BRASÍLIA – Em parecer entregue ao Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, defendeu a anulação da CPI do DPVAT, o seguro obrigatório cobrado dos donos de veículos. A comissão foi criada em maio pelo ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Segundo Janot, não há um fato determinado que justifique a CPI, apenas menções vagas a irregularidades no setor.
Janot não nega que possa haver irregularidades no DPVAT, mas diz que o objetivo da CPI “é instaurar uma amplíssima investigação desvinculada de fatos efetivamente convincentes da ruína desse sistema solidário de seguro de vida”. Acrescenta que o requerimento de criação faz “menções vagas acerca de denúncias sobre a ação de quadrilhas especializadas que, utilizando-se de falsos despachantes, agiriam na cobrança de indenizações para lesão os verdadeiros beneficiários da indenização do seguro”.
Janot destaca que o requerimento para criar a CPI foi apresentado em 9 de dezembro de 2015, mas analisado por Cunha apenas em 4 de maio. Diz ainda que o requerimento de criação, de autoria da deputada Raquel Muniz (PSD-MG), cita uma matéria jornalística sobre a Operação Tempo de Despertar, da Polícia Federal, mas que isso não é suficiente para justificar uma CPI.
“As justificativas do requerimento sequer abordaram em que sentido a atuação parlamentar poderia contornar as alegadas imperfeições ou evitar que esse sistema público de seguro de vida deixasse de ser alvo de pessoas mal intencionadas”, escreveu Janot.
A ação pedindo a anulação da CPI foi apresentada no começo de junho pelo Sindicato das Empresas de Seguros Privados, de Resseguros e de Capitalização dos Estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo e pela Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados, de Capitalização e de Previdência Complementar Aberta (Fenaseg). No mandado de segurança protocolado no STF, as entidades dizem explicitamente que poderão se tornar alvo de achaque. Sobre esse ponto, Janot não endossa nem nega as acusações.
No documento, os advogados das seguradoras, Gustavo Binenbojm e Daniel Sarmento, lembram que a CPI poderia quebrar sigilos bancário, fiscal e telefônicos dos investigados, requisitar documentos comerciais e convocar testemunhas, podendo ?se converter em verdadeiros instrumentos de devassa?. E citam a possibilidade de ser alvo de pedidos de propina.
“Infelizmente, nos dias atuais não é incomum que as CPIs ? instrumentos legítimos e importantes, quando utilizados com propriedade pelo Parlamento ? se transformem em palco para todo tipo de malfeitos, perpetrados por políticos inescrupulosos, que não honram seus mandatos. Veja-se, por exemplo, o caso do ex-senador Gim Argello, investigado na denominada ?Operação Lava-Jato?, acusado de pedir e receber propina de empreiteiras para não convocar dirigentes a prestar depoimento em CPI instaurada para investigar irregularidades na Petrobras”, diz trecho da ação.
Os advogados lembram que a autora do pedido de CPI é Raquel Muniz (PSD-MG), que se nobilizou após votar pelo impeachment em nome do combate à corrupção e teve o marido, Ruy Muniz, preso no dia seguinte. As seguradoras elencam cinco situações em que Cunha teria indeferido pedidos de CPI semelhantes contra outros setores por serem genéricas, um deles no mesmo dia em que aceitou a do DPVAT.
A CPI foi criada um dia antes de o STF determinar o afastamento de Cunha do exercício do mandato e, por consequência, da presidência da Câmara. A comissão é presidida pelo deputado Marcus Vicente (PP-ES) e tem como relator Wellington Roberto (PR-PB). Em junho, Cunha defendeu a instalação da CPI, dizendo que havia fato determinado e que caberia às seguradoras denunciar achaques caso ocorressem. Em 22 de junho, o vice-presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), que comandava interinamente a Casa, em documento enviado ao STF também defendeu a existência de fato determinado.