Opinião

Coluna Amparar: Quando a discussão de casal é positiva?

O mais comum é a discussão que ultrapassa os limites da civilidade e deixa cicatrizes profundas

Coluna Amparar: Quando a discussão de casal é positiva?

Refletimos nas duas últimas postagens sobre a “boa discussão” entre o casal. Infelizmente, porém, a experiência mostra que isso é exceção e não regra. O mais comum é a discussão que ultrapassa os limites da civilidade e deixa cicatrizes profundas. Isso acontece especialmente quando se utiliza uma linguagem que ofende a dignidade do outro. Algumas vezes chega ao ponto de destruí-la de tal modo que a pessoa se sente incapaz de se olhar como ser humano digno de valor. Semelhantes lesões podem ser tão graves que as feridas psicológicas infligidas dificilmente terão como ser curadas. É sobre essa situação que vamos refletir nas próximas postagens.

A linguagem é a ferramenta que torna possível a comunicação com nossos semelhantes. No entanto, ela pode ser usada tanto para expressar os sentimentos mais belos quanto para destruir o que existe de melhor no outro. Aqui, vamos tratar desse segundo modo de utilização.

Utilizamos da linguagem de forma a machucar a outra pessoa quando empregamos termos ofensivos com o objetivo de atingi-la propositadamente em pontos que sabemos que doem. Em uma relação de casal, os cônjuges conhecem quais são as dores um do outro. Quando acontecem as discussões com ofensas, as palavras escolhidas são aquelas com maior potencial de provocar sofrimento. A linguagem, neste caso, funciona como uma faca, um “bisturi”, para fazer “sangrar” as feridas do outro. O cônjuge quer mesmo provocar sofrimento no outro.

Nesse caso, a pessoa se utiliza da linguagem como instrumento de punição e vingança. Para tanto, os termos utilizados, em geral, visam atingir o amor próprio do parceiro, fazê-lo sentir-se menos, sentir-se indigno, envergonhado, culpado. O triunfo acontece quando um dos cônjuges sente o outro abatido. Como em um duelo de espadas, misericordiosamente se contenta em ver o outro sangrar e não lhe confere o “golpe de misericórdia”. Quando essa dinâmica se estende ao longo do muito tempo, chega a provocar uma autoimagem tão negativa nesse cônjuge a ponto de, por vezes, sequer conseguir olhar-se no espelho, tal a vergonha que sente de si.

Dinâmicas assim, muitas vezes, funcionam porque um dos parceiros, querendo uma relação pacífica, se cala, não reage, consente. O outro, por sua vez, interpreta esse comportamento passivo como atitude de desdém e eleva ainda mais o tom da conversa e baixa ainda mais o nível dos termos ofensivos. Não poucas vezes a agressão desanda para a agressão física. Dificilmente uma relação que chega a esse nível resiste e ela acaba em separação, não necessariamente por iniciativa de quem costumeiramente é vítima da agressão, e sim de quem a pratica.

Um casal cuja relação chegou a esse nível precisa de ajuda profissional. Como sempre, quando se trata de terapia de casal, em primeira linha não está o objetivo de “salvar” a relação e sim de curá-la, podendo continuar ou não.

É muito importante que o casal tenha em conta que o respeito precede o amor. Pode até existir amor, mas, se não houver respeito, o amor não resiste. Por outro lado, se houver respeito, ainda que não exista amor, a relação tem possibilidades de continuar.


JOSÉ LUIZ AMES E ROSANA MARCELINO são terapeutas sistêmicos e conduzem a Amparar.

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