Cotidiano

STJ: direito do ex-empregado a manter condições do plano de saúde não depende de regulamentação

plano de saúdee.jpgRIO ? A manutenção do ex-empregado no plano de saúde, sob as mesmas condições observadas durante o vínculo empregatício, é um direito assegurado por lei ao trabalhador demitido sem justa causa, independentemente de regulamentação da Agência Nacional de Saúde Complementar (ANS). Esse foi o entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) que havia rejeitado a pretensão de um ex-empregado ao argumento de que esse direito só poderia ser reconhecido após a publicação da Resolução 279/2011 da ANS.

DEFESA_SAÚDE IDOSO

O caso teve início em ação declaratória de ilegalidade de cobrança de mensalidades do plano de saúde, combinada com repetição de indébito, proposta pelo ex-empregado, que, ao deixar a empresa, teve o valor de sua contribuição aumentada de R$ 2.840,46 para R$ 6.645,16. Ele pediu a declaração de ilegalidade das majorações de preço aplicadas após sua demissão, bem como a devolução em dobro do montante cobrado e pago, corrigido e acrescido de juros moratórios legais entre a data do pagamento indevido e a efetiva restituição.

O reclamante alegou que o artigo 30 da Lei 9.656/98 garante ao empregado demitido sem justa causa o direito à manutenção da condição de beneficiário, ?nas mesmas condições de cobertura do plano de saúde de que gozava quando da vigência de seu contrato de trabalho?. O TJDF, porém, entendeu que esse direito somente lhe estaria assegurado após a regulamentação do referido artigo pela ANS, instituída pela Resolução 279, publicada em novembro de 2011. O autor da ação foi demitido em maio daquele ano.

De acordo com o relator do caso no STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, o artigo 16 da Resolução 279 ?não inovou na ordem jurídica? ao estabelecer que a manutenção do ex-empregado no mesmo plano de saúde em que se encontrava observará as mesmas condições de reajuste, preço, faixa etária e fator moderador existentes durante a vigência do contrato de trabalho. Segundo o relator, tal compreensão ?já era possível de ser extraída, antes mesmo de sua edição, como decorrência da interpretação sistemática do texto legal que a antecedeu, qual seja, o artigo 30 da Lei 9.656/98, que assegurava ao ex-empregado o direito de manter-se vinculado ao plano, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava à época da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral?.

Para Bellizze, o ato normativo veio ?apenas para corroborar aquilo que já se podia depreender do espírito protetivo da lei, voltado a preservar ao trabalhador o acesso à saúde, bem como aos seus dependentes, diante de uma situação que, em decorrência da perda do emprego, acabou por torná-lo ainda mais vulnerável?.

Com relação à restituição em dobro, o ministro afirmou que a jurisprudência do STJ apenas a considera cabível ?na hipótese de ser demonstrada a má-fé do fornecedor ao cobrar do consumidor os valores indevidos, o que não se verifica nos autos?.

Advogada especializada em Direito à Saúde, Ingrid Carcales afirma que, do ponto de vista prático, a decisão não terá grande impacto, porque quem for ajuizar uma ação hoje, irá questionar a validade da RN 279/2011. No caso específico da decisão do STJ, a resolução ainda não era vigente à época do ajuizamento da ação:

? Para quem for discutir a legalidade de reajustes aplicados de forma diferente entre a carteira de empregados ativos e a de inativos, terá que impugnar, especificamente, a RN 279/2011.

A Resolução Normativa n. 279, que tratou da extensão do benefício do plano de saúde para aposentados e demitidos, criou uma regulamentação que destoa dos critérios de razoabilidade e permitiu que os empregadores dividissem a carteira de beneficiários do plano de saúde em dois contratos, um para os empregados ativos e outro para os inativos.

? Quando o empregador opta por essa mudança, o reajuste do contrato dos inativos passa a ser muito maior, pois é uma carteira de clientes composta na maior parte das vezes por pessoas idosas (aposentados). Quanto mais idoso, maior o risco de precisar mais do plano de saúde, que é reajustado de acordo com a sinistralidade (utilização do serviço pelo grupo segurado). No contrato dos inativos, há poucos jovens para equilibrar o contrato e, com isso, o reajuste acaba sendo maior ? ressalta a advogada.

Além disso, diz Ingrid, de acordo com o artigo 15 da mesma Resolução Normativa, se o empregador optar por segregar seus ex-empregados em um novo contrato, a operadora de saúde poderá apresentar uma nova tabela de valores por faixa etária e esses valores são usualmente maiores do que aqueles cobrados dos empregados ativos:

? Esse aumento não tem previsão legal e confronta a Lei 9.656/98. A RN 279/2011 representa um enorme prejuízo para os beneficiários desse serviço. E a ANS tem o poder de regulamentar o setor suplementar de saúde, mas não pode extrapolar os limites estabelecidos pela Lei n. 9.656/98, norma hierarquicamente superior e que deve prevalecer quando conflita com normas administrativas da ANS ? conclui a advogada.