Talvez tenha sido a greve mais simpática. Adesão total! Um povo que não compreende o alcance dos atos praticados… Com orgulho, o “Eu apoio os caminhoneiros” era ostentado em adesivos. E agora José? O que ficou dessa greve? Caminhoneiros felizes? Nem tanto. Melhoria no transporte? Definitivamente não. População melhor atendida? Não, certeza absoluta.
Aparentemente se resolveria tudo com o tabelamento de fretes. Já se disse que para todo problema sério há uma solução simples, barata e… errada. Pois é, mais uma vez fomos por aí. Tabelamento nunca resolveu, não adianta, temos experiência histórica com isso, desde antes das “viúvas do Sarney”, lembram-se? Confisco de bois no pasto, lembram-se? Mas, o que tem tudo isso a ver com a greve dos caminhoneiros? Não foi tudo resolvido com o tabelamento? Vejamos.
Alguns exemplos da solução fácil do tabelamento de fretes: em Mato Grosso, somente um terço do adubo para a próxima safra foi entregue até agora, comparando-se com o ano passado; na Bahia, a situação não é diferente; no Paraná encontra-se comprometida 40% da distribuição de insumos, incluindo os corretivos e fertilizantes; não há espaço para o milho colhido em segunda safra, pois a soja que deveria ter sido transportada ainda ocupa os armazéns. Tudo isso a menos de dois meses do início da safra.
É bom lembrar que, tecnicamente falando, corretivos devem ser aplicados pelos menos 60 dias antes da semeadura. A venda futura de soja, um importante mecanismo de financiamento do produtor, está travada. Resultado de tudo isso? Atraso na semeadura, menor produtividade, safrinha de milho comprometida, menor área cultivada e, com certeza, uma safra mais cara. Quem vai pagar? Além do prejuízo dos produtores, os consumidores pagarão mais caro. Mais inflação, mais desemprego no campo.
O tabelamento de frete por quilômetro rodado parece razoável. Só que não. Se for estrada de terra, com barro? Se for asfalto com buracos? Se for carreta? Se for rodotrem? E o retorno como fica? O transportador ganha duas vezes? É impossível prever todas as possibilidades, é impossível tabelar.
E já lá se vão meses… E não se resolve a questão. Os preços que aumentaram nos supermercados não voltaram ao nível pré-greve, nem vão voltar. As consultorias já modificaram, para baixo, a previsão de produção agrícola na próxima safra, o Banco Central já refez, para maior, os cálculos da inflação, e para menos, a previsão de crescimento do Brasil. Certamente os agricultores têm, este ano, um acontecimento a menos para celebrar, assim como os consumidores. Tudo bem, estamos mesmo acostumados a pagar por erros e mais erros do governo. Está sendo apenas mais um. Até quando?
Ciro Rosolem é vice-presidente de Estudos do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) e professor titular da Faculdade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu)