Brasília – Na proposta de colaboração premiada feita à PGR (Procuradoria-Geral da República), o engenheiro civil Maurício Fanini implica diretamente o ex-governador Beto Richa (PSDB) nos fatos investigados pela Operação Quadro Negro, que revelou esquema de desvio de dinheiro da construção e de reformas de escolas no Paraná. Os valores ultrapassam R$ 20 milhões. As informações foram divulgadas pelo Paraná TV, da RPC, que teve acesso à proposta. Beto Richa e demais citados negam irregularidades.
Fanini já é réu na Quadro Negro e está preso desde setembro. Neste ano, ele foi transferido a Brasília supostamente por questão de segurança. Ele negocia sua delação com a PGR, que ainda não teria assinado os termos do acordo.
Conforme as investigações do Ministério Público, Fanini era quem operava o esquema de desvio. Ele foi diretor de Engenharia, Projetos e Orçamentos da Secretaria de Educação entre 2011 e 2014. De acordo com ele, Richa sabia dos desvios e era procurado diretamente para tratar do assunto. O ex-governador teria, ainda, pedido pessoalmente a Fanini para que ele arrecadasse dinheiro para a campanha de 2018 com as empresas envolvidas no esquema.
Em seu depoimento, Fanini conta que os recursos seriam destinados para a campanha de Richa, a de seu filho, Marcello, e a do irmão, José “Pepe” Richa.
Viagens internacionais
Na proposta de delação, Fanini afirma que parte do dinheiro teria sido destinada a viagens realizadas por Richa e sua esposa, Fernanda, com Fanini e outros amigos. As despesas de viagens para Las Vegas, em 2010, para os EUA e para o Caribe teriam sido pagas por empresários que possuíam contratos com o governo do Estado, disse Fanini.
Propina começou em 2001
Em sua delação, Maurício Fanini disse que Beto Richa passou a cobrar propina ainda em 2001, quando era vice-prefeito da capital paranaense. Na época, Fanini era diretor de Pavimentação de Curitiba, indicado por Richa, de quem diz ter se tornado amigo muito próximo desde a faculdade de Engenharia, em 1983.
A primeira oferta de propina a Richa, afirma o ex-diretor, foi feita por Eron Cunha, dono da construtora Empo, por meio de um aditivo indevido de R$ 100 mil em uma obra de pavimentação no bairro curitibano do Cajuru, ainda em 2001. Mas a transação acabou não se concretizando.
Fanini afirma que Beto Richa passou efetivamente a abastecer campanhas eleitorais com dinheiro de caixa 2 em 2002, quando concorreu pela primeira vez ao governo estadual e perdeu para Roberto Requião (PMDB).
O dinheiro partia de empresários, por meio de aditivos e percentuais de contratos com a Prefeitura de Curitiba. Conforme o relato, o recebimento era sempre negociado por Ezequias Moreira (secretário) e Luiz Abi, primo de Beto Richa.
O ex-diretor diz que, com a derrota, diante de muitas dívidas, Richa ordenou, por meio de Abi, que fosse arrecadado mais dinheiro, com urgência. Sem conseguir atender, Fanini foi exonerado em maio de 2003.
Fanini conta que dois meses depois, na festa de aniversário de um dos filhos de Richa, ele o chamou de volta, e passou a arrecadar mais propina, agora para a campanha de Beto à Prefeitura de Curitiba, em 2004.
Segundo Fanini, Beto seguiu recebendo arrecadações de empresários durante o mandato na prefeitura, até a eleição ao governo do Paraná, quando Fanini ganhou um cargo na Secretaria de Educação. As arrecadações, a partir de 2013, passaram a ser mensais, segundo Fanini. O dinheiro era deixado por intermediadores no banheiro de uma sala da Sude e depois levado para a casa dele, onde permanecia até ordem do governador, então repassados a Luiz Abi.
Réu diz que foi orientado a apagar provas contra Richa
Na proposta de delação premiada, Maurício Fanini cita o vazamento de informações e a interferência do ex-governador Beto Richa (PSDB) em processos de investigação envolvendo membros do Executivo estadual.
Fanini disse que, no mesmo dia em que a secretaria foi inquirida pelo Ministério Público a respeito de uma denúncia de que o réu receberia dinheiro de empreiteiras, conversou com Richa, que “estava desesperado”. O tucano estava apagando mensagens e fotografias de seu celular e pediu que Fanini fizesse o mesmo, para eliminar imagens e trocas de conversas entre os dois e também com Luiz Abi, que também foi preso na esteira de investigações de desvio de dinheiro público.
Fanini relatou que foi chamado para uma reunião com o então chefe de Gabinete, Deonílson Roldo, e que foi cobrado para resolver o atraso nas obras de escolas investigado pela Quadro Negro, caso contrário haveria um escândalo que seria “uma flecha no coração” do tucano.
Ex-governador nega acusações
Em resposta à reportagem do G1 Paraná, o ex-governador Beto Richa disse, em nota, que a delação foi vazada de forma criminosa e que se trata de uma “manobra arquitetada às vésperas do período eleitoral”. Ainda de acordo com o tucano, Fanini “mente descaradamente”. “O que esses criminosos pretendem? Ora, a resposta é muito simples! Pretendem conseguir a redução das penas a que certamente serão condenados pelos crimes cometidos e já confessados à Justiça, mesmo que para isso tenham que envolver pessoas honestas. No caso de Maurício Fanini, a condenação pelos crimes praticados e por ele próprio confessados chegará a 50 anos de prisão! Portanto, está mais do que explicado por que Fanini tenta delatar tudo e todos, sem, no entanto, apresentar quaisquer indícios de provas”, diz trecho da nota, que acrescenta: “Qual a razão de dar credibilidade a um criminoso que realizou 870 depósitos em dinheiro vivo, em sua própria conta corrente, pagou cartões de crédito em dinheiro vivo e formou um patrimônio incompatível com sua renda? É uma tentativa desesperada de delação, que pela ausência de provas, não será aceita pela Justiça. São acusações criminosas, com o objetivo de envolver pessoas inocentes, retirando o foco das fraudes por ele cometidas. E para isso, mente descaradamente. Nem eu, nem qualquer membro da minha família, recebeu dinheiro desviado dos cofres públicos.”
“Repito: é uma delação criminosa, sem provas, que busca apenas confundir as pessoas. Espero que a Justiça apure e esclareça rapidamente essa questão, para que os culpados sejam punidos de forma exemplar.”
Ezequias Moreira disse que as informações são mentirosas e que jamais pediu a Fanini para que arrecadasse dinheiro ilícito. Ele afirma que o ex-diretor da Secretaria de Educação busca “terceirizar suas atitudes inescrupulosas e criminosas com o único intuito de buscar uma redução de pena”.