Um dos mais tradicionais torneios de tênis do mundo, Wimbledon só aceita jogadores que disputem as partidas em sua grama sagrada impecavelmente vestidos de branco. No tênis de mesa, porém, o branco sequer entra na quadra. Ou melhor, só existe uma ocasião em que um atleta pode jogar de branco. É quando a bolinha é laranja. Nesse caso, o laranja é que passa a ser a cor proibida do jogo.
Esta é apenas uma das curiosidades do tênis de mesa que os cariocas poderão observar a partir de hoje, quando começam as disputas no Pavilhão 3 do Riocentro.
Esporte dominado pelos chineses (o país conquistou 24 das 28 medalhas de ouro e 47 das 88 medalhas da história dos Jogos), o tênis de mesa também tem seus jogadores catimbeiros e que gostam de fazer uma cera.
– Tem gente que faz cera para caramba. Que enrola, passa a mão na mesa, depois passa de novo, volta, respira. Você pode ir na toalha a cada seis pontos. Mas tem gente que demora, limpa bem o suor, tudo para atrapalhar o adversário – conta Cazuo Matsumoto, um dos representantes do Brasil na Olimpíada do Rio.
Cazuo vai disputar o torneio de duplas. E já está preparado para alguns hábitos que não são exatamente dignos de um espírito olímpico.
– Tem gente que grita exageradamente, faz escândalo e atrapalha o adversário. Outros pegam a bolinha para sacara logo e não dar tempo do adversário respirar – explica Cazuo, sem revelar qual o jogador ou nação gosta de ser o Dick Vigarista do esporte.
O mesatenista conta que quando a catimba entra em quadra, o árbitro precisa estar atento, pois pode dar uma a advertência ao jogador. Pode sobrar até um cartão amarelo.
O tênis de mesa também conta com um sistema de aceleração, para que os sets não ultrapassem 15 minutos. Quando o jogo chega nesta fase, as trocas de bola não podem passar de 20.
– Nesse caso, você tem que finalizar o ponto. Comigo isso quase nunca aconteceu, mas tem um árbitro que conta cada toque na bola. Acontece muito em jogo de menina. Às vezes, você tem duas jogadoras que só defendem o ponto, não atacam, aí elas demoram bastante.
Outras coisa que não é permitida no jogo é esconder a bolinha na hora de sacar. Nenhuma parte do seu corpo pode estar em volta dela. Na hora de sacar, o jogador também precisa alçar a bolinha pelo menos 16 centímetros acima da palma da mão. Mas os jogadores, em geral, erguem a bola bem mais alto do que isso.
E as mãos que frequentemente os atletas passam na mesa?
– Tem gente que fica perguntando o motivo. É porque a gente sua muito e limpa na mesa. Por isso também que a gente assopra a bolinha, É para secar (a bola).
MUDANÇA NA REGRA
Todo esporte tem suas particularidades e passa por pequenas alterações. Há dois anos, a Federação Internacional de Tênis de Mesa (ITTF, na sigla em inglês) trocou o material do qual são feitas as bolinhas, passando de celuloide para plástico. De perto, parece não haver diferença, embora a bolinha nova tenha o aspecto das bolinhas de pingue-pongue que crianças e adultos costumam comprar para brincar. E, segundo os jogadores, elas quebram mais facilmente.
Uma das justificativas era que o celuloide é tóxico, então seria uma forma de o esporte ser ecologicamente correto. Mas o presidente da ITTF na ocasião, o canadense Adam Sharara, também declarou na época que o objetivo era tornar o jogo mais lento, pois a velocidade dos mesatenistas chineses estava tornando o jogo quase impossível de ser apreciado pelo espectador comum. Seu objetivo era ajudar a tornar o esporte um pouco mais popular e vendável para a TV.
– A bola é um pouquinho maior e acho que a outra era mais densa. Teoricamente ia fazer o jogo ficar mais lento, mas você vendo não percebe nada. Depois que treina um pouquinho, você já se acostuma – diz Hugo Calderano, principal mesatenista brasileiro.
Hugo é um dos quatro brasileiros que estreiam hoje na competição. Ele enfrenta o cubano Andy Pereira, às 16h. Às 9h, Caroline Kumahara será a primeira brasileira a competir. Ela enfrenta a australiana Melissa Tapper. Logo depois, às 11h15m, Lin Gui pega a espanhola Galia Dvorak. Fechando o dia, Gustavo Tsuboi joga às 19h15m contra o vencedor da partida entre o egípcio Khalid Assar e o congolês Jianan Wang.
Ao contrário de Hugo, Cazuo conta que no início sentiu muita diferença com a mudança da bolinha.
– É uma diferença enorme. Mas com o passar do tempo, você vai treinando e se acostuma.
Os jogadores dizem ainda que se o objetivo foi frear a velocidade do jogo, a mudança da bolinha não teve efeito, pois a evolução tecnológica do esporte acabou compensando a mudança do material.
– A bolinha mudou, mas a raquete mudou, a borracha (da raquete)… no final fica a mesma coisa e quem treina, ganha. Não tem muito segredo – diz Cazuo.
– Há muito tempo eles estão tentando fazer o jogo ficar mais lento, mas a fábrica muda as borrachas para ficarem mais rápido. Já falaram que iam aumentar a rede, mas não tem jeito – completa Calderano.
DOPING DA RAQUETE
No tênis de mesa não é apenas o jogador que passa pelo antidoping. A raquete também tem o seu doping particular. Antes das partidas, a ITTF analisa as raquetes de cada jogador, avaliando o tipo de borracha usada, sua espessura, curvatura e brilho (que pode causar reflexo e atrapalhar os adversários). Também é analisado o nível tóxico da cola. Se tudo não estiver perfeito, o jogador pode ser desclassificado.
– Temos três tipos de testes. Se você não passar em nenhum deles, você está desclassificado. Eles medem a grossura (da borracha, que não pode passar de quatro milímetros) e fazem o teste de toxinas para ver se tem algum tipo de solvente que faz a bolinha disparar mais rápida. É como se fosse um bafômetro. Só que no bafômetro tem que ser zero, né? Na raquete tem uma tolerância que é de 2 na máquina. Além do brilho. A raquete não pode ser muito brilhosa para não bater reflexo e atrapalhar o adversário.
O rigor é grande para dar condições iguais a todos os atletas. Por mais que, ao fim do torneio, a tendência é que a China esteja nos lugares mais altos do pódio tanto nos torneios de simples, quanto nos de duplas.