envolvidas no desfecho. Alguns são os casos de encerramento pacífico e amigável, porém na maioria das situações não resta sequer a amizade, momento, inclusive, em que o caráter é posto em evidência.
Como as juras de amor se tornam guerras frias ou declaradas? O amor descamba em ódio e no entremeio estão os filhos que não podem ter o luxo de manter essa conta no passado, pelo contrário, são chamados para uma nova realidade, tantas vezes confusa e dolorida. Não é possível que não se envolvam, afinal de contas os laços familiares são teias entrelaçadas. Almeja-se distinguir categoricamente parentalidade de conjugalidade, de modo que uma não interfira na outra, contudo elas não andam em retas paralelas e sim em funções com diversos pontos em comum.
Por esse motivo, não só o avanço com relação à guarda e às disposições sobre violência doméstica que andam em sentido similar é salutar, como também o reconhecimento dos filhos como testemunhas em processos de divórcio. Aqui não há apenas complexidade como também delicadeza da questão, a qual pode ser crucial para o a elucidação sobre a realidade e o deslinde do litígio.
Não se quer que os filhos sejam agentes duplos da guerra fria, porém quando o ataque é reptício e escuso na santidade do lar, o conhecimento da situação se limita em demasia. Os filhos, quando tiverem o mesmo vínculo com ambos (isto é, não é filho apenas de um dos ex-cônjuges, mas do casal), não há presunção de parcialidade, de modo que poderão ser ouvidos pelo juízo (e levadas a sério) para trazer fatos importantes.
A princípio, apenas os maiores de 16 anos poderiam ser testemunhas, no entanto, é imperioso destacar as convenções internacionais das quais o país é signatário e que garante o direito de participação em processos judiciais por crianças e adolescentes, quando estes tiverem o condão de afetar suas vidas. Não são meros objetos de intervenção, mas sujeitos de direitos.
Nos processos, as testemunhas comumente são consideradas objetos de prova, não são sujeitos do processo, de modo que a parte interessa arrola (que dizer: faz uma lista, um rol) e a testemunha é inquirida (ou seja, perguntada, questionada, ouvida). Na situação dos filhos como testemunhas do divórcio dos pais, não basta serem arrolados pelos pais, devem ser consultados para aceitar esse encargo e advertidos das consequências, especialmente para as relações futuras. Ser ouvido é um direito, não uma regalia que pode ser garantida apenas a alguns.
Dra. Giovanna Back Franco – Professora universitária, advogada e mestre em Ciências Jurídicas