RIO ? Saída do treino da equipe brasileira de tiro esportivo, no Centro Olímpico de Tiro, em Deodoro. O assessor da Confederação Brasileira de Tiro Esportivo pergunta a Janice Teixeira se ela pode falar com o repórter do GLOBO para uma matéria. Links tiro esportivo
? Ué, falo, claro. Não sou muda!
A resposta já deu uma mostra da personalidade e bom humor da gaúcha. Aos 54 anos, Janice é a atleta mais velha da delegação brasileira. Desde que a informação foi divulgada pelo Comitê Olímpica Brasileiro, os pedidos de entrevista aumentaram, mas sempre cercados de ‘voltas’, como ela explica.
? O pessoal chega cheio de dedos, começa falando que sou a mais experiente. Sou a mais velha! Mas aprendi com o meu pai que a idade está na nossa cabeça. Eu me divirto, acabei virando um referencial na Vila Olímpica. Chego no refeitório e falo para cederem o lugar para a pessoa de idade sentar.
Antes de se encontrar no tiro esportivo, Janice foi jogadora de vôlei, tentou o remo e passou pelo handebol. Passou a atirar em 1992. e desde 95 está na fossa olímpica, prova em que a atleta tem que acertar um prato lançado por uma máquina a cerca de 76 metros de distância.
? É um esporte muito apaixonante, muito competitivo. Você compete contra o seu erro. É um desafio a cada minuto. Você acha que está bem e aí vem o próximo prato, essa ‘criatura’ que fica rindo de mim se eu não o despedaço no ar .
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A relação de Janice com o prato que serve como alvo merece mais uma pergunta. O que ela sente quando erra o tiro?
? Olha, me dá uma raiva quando ele passa voando e eu não acerto. Às vezes me dá vontade de ir lá no meio do campo e quebrar ele com a mão! Mas isso é o que gosto no esporte, você tem que ser agressivo contra algo que você tem que quebrar.
Se alguém ficou com medo, pode relaxar. Essa agressividade, garante Janice, se resume apenas ao tiro esportivo.
? Claro. Fora do esporte sou uma flor!
Criada em uma fazenda, Janice é apaixonada por animais, especialmente cavalos e cachorros, que ela compara a anjos. O assunto a deixa mais empolgada ainda. Os olhos brilham.
? Eu falo com todos os cachorros na rua, chamo todos de ‘mimosinho’. Olha esse aqui que encontrei ontem na frente da Vila Olímpica ? diz Janice, mostrando no celular a foto de uma bela cachorra branca.
? Mas vamos voltar ao tiro? Porque se eu começar a falar de cachorro, não paro mais e a entrevista acaba não saindo.
CONFIANÇA NA MÃO ‘DELE’
Voltemos ao tiro, portanto. Amanhã, Janice fará sua estreia olímpica. Ela diz que o tão comum friozinho na barriga passa longe. Garante ter felicidade e orgulho por estar competindo e representando o Brasil. Medalha? É difícil, ela confessa, mas quem sabe com uma ajuda divina…
? Não sei como vai ser no dia da prova. Tem atletas muito fortes e é difícil eu dizer que posso ganhar uma medalha de ouro. Mas olha, quando Ele lá em cima bota a mão na minha cabeça, não tem quem me segure.
Janice volta a falar de Deus ao recordar o grande susto que passou em agosto de 2008, quando sofreu um AVC frontal. Foi levada a um hospital em Bento Gonçalves sem fala e com um lado do corpo paralisado. Foram oito dias internada.
? Era para eu ter ficado destruída. Sempre tive uma vida regrada, e é por isso que estou aqui falando contigo. Me sinto abençoada de estar aqui e também por isso essa Olimpíada tem uma felicidade maior. Mudei muito depois do AVC. Aprendi a não ser tão crítica comigo mesma, a ser mais light.
Menos com os pratos que servem como alvo.