Política

Promotoria ouve diretores sobre obras há anos paradas

Cascavel – A investigação sobre suposto esquema de desvio de dinheiro da Secretaria de Educação do Estado para abastecer campanhas políticas do PSDB e aliados – inclusive do ex-governador Beto Richa, hoje pré-candidato ao Senado – estende-se agora a diversas obras inacabadas. É o que aponta novo desdobramento da Operação Quadro Negro.

Neste mês, conforme informações exclusivas obtidas pelo Jornal O Paraná, o foco está em obras que se arrastam há anos – deixadas pela metade por empreiteiras, com indícios de favorecimento político e divisão de recursos públicos.

São centenas de construções de salas de aula, laboratórios e áreas administrativas iniciadas entre 2011 e 2018 – período do Governo Beto Richa.

Além das obras já conhecidas – 18 instituições já investigadas pela Operação Quadro Negro cujos desvios foram confirmados -, agora o Ministério Público se debruça sobre outras unidades. A auditoria envolve repasses do Estado e da União para novas escolas e reformas: a proposta da Promotoria Pública é verificar se os recursos foram devidamente aplicados, se as empreiteiras executaram o serviço conforme licitação – inclusive se houve conivência do governo estadual com irregularidades praticadas pelas empresas. Os questionamentos foram enviados aos chefes de Núcleos Regionais de Educação e também aos diretores. Além disso, engenheiros e outros servidores foram ouvidos pelos promotores. O procedimento está em andamento em todo o Paraná.

Abandono

No oeste do Paraná, o Colégio Estadual Wilson Joffre, um dos maiores de Cascavel, está entre os investigados: em 2014 foi iniciada a construção de uma estrutura dedicada a salas e laboratórios técnicos. A obra já virou novela. Estudantes se formaram sem ter acesso às salas. E o pior: a estrutura começa a se decompor com o passar do tempo, afinal de contas, são quatro anos de ferragens expostas ao sol e chuva. Em 2009, o Colégio Wilson Joffre se inscreveu no Programa do governo federal Brasil Profissionalizado. No mesmo ano, houve a liberação de R$ 754.391,64 para o início da construção. Em 2013, houve o processo licitatório e o valor total passou para R$ 1,35 milhão. “Executaram 30% dos serviços previstos e abandonaram a obra. Falta muita coisa ainda e como as obras pararam o tempo danifica a estrutura. Tem infiltração e ferrugem”, resume a diretora Edna Soares.

No projeto, estava prevista a construção de três laboratórios – um de química, outro de biologia e um de informática. Hoje os alunos estudam em dois laboratórios que ocupam duas salas de aula, o espaço é pequeno e cabe no máximo 30 alunos. “Se tivéssemos a estrutura pronta, as salas seriam usadas só como laboratórios. Hoje temos espaços improvisados”, lamenta.

Relatórios de obras inacabadas

Os diretores dos colégios estaduais que tiveram obras iniciadas estão recebendo questionamentos do Ministério Público Estadual e também da Procuradoria da República. É o caso do Ceep (Centro Estadual de Educação Profissionalizante) Pedro Boaretto Neto, em Cascavel. A obra passa a integrar a investigação: a estrutura de uma nova ala foi iniciada, mas não pode ser usada por falhas no projeto. Além disso, os 6% que faltam dos serviços inviabilizam os espaços. “Em alguns pontos identificamos rachaduras e infiltração. Tem ainda problemas elétricos: equipamentos necessitam de carga de 220 KWH, mas as tomadas são 110 KWH”, diz o diretor Jorge Afonso Cesari.

O relatório da obra inacabada foi encaminhado ao Ministério Público em Curitiba e a investigação relacionada à Operação Quadro Negro está sob o comando do promotor Gustavo Henrique Rocha Macedo. A assessoria de imprensa do MP informou que as investigações tramitam em sigilo e que o promotor não pode falar a respeito e apenas confirmou se tratar de investigação da Operação Quadro Negro.

DIFICULDADES

Além das falhas elétricas, a empreiteira deixou salas sem quadros e portas inadequadas no Ceep. Foram pagos à empresa R$ 3,6 milhões e agora a Secretaria de Estado de Educação abriu novo processo licitatório de R$ 420 mil para concluir os serviços e corrigir os erros da obra iniciada em 2013. “O local seria usado para atender a demanda do novo curso de Edificações. Matriculamos mais de 400 alunos sem as salas”, diz o diretor.

Obra da Quadro Negro é retomada

Em Santa Terezinha de Itaipu, após nova licitação, o Colégio Estadual Arcângelo Nandi teve a construção retomada pelo governo do Estado. As obras começaram há um mês. A estrutura também é alvo da investigação da Quadro Negro: a antiga empreiteira havia recebido sem executar a obra.

A nova empreiteira escolhida receberá R$ 3.481.582,54 para edificar 12 salas de aula, ginásio, laboratórios e espaço administrativo. A estrutura tem que ficar pronta até o fim do ano. “Esperamos que a obra seja concluída para atender a demanda de alunos da cidade”, diz a chefe do NRE, Ivone Müller.

Já o Centro Estadual de Educação Profissionalizante de Medianeira – também de responsabilidade do NRE de Foz e alvo da operação estadual – está com as obras paradas.

Outra estrutura alvo da operação é o Colégio Estadual Monteiro Lobato, em Marechal Cândido Rondon: a estrutura foi entregue em março do ano passado, mas com várias falhas, como rachaduras em pilares, infiltrações e pisos irregulares.

Investigação requerida ao TCU

O Sistema Integrado de Monitoramento Execução e Controle do Ministério da Educação aponta que, das 1.499 obras de escolas, creches e quadras poliesportivas no Estado do Paraná, 111 estão canceladas, 75 paralisadas e 251 ainda não foram iniciadas.

Em dezembro, o deputado federal Alfredo Kaefer (PP-PR) acionou a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados para cobrar a fiscalização das obras nas escolas do Paraná. A proposta, aprovada, solicita ao TCU (Tribunal de Contas da União) que apure denúncias de desvio de dinheiro público federal no âmbito da Operação Quadro Negro. A proposição cita – como exemplo das consequências geradas pelas supostas irregularidades – a obra de uma escola em Campo Largo, orçada em R$ 7 milhões, a qual deveria ter sido concluída há dois anos e meio.

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