RIO – O zika pode permanecer no organismo por mais tempo do que supunham cientistas.
Casos investigados por uma rede de pesquisa no Rio mostram que o vírus é capaz
de voltar a se manifestar em pessoas que desenvolveram síndrome de
Guillain-Barré, encefalite e encefalomielite. Além disso, há sinais de que pode
causar distúrbios cognitivos, como perda de memória e dificuldades de
raciocínio, em alguns desses pacientes.
A rede estuda também casos de distúrbios neurológicos graves em pacientes com
chicungunha. Um deles é o de um homem que morreu em março após desenvolver uma
forma grave de Guillain-Barré. O coordenador da rede, o neurologista Osvaldo
Nascimento, professor titular de neurologia da Universidade Federal Fluminense
(UFF) e presidente da Associação de Neurologia do Estado do Rio de Janeiro
(ABN-RJ/Anerj), conta que o paciente foi atendido num hospital do Rio, teve
grave paralisia e acabou por não resistir.
? São casos mais raros, mas que, por sua gravidade, precisam de prioridade.
Também temos observado uma espécie de persistência do zika e casos mais graves
ligados ao chicungunha. O zika parece se esconder no sistema nervoso e reemergir
meses depois, por gatilhos que ainda desconhecemos. Uma das possibilidades que
investigamos é que ele se torne crônico em alguns casos. Como e por quê, não
sabemos ainda ? afirma.
EVENTO DISCUTIRÁ CASOS
Nascimento organiza hoje no Rio, no Instituto de
Neurologia Deolindo Couto, da UFRJ, um fórum para pesquisadores sobre os
distúrbios neurológicos associados ao zika e ao chicungunha. Alguns dos maiores
especialistas do Brasil vão debater casos de síndrome de Guillain-Barré,
encefalite e meningoencefalite, entre outros problemas neurológicos, vistos em
pacientes que contraíram os vírus. zika
A rede integrada por Nascimento reúne médicos e
cientistas da UFF, UFRJ, Fiocruz, Dasa e PUC-RS, entre outras instituições. Eles
têm acompanhado cerca de 50 pessoas com distúrbios neurológicos associados à
infecção por zika ou chicungunha. Todos os pacientes são do Grande Rio,
atendidos em hospitais das redes pública e privada.
Alguns pontos preocupam os pesquisadores. O primeiro é a persistência do
vírus zika.
? Em alguns casos, a pessoa aparentemente se recupera.
Mas a doença, a síndrome de Guillain-Barré, por exemplo, volta a se manifestar
após semanas ou meses. Uma hipótese é que o zika se mantenha latente nos
neurônios e algum fator de natureza imunológica o reative. Vírus como o do
herpes-zóster fazem isso. Não sabemos como esses vírus realmente agem. Existe
uma possibilidade de que possam causar uma espécie de doença crônica, uma
Guillain-Barré de evolução prolongada. Isso é algo que precisa ser investigado ?
explica o médico.
SINAIS DE DEMÊNCIA
Outra preocupação dos pesquisadores é o aparecimento de comprometimento
cognitivo em alguns desses pacientes.
? Temos observado casos de comprometimento da memória
recente, dificuldades de raciocínio e até sinais de demência. Mas é cedo para
saber o motivo e a evolução. Isso parece ocorrer em pequeno percentual de
pacientes com distúrbios neurológicos relacionados ao zika. Esse será um dos
destaques a serem debatidos no fórum ? observa Nascimento.