Quando entrar no Sambódromo no próximo dia 11 para disputar as eliminatórias do tiro com arco na Paralimpíada do Rio, Zahra Nemati já vai sentir-se em casa. Um mês antes, a atleta iraniana estava no mesmo local disputando a Olimpíada. Zahra faz parte do seleto grupo de apenas três atletas paralímpicas que já entrou em ação também no Rio-2016, superando limitações físicas e competindo ao lado das melhores do mundo. As outras duas competidoras são a polonesa Natalia Partyka e a australiana Melissa Tapper, ambas mesatenistas. Paralimpíada em 25 de agosto
Nascida em Kerman, no Irã, Zahra sempre gostou de esportes. Faixa preta em taekwondo, tinha o objetivo de chegar a uma Olimpíada competindo na modalidade que amava. Seu sonho foi parcialmente interrompido em 2003, quando sofreu um acidente de carro que causou uma lesão na espinha e a deixou sem movimentos nas pernas.
– Como uma atleta de taekwondo, não poder usar minhas pernas foi como um pianista perder seus braços – resumiu Zahra, de 31 anos, em entrevista ao canal japonês WowWow TV.
Não houve, porém, espaço e tempo para a tristeza e a resignação na vida de Zahra após o fatídico acidente que a confinou a uma cadeira de rodas.
– Ela estava sempre sorrindo. Nunca reclamou ou chorou. Dá para acreditar? – disse a mãe de Zahra, Fatemeh, também ao WowWow TV.
Se não seria mais possível lutar taekwondo, Zahra Nemati não demorou muito a descobrir outra paixão. Três anos após o acidente ela passou a praticar tiro com arco. Com apenas seis meses de treinamento, Zahra ficou em terceiro lugar no campeonato nacional, competindo ao lado de atletas sem deficiência. Em 2012, ela se classificou para os Jogos Paralímpicos de Londres, onde fez história. Ao subir ao lugar mais alto do pódio na categoria arco recurvo W2, Zahra se tornou a primeira mulher iraniana a conquistar uma medalha de ouro em uma Olimpíada ou Paralímpiada.
– Eu queria mostrar aos jovens iranianos, especialmente as meninas, que as mulheres iranianas não são piores que as outras. Queria quebrar o estereótipo e estou muito contente de ter conseguido. Ao voltar para casa, fui recebida com festa, por pessoas felizes. As lágrimas escorriam dos meus olhos – disse Zahra após o ouro em Londres.
Os feitos da iraniana não parariam por aí. Em Londres-2012 ela também conquistou o bronze na disputa por equipes. No ano seguinte, repetiu o resultado no Mundial de Tiro com Arco paralímpico, na Tailândia: ouro no individual, bronze por equipes. Em 2015, ela ficou em segundo lugar no Campeonato Asiático e escreveu mais um belo capítulo de sua história ao carimbar o passaporte para realizar o sonho de sua vida: disputar uma Olimpíada.
Em 2014, Zahra Nemati discursou na ONU, em Nova York, em um painel sobre a inclusão para pessoas com deficiência através do esporte.
– Acredito que o esporte, de suas raízes até a elite, é uma ferramenta acessível e poderosa para a integração de deficientes na socidade. O esporte ajuda os deficientes de duas maneiras. De um lado, muda a percepção das pessoas, e do outro muda a visão do deficiente em relação a ele mesmo. Essas influências internas e externas reduzem o isolamento e levam a pessoa a ter uma vida social – disse Zahra na ocasião.
O talento natural da atleta caminha lado a lado com muita determinação. Se a história de Zahra por si só já seria inspiradora, a vontade da iraniana de alcançar a perfeição acaba encantando e extraindo o melhor de seus companheiros de treino.
– Eu fico constrangido porque a Zahra está sempre treinando, mesmo quando os colegas de equipe que não têm nenhuma deficiência já estão cansados. Ela realmente nos motiva – disse um companheiro de equipe ao WowWow TV.
No Rio-2016, Zahra Nemati está prestes a se tornar a primeira atleta do tiro com arco a disputar os Jogos Olímpicos e Paralímpicos na mesma edição desde o feito da italiana Paola Fantato, em 1996. Antes de competir na Olimpíada, ela ainda fez bonito ao carregar a bandeira do Irã na cerimônia de abertura dos Jogos.
Na competição no Sambódromo, Zahra foi eliminada na estreia, derrotada pela russa Inna Stepanova. Para a pequena torcida presente naquele dia, o resultado pouco importou. Zahra ganhou o públicou assim que assumiu sua posição para a prova, sentada em sua cadeira de rodas e com um simpático sorriso no rosto. Cada uma de suas flechadas era comemorada efusivamente – e ela não fez feio, acertando várias vezes no alvo, recebendo a pontuação máxima, o 10.
Mesmo derrotada, Zahra saiu aplaudida. Na área reservada para a conversa com os jornalistas, se emocionou e chorou.
? Eu não conseguia controlar minha empolgação. Uma Olimpíada é algo muito grande, especialmente quando é sua primeira vez. Acho que fui bem, mas a russa foi melhor. Agora quero tentar o ouro na Paralimpíada.
Alguém se atreve a duvidar de Zahra?
Esportes