Política

Quem é Boris Johnson, o novo -- e polêmico -- premiê britânico

Ex-prefeito de Londres, ele participa da vida pública do Reino Unido desde os anos 1980, entre sucessos e controvérsias: sua meta é tirar o país da União Europeia

Quem é Boris Johnson, o novo -- e polêmico -- premiê britânico

O novo líder do Partido Conservador e primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, é um dos políticos mais conhecidos do seu país tanto por sua longa carreira em vários cargos da administração estatal como pela sua personalidade cômica, diferente da seriedade que a vida pública costuma exigir.

Durante toda sua carreira, primeiro como jornalista, depois como parlamentar, professor de cursos de administração, prefeito de Londres e chanceler do Reino Unido, todos os sucessos vieram na mesma intensidade que as polêmicas. No mês passado, em que seu nome era o favorito para assumir o comando do país, enquanto era xingado de “mal-caráter” por uns, era chamado de “tesouro nacional” por outros.

O carisma de Johnson aparece inicialmente na maneira como se apresenta: cabelos louros sempre bagunçados, camisas amassadas e muitas vezes para fora das calças, como exige a etiqueta britânica. Mas suas atitudes conseguem superar essa primeira imagem. Em 2012, quando o Reino Unido ganhou a primeira medalha de ouro das Olimpíadas de Londres, ele pulou de bungee jumping com duas bandeiras do país nas mãos.

Nos últimos anos, Boris Johnson assumiu um papel central na campanha em favor da saída do Reino Unido da União Europeia, processo que ficou conhecido pela expressão “Brexit” (união das palavras British e Exit, “saída”, em inglês). Ele afirmou diversas vezes que, uma vez nomeado primeiro-ministro, tiraria o Reino Unido do bloco até o dia 31 de outubro — último dos prazos dado pelos negociadores europeus — com ou sem acordo.

Seus críticos, porém, apontam que a sua postura anti-Europa não esteve sempre clara: em 2013, em um artigo publicado no tablóide Daily Telegraph, ele argumentava, por exemplo, que sair da UE não seria a solução para os problemas do Reino Unido. A mudança de percepção sobre o futuro do país o levou, inclusive, a bater de frente com seu irmão, Jo Johnson, congressista que apoia a permanência a UE.

Jo Johnson renunciou ao cargo de ministro dos Transportes no gabinete de Theresa May por sua defesa da realização de um novo referendo sobre o Brexit — o primeiro, em 2016, terminou com a vitória da saída do bloco por 51,8% dos votos.

Alexander Boris de Pfeffel Johnson, curiosamente, é estadunidense: descendente de turcos, franceses e alemães, ele nasceu em Nova York, nos Estados Unidos, em 1964. De família rica, completou os primeiros estudos na famosa Eton School, em Windsor, fundada pelo rei Henrique VII em 1440 para abrigar os filhos de príncipes, diplomatas, acadêmicos e heróis militares — 19 primeiros-ministros britânicos estudaram lá.

O pai de Boris, Stanley Johnson, foi um deputado conservador (Tory) e trabalhou no Banco Mundial e na Comissão Europeia — motivo pelo qual é um fervoroso defensor da União Europeia, ao contrário do filho. Apesar disso, ele e o irmão, Jo, estiveram no anúncio da liderança dos Tories, na última semana de julho, quando a família viu seu sobrenome chegar a 10 Downing Street.

O novo primeiro-ministro é formado em Estudos Clássicos pela Universidade de Oxford, onde também iniciou sua carreira no movimento estudantil, nos anos 1980. Trabalhou como repórter do tradicional jornal The Times até o periódico descobrir que ele tinha falsificado uma fala sobre o suposto da amante de Eduardo II, atribuindo-a ao historiador Colin Lucas, professor em Oxford, que também é seu padrinho. Tempos depois, ele se arrependeu.

“Me senti muito culpado e envergonhado por esse erro. O The Times era um lugar sagrado pra mim”, disse em uma entrevista há dois anos. A carreira jornalística, porém, seguiu: foi contratado pelo The Daily Telegraph, onde trabalhou como correspondente em Bruxelas, na Bélgica — onde fica a sede da União Europeia — por cinco anos. Foi da capital belga que passou a escrever artigos críticos à relação entre o Reino Unido e o bloco europeu, tornando o euroceticismo uma postura cada vez mais ardorosa na direita britânica.

Em um dos seus artigos mais polêmicos, Boris Johnson insinuou que Jacques Delors, francês que presidia a Comissão Europeia à época, tinha um plano de criar o cargo de presidente permanente da UE para aumentar o poder do bloco em relação aos estados-membros. A denúncia, porém, nunca se tornou realidade.

Um dos episódios mais controversos da vida do novo primeiro-ministro, porém, aconteceu em 1990: Boris foi gravado secretamente conversando por telefone com um amigo da época da Eton, Darius Guppy, lhe orientando a ir até a casa de um jornalista que o havia criticado para espancá-lo. O repórter em questão nunca foi alvejado, mas as orientações de Johnson se tornaram públicas em 2009, quando o áudio caiu na mão do canal Channel 4.

“Eu estava um pouco nervoso, mas nada do que eu falei aconteceu, de fato”, disse à BBC anos depois. Entre 1990 e 1994, Boris Johnson trabalhou como subeditor do Telegraph e, em 1999, se tornou editor da revista The Spectator, onde ficou até 2005 — quatro anos antes, ele tinha sido eleito deputado pelo distrito tradicionalmente conservador de Henley-on-Thames.

Outra polêmica aconteceu quando ele já era congressista: em 2004, o então líder dos Tories, Michael Howard, lhe ordenou ir pessoalmente a Liverpool se desculpar por um artigo em que ele acusava os habitantes da cidade de se regozijar demais por causa de um engenheiro local que fora morto no Iraque, no contexto da guerra em que o Reino Unido invadiu o país com os Estados Unidos.

Ainda assim, um ano depois, o então premiê David Cameron nomeou Boris Johnson como ministro da Educação Superior do Reino Unido, mesmo com seu partido na posição. Numa das poucas cenas de protagonismo do cargo, disse que na Papua Nova Guiné, um arquipélago na Oceania, ao norte da Austrália, só existiam “canibais e matança de líderes tribais”.

Em 2008, enfim, se tornou prefeito de Londres, cargo em que permaneceu até 2016. Na administração de uma das principais metrópoles do planeta, Boris Johnson tomou medidas populares, como proibir o consumo de álcool no transporte público e lançar um sistema de aluguel de bicicletas no centro a cidade — até hoje elas são apelidadas pelos londrinos de “Boris bikes”. Em 2012, foi uma das estrelas das Olimpíadas sediadas na capital britânica, consideradas pelo mundo todo como exitosas.

Em 2016, quando já havia voltado ao parlamento, Boris se tornou chanceler no gabinete de Theresa May, um reconhecimento da então premiê ao papel que ele tinha desempenhado como líder da campanha do Brexit. A imprensa não deixou de criticá-lo quando ele sustentou boa parte dos seus discursos dizendo que o Reino Unido envia cerca de £350 milhões (R$ 1,61 bilhão) ao bloco europeu — algo que não é verdade, porque o país possui reembolsos da UE e o bloco ainda possui investimentos em território britânico.

Porta-voz do chamado “Brexit duro” dentro dos Tories, ele precisou sair do governo de May há um ano por criticá-la no contexto da primeira proposta de acordo apresentado pela primeira-ministra. O texto foi rejeitado pelo parlamento muito por causa de seus apontamentos. Desde que Theresa May renunciou, há pouco mais de um mês, incapaz de conseguir um acordo no Legislativo britânico, Johnson se tornou o grande favorito para assumir a liderança do partido e, como tem a maioria dos deputados, se tornar primeiro-ministro.

Fonte: Conversion