Começa nos primeiros frios, quando ventos nada simpáticos nos fazem forçar a memória onde foi guardado aquele casaquinho no final do inverno passado. E não importa a cor. A proteção aos nossos filhos é assim, isento de preferência, tanto fazendo rosa ou azul. Casaco quentinho protege do vento, do frio e da chuva a pessoa mais amada do mundo. Pouca gente se dá ao trabalho de observar tudo o que está por trás do casaco de nosso filho, nossa maior conquista. Caminhe com ele e o veja tremer de frio. Doeu? Pois é. Mas seu filho tem um casaco quente, um casaco que você comprou, ganhou, não importa, ele tem. Forrado com lã, cinza, azul, amarelo, costurado tipo “gominhos” que faz seu filho parecer o logotipo da Michelan, continua sendo uma roupa quente.
Ver uma criança vestida é saber que estamos no caminho certo. E não precisa muito para aquecer um filho. Ou não precisaria, se eles não crescessem tanto. A jaqueta tipo Michelan em dois anos não serve mais. Vamos precisar de outro sapato, outra calça, outra meia. Se essa esticada anual não compromete seu orçamento, você é uma pessoa de sorte. E sorte tem quem cruza seu caminho. Ao dar o casaquinho, você veste cinco crianças ao longo de cinco anos pulverizando a solidariedade. Vestir uma criança é muito mais do que colocar um pano sobre ela. Não poderemos proteger as crianças de tudo, do empurrão do colega, das interpéries da vida, do louco que pegou a direção de um automóvel. Mas pelo menos o frio podemos dizer que ficou bem longe delas. Quem se empenha para vestir uma criança compreendeu o que é a vida, e olha que tem gente que passa uma existência inteira sem entender bem o que é viver.
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O casaco de nossos filhos pode seguir seu rumo mas nunca sairá de nossas memórias. E de nossos porta-retratos. O ato de proteger atravessa gerações, e não deixa de ser uma atitude para unir pessoas. A moda dita as regras e lá vai o casaco mudar de formato, de estilo, de cor, mas nunca de finalidade.
Um dia a responsabilidade de proteger do frio nossos grandes tesouros chega ao fim. Não será mais você quem vai escolher nem pagar o casaco de seus filhos que podem estar comprometidos até os olhos para vestir seus netos, pessoas para as quais você ainda vai comprar, ou fazer, casacos, porque proteger do frio uma criança, você sabe, é uma das atitudes mais nobres que um ser humano pode fazer. Quando esse dia chegar, talvez seus filhos se lembrem daquela peça ridícula, com cara de Michelan, e entendam o que realmente sempre esteve por trás do ato de vestir uma criança. Mais do que isso. Entendam que desde aquele primeiro inverno que você vestiu seus filhos você já era uma pessoa que sabia o sentido da vida.
