Desde os primórdios, o ser humano questiona o sentido do termo liberdade. Pode se referir às ações desconexas das paixões ou das necessidades, a possibilidade de ir e vir, às desamarras em relação aos demais ou mesmo o respeito aos direitos basilares, que garante a vida com dignidade. Compreender que o valor intrínseco ao indivíduo independe de sua utilidade para outrem ou para a própria sociedade.
Independentemente de sua compreensão social ou filosófica, não há dúvida de que o coração humano é capaz de assimilar o conceito de liberdade, a despeito do aspecto racional, além de vinculá-lo à noção de felicidade. Não à toa que a ausência da liberdade traz consigo a dor e o horror, não apenas aos cativos, mas também aos que com ele guardam afeto.
Todos os dias, inúmeros inocentes são envolvidos pelo silêncio e pela dor ao se tornarem escravos dos desejos de quem tem poder sobre elas, em seus corpos franzinos e sua dimensão cognitiva limitada. Quê artimanha detêm para serem livres? Os números são alarmantes no que diz respeito à violência intrafamiliar, às negligências do Estado na implementação de políticas públicas (ou no mero respeito aos direitos dos infantes), ou, ainda, às violações por condutas como o tráfico infantil. A cada pôr do sol, novas camas de princesas ou heróis, permanecerão vazias e arrumadas diante da ausência de alguém.
A vulnerabilidade se torna chamariz aos violadores, que podem usar da confiança do ambiente doméstico ou a ilusão de fama para ampliar o conteúdo de pornografia e pedofilia. São assuntos “feios” demais para os ditos “civilizados”, o que os mantém resguardados e omissos. Porém, a liberdade não se faz no silêncio, nasce e se perpetua na voz e na ação, pelo grito e pela luta, travados em nome daqueles que ainda não podem falar ou que não voltarão a se manifestar.
A lei impõe aos pais o dever de cuidado com as crianças e adolescentes, contudo prevê sua extensão à sociedade e ao Estado, visto que os vulneráveis devem permanecer no cuidado por todos, como em uma matilha, na garantia da contínua vigilância. Não uma vigilância de corpos, para o adestramento, mas uma rede de apoio em incansável amor àqueles que recém chegaram ao mundo. Apenas o amor, pelo cuidado, viabiliza a continuidade da humanidade, enquanto atributo de ser humano.
Enquanto o dinheiro compra fontes absurdas de prazer, em detrimento da liberdade de alguns, o cuidado remanesce gratuito e benevolente, pronto a romper as correntes do homem pelo homem, forjadas pelo poder e pela violência. As crianças e os adolescentes dependem do grito pela liberdade para se desenvolverem plenamente pelo afeto, a fim de que suas camas permaneçam repletas de sonhos e corações inquietos pelo novo dia que está por vir.
Dra. Giovanna Back Franco – Professora universitária, advogada e mestre em Ciências Jurídicas