Eu já tinha 2 filhos e fazia Pedagogia. No ano seguinte, entraria para a Faculdade de Medicina.
Incessante produção literária. Declamava suas poesias para públicos os mais variados, que o ouviam atentos e encantados por todo o mundo. Declarava que a poesia não precisa de temas sublimes e que o poeta pode escrever tanto para universidades quanto sindicatos.
Partidário da espontaneidade dirigida, dizia que o poeta deve ter uma reserva de observações formais, virtuais, palavras, sons, figuras, essas que passam como abelhas. Em seu bolso, para qualquer situação. E também uma reserva de emoções, tendo consciência delas quando se produzem. Então, frente ao papel, nos recordaremos desta consciência mais vivamente ainda que da emoção. E quantas vezes isso não acontece conosco, simples poetas?
A tarefa do escritor, segundo Neruda, numa tradução livre, tem muito em comum com os pescadores árticos. O escritor tem que encontrar o rio e, se o encontra gelado, precisa perfurar o gelo. Deve munir-se de paciência, suportar a temperatura e a crítica adversa, desafiar o ridículo, buscar a corrente profunda, lançar o anzol adequado e, depois de tantos e tantos trabalhos, tirar um pequeno peixe. Mas voltar a pescar, contra o frio, contra o gelo, contra a água, contra o crítico, até recolher cada vez uma pesca maior.
A pesca, atividade solitária e paciente, verdadeiramente contribui para a criatividade.
Um belo capítulo de seu livro “Confieso que he vivido”, dá um destino à Poesia. Não quer escrever somente para outros poetas, cada um depositando seu poema no bolso do outro e recebendo de volta outro poema. Quer poesia nas praças, em pleno sol, que os livros se desgastem e se despedacem nos dedos da multidão humana. A poesia perdeu o vínculo com o longínquo leitor e isto precisa ser recuperado. Tem que caminhar na obscuridade e encontrar-se com o coração do homem, com os olhos da mulher, com os desconhecidos das ruas, dos que, a certa hora crepuscular ou em plena noite estrelada necessitem não mais do que um só verso. Esta visita ao imprevisto vale tudo o que se andou, tudo o que se leu e aprendeu…
Eu escrevia: esporadicamente, dolentemente, a pedido, espontaneamente, e sucumbia à beleza da palavra escrita. Que tem som, ritmo, emoção, cor, perfume. Na poesia, encontrei este precioso canal a percorrer, subterrâneo, em direção aos meandros de meu ser e cujo material posso jogar, atirar para quem o quiser apanhar. Ou, sorrateiramente, deixa-lo desejar.
Em 1973, Pablo Neruda se despedia de seu Chile tão amado e do mundo.
Eu já cursava Medicina, já tinha meus filhos e o gérmen da poesia. Que agora brota sem medo e muitas influências. Meu sublime é o material palpável da vida diuturna e de como a percebo. Não quero escrever somente para os poetas.
Helena Lucia Zydan Soria – Médica Ginicologista – CRM 7488 PR.