CIDADE DO PANAMÁ – Quando o britânico Justin Rose deu a tacada decisiva para garantir a medalha de ouro na Olimpíada do Rio, em agosto, dirigentes da Confederação Brasileira de Golfe (CBG) também comemoravam. Não pelo título de Rose em si, mas pelas avaliações positivas do Campo Olímpico da Barra, que caiu nas graças dos golfistas estrangeiros e foi o único equipamento construído para as Olimpíadas repassado a uma confederação esportiva logo após os Jogos.
A CBG ainda considera ter em mãos um ativo valioso, que abre a expectativa de impulsionar o esporte no país. Alguns sinais de alerta, contudo, já aparecem meses após a Olimpíada, como o custo de manutenção e falta de estrutura complementar ao campo. A esperança de trazer torneios importantes para o Brasil, por enquanto, permanece em espera. Os organizadores do Latino-Americano amador de golfe (LAAC), cuja edição de 2017 terminou neste domingo no Panamá, preferiram levar o torneio em 2018 para o Chile, que emplacou também o campeão deste ano: Toto Gana, de 19 anos. O melhor brasileiro foi Gustavo Chuang, que terminou em 26º.
– Estamos de olho no legado que esse campo representa e tivemos algumas dúvidas neste momento. É um campo extraordinário, que contribuiu muito para o sucesso dos Jogos e a divulgação do golfe. Mas precisamos aguardar os próximos passos – disse Mike Davis, diretor-executivo da USGA, instituição fundadora do LAAC.
Construído em uma Área de Proteção Ambiental (APA) de 1 milhão de m² (equivalente a 120 campos de futebol), na Barra da Tijuca, o impacto do Campo Olímpico jamais passou despercebido: foi alvo de disputas judiciais e críticas de ambientalistas, contrários especialmente à desafetação de 58 mil m² do Parque de Marapendi para que fizesse parte do campo. Seus defensores, por sua vez, alegavam que a maior parte da área estava degradada e que o campo ajudaria, na verdade, a recuperar a vegetação. A lei sancionada pelo então prefeito Eduardo Paes para permitir a construção do campo também autorizou a construção de 23 prédios de 22 andares na APA.
PÚBLICO, NÃO GRATUITO
A administração do campo caberá à empresa CRS, que tem entre seus sócios Carlos Favoreto, dono da ECP, empresa de licenciamento ambiental que cuidou da obra do campo. O comando operacional caberá a Paulo Pacheco, ex-presidente da CBG, que foi sucedido na entidade em janeiro por Euclides Gusi. Pacheco afirma que será uma espécie de “CEO voluntário”, sem receber pela atuação na CRS, e exibe forte crença na importância do Campo Olímpico para gerar uma onda favorável ao crescimento do golfe no Brasil:
– O golfe poderá ser o maior legado dos Jogos Olímpicos no Rio – aposta Pacheco. – Acredito na viabilidade econômica deste esporte e em seu papel na inclusão social. Como o campo do Rio é público, aumentará o número de jogadores. A CBG também poderá usá-lo em seu projeto para atletas de alto rendimento. No longo prazo, quando a viabilidade econômica deste campo for comprovada, será incentivo para a difusão do golfe no país.
A CBG cuida desde o fim dos Jogos Olímpicos da gestão do campo, que funciona em regime de “soft opening”, com quatro buracos gratuitos e custo de até R$ 250 para uma volta completa. Os preços serão revistos quando ocorrer o “grand opening”, isto, é, quando a estrutura complementar estiver pronta. Mas o acesso será muito mais simples do que em outros campos do país, todos pertencentes a clubes, cujos sócios pagam milhares de reais sem taxas e mensalidades.
O custo mensal de manutenção do Campo Olímpico está na casa de R$ 400 mil. Para que o campo seja sustentável financeiramente, é necessário um “upgrade” no entorno, com a construção de lojas, bares e uma academia para formação de golfistas. O investimento, que gira entre R$ 4 milhões e R$ 5 milhões, sairá dos sócios da CRS, que só esperam retorno em dois ou três anos. Pacheco projeta que o campo estará totalmente operacional em março.
CELEIRO DE ATLETAS
Nico Barcellos, diretor-técnico da CBG e treinador da equipe brasileira no LAAC de 2017, disputado no Panamá, considera o Campo Olímpico do Rio tecnicamente desafiador, especialmente pela incidência de vento. Barcellos vê potencial no campo para reunir golfistas brasileiros em períodos de treinamento antes de competições importantes, como as enfrentadas em janeiro deste ano: depois do Latino-Americano, quatro brasileiros (Herik Machado, Daniel Ishii, Gustavo Chuang e Pedro Nagayama) seguem para o Sul-Americano de golfe, na Argentina.
Para que o “green” olímpico se transforme em celeiro de novos jogadores, contudo, ele ressalta a necessidade de investir na estrutura auxiliar, além de manter seu caráter público.
– O golfe tem três problemas no Brasil: acesso, custo e o nível de profissionais para dar aula. Com o Campo Olímpico, podemos dentro de algum tempo avançar nessas três questões. O que foi entregue até agora é apenas o campo, falta a infraestrutura necessária para surgirem talentos. De qualquer forma, o campo é uma dádiva, e que não existira sem os Jogos Olímpicos – avalia.
Além do uso público, um dos trunfos que a CBG pretendia explorar no Campo Olímpico é seu elogiado nível técnico, um fator importante para receber etapas de grandes circuitos profissionais que poderiam lançar mais atenção sobre o golfe no país. Para isso, contudo, é necessário não só uma onda, e sim uma tsunami de dinheiro. A continuidade do Aberto do Brasil como etapa do PGA Latino em 2017, que ainda não está assegurada, exige dos organizadores a capacidade de pagar bolsas de participação que totalizam U$ 175 mil.
O Brasil Champions, torneio realizado no São Paulo Golf Club e que foi etapa do circuito Web.com nos últimos quatro anos, já foi retirado do calendário de 2017. Além da bolsa de U$ 700 mil, o torneio contava pontos para a classificação ao PGA Tour, o mais importante do mundo, um atrativo a mais para golfistas de alto nível. Sem o apoio de patrocinadores, restará ao campo tentar gerar ‘marolas’ com torneios que pagam bolsas menores ou competições amadoras, que não têm prêmio financeiro.
*O repórter viaja a convite do LAAC