JOANESBURGO ? Depois do rinoceronte, caçado por seus chifres, e do elefante, dizimado pelo marfim, uma outra espécie bem menos exótica sofre na África por causa da demanda em países asiático: o burro. O mercado por este animal é crescente na China, e a escassez local provocada pela superexploração está transformando o continente africano em fornecedor de peles deste equino, usadas para fabricação do ?ejiao?.
Obtido por meio da fervura da pele do burro, o ?ejiao? é uma gelatina usada na medicina tradicional chinesa para prolongar a vida, melhorar a pele e o desempenho sexual. A demanda por este produto é crescente, por causa da sua popularização entre a imensa classe média chinesa. Por causa da superexploração, o animal se tornou escasso no país asiático, e comerciantes encontraram em países africanos os fornecedores ideais, pela grande disponibilidade do produto em zonas rurais e as fronteiras sem fiscalização.
? Os efeitos sobre as comunidades rurais são devastadoras ? disse em entrevista à agência EFE Ashley Ness, da ONG Highveld Horse Care Unit, que combate as matanças ilegais de equinos na África do Sul.
Essas redes de comerciantes obtém os burros pagando aos proprietários valores baixíssimos ou simplesmente roubando animais criados soltos. Uma pele de burro inteira, sem buracos ou retalhos, depois é revendida na China por cerca de US$ 530.
? Muitas vezes deixar os corpos e a carne abandonados ? contou Ashley, dizendo que o transporte para fora da África do Sul é feito normalmente por barco a partir do porto de Durban, sem nenhum controle aduaneiro.
No ano passado, países como Níger ou Burkina Faso proibiram a exportação de peles de burro para a China, depois de dezenas de milhares de animais terem sido sacrificados apenas pela sua pele. Outros governo africanos, como do Quênia e de Botsuana, optaram pela abertura de fazendas para a exportação legal das peles para o gigante asiático.
Na África do Sul, a polícia confiscou em janeiro, numa propriedade em Joanesburgo, cerca de 3,5 mil peles, a maior apreensão até o momento. A maioria das peles não possuía documentação provando a procedência ou de que o abate seguiu as regras vigentes. Ashley estima que, semanalmente, entre 1,5 mil e 3,5 mil peles saíam desta instalação durante todo o ano passado. No local foram encontrados dois chineses, que negaram serem donos da carga e estão sendo investigados.
Em outra operação, também realizada em janeiro, a polícia prendeu dois indivíduos que teriam ligação com a matança de mais de cem burros em uma fazenda na província do Cabo Setentrional. Testemunhas denunciaram que alguns animais foram mortos a golpes de martelo.
Na ação policial mais recente, as forças de segurança interceptaram no dia 20 de fevereiro um carregamento perto de Joanesburgo, com peles de burro avaliadas em cerca de US$ 160 mil.
A província do Noroeste é uma das mais afetadas, com vários proprietários denunciando terem tido seus rebanhos de burros roubados por ladrões. O governo local trabalha com autoridades chinesas para a instalação de criadouros para suprir o mercado chinês, gerando empregos formais e arrecadação de tributos.
? Nós temos informações de matanças e tráfico de burros, e por esse motivo queremos criar um mercado formal e cumprir todos os requisitos legais ? disse Patrick Leteane, representando o governo da província Noroeste, que espera que o projeto contribua para acabar com o comércio ilegal da espécie.