Esportes

A Vila como ela é: Quem dá as melhores festas, quem tem quarto bagunçado, quem come mais

É um roteiro pronto para uma série de TV, dessas que misturam drama, romance, aventura, ação, suspense, comédia e super-heróis. Imagine juntar os melhores atletas do mundo ? do mundo mesmo, incluindo países que ninguém se lembrava da existência, como Djibuti, Ilhas Cook ou Lesoto ? num mesmo condomínio, comendo no mesmo restaurante, usando as mesmas áreas de lazer, enquanto vivem os dias mais intensos de suas vidas. Todos cheios de disposição, curiosidade e hormônios, é bom que se diga. Não tem como não render toda sorte de episódios curiosos. O GLOBO passou dois dias nas rebarbas da Vila ? que alcançou sua capacidade máxima ontem, com cerca de 12 mil hóspedes ? para conhecer algumas dessas histórias, conversando com camareiras, seguranças, funcionários da limpeza e voluntários. Mas principalmente com os protagonistas: os atletas. Ainda que sem revelar seus nomes, foram eles que contaram tudo o que anda dando audiência por lá.

Há flores em tudo que eu vejo

A delegação que mais comprou flores até agora na floricultura da Vila foi a da Rússia. ?Compram para decorar quartos, para presentear novos amigos, para receber chefes de estado, para aniversários dos atletas. Todo dia tem aniversário de atleta na Vila, e foi pelo sucesso que a floricultura fez na Vila Olímpica de Londres que colocaram uma aqui??, diz a vendedora Mariana Martins. As que mais saem são as flores-da-fortuna, vendidas a R$ 20.

Arrá! Urrú! Ô atleta eu vou comer seu bolo!

São tantos aniversários que o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) está em busca de uma loja de bolos para dar conta. ?Todos os dias os atletas ou funcionários das delegações perguntam poderíamos comprar um bolo lá fora para alguma festa de aniversário surpresa nos apartamentos??, conta uma das vendedoras do mercadinho da Vila, lamentando nunca ter tempo para atendê-los.

Alo, mamá! Pode hablar…

A delegação cubana está deslumbrada com a possibilidade de poder fazer chamadas de graça para seus familiares. Há um quiosque de empresa telefônica que oferece o serviço grátis, e na fila há sempre muitos cubanos. ?Eles ficam tão felizes, acham que somos nós que fornecemos a ligação. São muito amáveis e ficam horas pendurados no telefone??, diz uma das funcionárias da estação.

Tirando uma casquinha

As atletas chinesas tiram selfies sem parar. O segurança da sorveteria já percebeu que tem de ficar esperto quando elas entram, porque tiram foto com cada sorvete que compram, embolando a fila. ?As meninas dão três piruetas no ar, mas parecem que nunca viram uma casquinha?, diverte-se o funcionário.

Uzbequistão, o país fominha

Pela fila interminável na lanchonete, dá para perceber que os atletas não têm uma dieta assim tão saudável. ?Imagina juntar uma garotada de 20 e poucos anos num condomínio e distribuir hambúrguer, refrigerante e sorvete de graça? Eles vão querer comer salada??, brinca um dos seguranças da área de alimentação. ?Pelo que eles comentam, parece que não curtiram muito a comida da Vila, apesar das muitas opções. Tem um do Uzbequistão, juro, que já comeu 15 hambúrgueres num dia só, teve até gente tirando foto dele?, entrega o funcionário.

Nos embalos dos ?sul-quenianos?

Nos apartamentos, as festas dos quenianos são as mais animadas. Um deles até começou a namorar uma atleta sul-coreana numa delas. Quem diz são as camareiras: ?Você não dá nada pelos coreanos, mas são os mais animadinhos na paquera??.

Ingrid não está sozinha

Depois de levar um atleta da canoagem para o quarto, a atleta de salto ornamental Ingrid de Oliveira acabou brigando com sua parceira de dupla, Giovana Pedroso. No mesmo dia, uma atleta da Hungria levou um conterrâneo para dormir com ela, deixando chateada a companheira de quarto.

Medalha de ouro na terapia de grupo

?Todo mundo pensa que aqui é só festa, alegria?, observou o técnico d e judô Armando Jesus Padron Perez, que treina o time cubano feminino. ?Mas é só você pensar que neste mundo de gente, muito mais gente perde. Então vejo mais atletas consolando uns aos outros na Vila do que pulando de alegria. É bonito, toda hora se vê um abraçando o outro, isso também é o esporte?

Marta, craque da organização

Na delegação brasileira, o quarto mais limpo, garantem as camareiras, é o da jogadora de futebol Marta. ?Ela está sempre muito quieta, concentrada, mas é a mais organizada e limpinha. Não tem nada a ser feito no quarto dela?, conta uma das funcionárias.

Russos, os menos limpos

A delegação russa está em último lugar no ranking de arremesso de lixo na cesta dos quartos, diz uma pessoa da limpeza: ?Eu até entro no Google Translator para saber como fala ?lixeira?? e tentar ensiná-los a jogar o lixo no lugar certo. Ninguém joga, impressionante! Em búlgaro já aprendi que é ?bukuk???.

Bom atleta é o que berra

?O que mais me chama a atenção é como atleta berra, né? Berra torcendo, berra treinando, berra até sozinho no quarto. Do nada, você ta passando pelo corredor e ouve uns berros??, diz um voluntário brasileiro que está acompanhando uma delegação de polo aquático nórdica.

Triângulo das bermudas e das roupas típicas

Algumas delegações africanas desistiram de deixar seus trajes típicos, usados quando não têm obrigatoriedade de uniforme, nas lavanderias comuns dos apartamentos da Vila. Parece que somem sem nenhuma explicação ? por isso, preferem pagar para lavar na loja que faz este tipo de serviço particular à entrada da Vila, onde também muitas atletas baixinhas aproveitam para fazer bainha dos seus uniformes.

O cartão não passou

Na loja de ingressos que há dentro da Vila, o pedido mais curioso foi da delegação da Guiné Equatorial, que queria 40 ingresso para a estreia dos seus atletas. Viriam ministros do país e todos ainda estavam sem tíquetes. Depois de conseguir separar ingressos para que todos sentassem perto, o cartão de crédito não passou.

Não convidem para a mesma mesa…

Atletas da Sérvia e do Kosovo. Inimigos políticos, sequer dividem a mesma mesa de refeições: quando um chega, outro levanta.

Americanos em apês 5 estrelas

Como a delegação dos EUA costuma reformar os quartos que recebe em vilas olímpicas para adequá-las ao exigente padrão de seus atletas, são os apartamentos mais visados. ?Eles têm hidromassagem, cortina blackout e janelas antirruído??, conta uma atleta australiana, que jura nunca ter estado num deles.

O que vai nos ouvidos dos atletas

Para relaxar, os atletas camaroneses gostam de ouvir Charlotte Dipanda, estrela do país; colombianos, o grupo Calle 13; os franceses, o Stromae, principalmente o hit ?Alors on dance? para acordar.

Restaurante VIP para quem é de garfo e faca

Engana-se quem pensa que é tudo democrático na Vila, e que todos os atletas têm o mesmo tratamento. Há um restaurante VIP a que só algumas delegações têm acesso. Para entrar lá, onde grelhados são feitos na hora, é preciso ter um símbolo no crachá (um garfo e uma faca). ?Muitas delegações ainda não sabem que têm acesso, porque isto não é uma pratica simpática. Outras têm e nem ligam, como os holandeses??, diz um voluntário.