Por 40 minutos, Rogério Micale respondera a perguntas. Em seguida, por dez minutos, cercado de jornalistas, falou descontraída e informalmente sobre conceitos de jogo, métodos de treinamento e explicou a lógica por trás de cada atividade da seleção olímpica.
Foi um dia de choque cultural na Granja Comary. Não apenas porque Micale foi acessível, aberto ao diálogo. Mas porque colocou questões táticas na pauta, falou claramente do modelo que pretende ver na seleção. Discutiu futebol, algo raro em tempos tão fechados. Horas depois, surpreenderia no campo, onde seus conceitos ficariam mais visíveis.
A primeira surpresa estava no gramado. Fitas demarcavam linhas horizontais, paralelas ao fundo do campo. Havia, ainda, linhas pontilhadas verticais. Cones coloridos completavam o cenário. A nova marcação do gramado deverá persistir enquanto a seleção olímpica treinar em Teresópolis. Delimita o que técnicos chamam de quadrantes do campo. Dão apoio aos trabalhos táticos.
– A marcação permite uma assimilação mais rápida dos atletas. Delimita setores em que eles vão saber o que precisam fazer e dá noção clara dos momentos ofensivo e defensivo. É didática – disse Micale.
Antes de rolar a bola, ele levou os jogadores para o campo com um quadro apoiado em um tripé. Explicou o que pretendia. Num espaço reduzido de campo, usou os 14 convocados disponíveis, mais os reforços da seleção sub-20, num trabalho técnico que desenvolvia troca de passes e o chamado jogo apoiado – aproximação para criar opção de passe.
O zagueiro Marquinhos e o meia Renato Augusto ainda não se apresentaram. Além deles, Douglas Santos, que jogara na véspera pelo Atlético-MG, e Rafinha, que ainda se recupera de lesão, não treinaram.
Enquanto isso, os goleiros trabalhavam à parte: e só usavam os pés. Só foram tocar a bola com a mão após os jogadores de linha saírem do campo. Eis outro conceito de Micale: para dominar o jogo e atuar no campo do rival, a seleção precisará do apoio dos goleiros por trás.
Passados alguns minutos, os assistentes de Micale recolheram as fitas e as colocaram paralelas à linha lateral. Uma delas, quase dividia o comprimento do campo ao meio. O objetivo era demarcar áreas de movimentação dos jogadores. Laterais e um dos atacantes, por mais que a bola estivesse do lado oposto, não atravessavam a linha. Davam opção para um ponto chave do jogo de Micale: a inversão da jogada.
– Somos muito fortes pelos lados – repete sempre o treinador. – Vamos trabalhar muito a inversão da bola para encontrar o extrema em boa condição para o drible.
Nas duas laterais e nas linhas de fundo, os goleiros e o preparador deles, Rogério Maia, serviam de apoios. E, novamente, só tocavam na bola com o pé.
Por vezes, o lançamento para as pontas virá dos zagueiros. Ao fim do trabalho, Luan e Rodrigo Caio se fartaram de lançar bolas para dois jogadores colocados em quadrados desenhados no campo. O objetivo é treinar o passe longo dos defensores caso a seleção ser pressionada em sua defesa.
Assim, Micale pretende, aos poucos e por setor, implantar os conceitos. Até chegar a exercícios em que dois times completos se enfrentem. Primeiro em campo reduzido, depois em campo inteiro.