A espera foi de sete anos, desde outubro de 2009, quando o Rio foi escolhido para sediar os Jogos Olímpicos e Paralímpicos. Da abertura do primeiro até ontem, passaram-se 44 dias. Do segundo, foram 11 dias em que a cidade compreendeu que o esporte impõe desafios, mas também oferece oportunidades.
Tudo isso se encerrou em cerca de 3 minutos, o tempo para que Ivete Sangalo cantasse ?A paz?, música de Gilberto Gil e João Donato, e artistas corressem com cataventos pelo Maracanã para a pira olímpica se apagar. A chama deixou o Rio com o pedido de que a paz invadisse corações e com a certeza de que todos os dias dos primeiros Jogos sediados num país da América do Sul ficarão eternamente na memória de cariocas e visitantes.
?O mundo precisa das ideias malucas?, disse Mestre Batman, o regente do grupo de percussionistas Batuqueiros do Silêncio, formado por deficientes auditivos, que deu início, ontem, à cerimônia de encerramento da Paralimpíada. A maluquice era a de uma banda de surdos, mas também de pessoas com deficiências diversas competindo em alto desempenho. A maluquice foi, ainda, imaginar que um país repleto de problemas, em crise econômica e política, cuja capacidade de organização foi questionadíssima nos últimos meses, poderia realizar bons Jogos.
A certeza do sucesso foi celebrada num palco montado no Maracanã, onde artistas percorreram os vários ritmos do patrimônio máximo da cultura brasileira, a música. Diferentemente de outras cerimônias, não houve o tradicional desfile dos atletas pelo estádio: quando a festa começou, às 20h, centenas deles já estavam posicionados em lugar de destaque, na área central, bem de frente aos shows. O único desfile foi o das bandeiras carregadas por um atleta de cada delegação. Foi uma opção que agilizou a cerimônia e ajudou a transformar o Maraca num intenso festival de música brasileira. A única exceção foram alguns minutos em que Tóquio, a próxima cidade sede do evento, pôde mostrar um pouco do que planeja para 2020, trazendo artistas japoneses deficientes para brevemente exibirem seus performances para o estádio.
As apresentações foram acompanhadas por imagens em telões e uma narração no estilo das vozes pré-gravadas que falam através de aparelhos celulares ? uma tecnologia que pode parecer um mimo para alguns, mas é fundamental para pessoas com deficiências.
Após os Batuqueiros do Silêncio, os guitarristas Armandinho, Andreas Kisser e Jonathan Bastos tocaram seus instrumentos, enquanto bailarinos cadeirantes, com roupas coloridas, dançavam pelo espaço. Jonathan emocionou o público por sua condição especial: ele não tem os braços e toca, muito bem por sinal, com os pés. O estádio, lotadíssimo como ficaram muitas das competições paralímpicas, aplaudiu de pé. Na sequência, ocuparam o palco a Nação Zumbi (?Maracatu atômico?, ?Quando a maré encher? e ?A praieira?) Vanessa da Mata (?Conto de areia?, ?Por onde ando tenho você? e ?Ai, ai, ai?), Céu (?Baião da Penha?, ?Varanda suspensa? e ?Os grilos?) e Saulo (?One love?, ?Beija-flor?, ?Esperando na janela? e ?Juazeiro?).
Nego do Borel e o Dream Team do Passinho fizeram um medley de funks clássicos, inclusive o ?Rap da felicidade?. Gaby Amarantos foi de ?Ex mai love?, ?As forças da natureza? e ?Não vá embora?. Pouco depois das 22h, o britânico Calum Scott (ex-integrante do programa de calouros ?Britain?s Got Talent?) subiu ao palco para cantar ?Diamonds?, de Rihanna, e criar expectativa para Ivete Sangalo.
A baiana cantou ?A paz? para marcar o fim da Paralimpíada, mas não exatamente o fim da festa. Ivete ainda teve tempo para interpretar alguns de seus principais sucessos, como ?O farol? e ?Poeira?. A última música da festa de ontem, a última dos 44 dias em que o Rio recebeu os melhores esportistas do planeta e centenas de milhares de visitantes, foi ?Tempo de alegria?. Ivete dançou ao lado do mascote paralímpico, o Tom, enquanto bandeiras com a palavra ?amor? escrita em diversas línguas se espalhavam pelo Maracanã, naquele momento embaixo de chuva.
Se havia duas palavras perfeitas para resumir o tempo olímpico e paralímpico do Rio, certamente elas eram alegria e amor.