Pouco antes de morrer, em março deste ano, o ex-diretor da Riofilme, da Cinemateca do Mam e coordenador da área de cinema do Instituto Moreira Salles, e um dos mais importantes críticos de cinema do país, José Carlos Avellar havia concluído um ensaio do qual pouca gente havia tomado conhecimento: um estudo sobre como filmes contemporâneos abordam as relações familiares.
Analisando diálogos e sequências de fitas como ?Terra estrangeira?, ?Abril despedaçado?, ?Central do Brasil?, ?Linha de Passe?, ?Eu, tu, eles?, ?Dois filhos de Francisco?, ?Bicho de sete cabeças?, ?Lavoura Arcaica?, entre outros, Avellar observa como os conflitos individuais e as relações familiares passam a protagonizar as tramas, diferentemente dos filmes lançados nos anos 1960 e 70, tornando-se referências diretas às relações entre Estado e sociedade.
Lançado pelo IMS na semana passada, em evento durante o Festival do Rio que também marcou o batismo de uma das salas do instituto com o nome do crítico, ?Pai país, mãe pátria? tem ainda duas notas preciosas de Avellar sobre o cinema documental contemporâneo, que complementam a tese do ensaio (?Talvez seja possível dizer que num filme documentário, o realizador discute o que tem de seu na pessoa que filma, compõe um autorretrato na imagem do outro?, diz, em certo trecho).
No ensaio, Avellar mostra como, apesar de ter estilos e diretores diferentes, os filmes guardam mais semelhanças entre si do que o fato de serem contemporâneos ? ?A aventura de um filme se mistura com o outro. Os pais são o cenário em que se passa a história: são o navio encalhado no meio do mar em ?Terra estrangeira?, a estação de trem da escrevedora de cartas de ?Central do Brasil?, a bolandeira de ?Abril despedaçado?, o beco entre a favela e a cidade de ?O primeiro dia???, escreve.
? Ele falava com alguns amigos sobre isso, como a Ilda Santiago. Há alguns anos preparava este ensaio, quando sua mulher, Claudia, achou o arquivo no computador com o texto pronto. Foi uma surpresa ? comenta Bárbara Rangel, que trabalhava com Avellar no IMS quando da sua morte, e que assina o posfácio da edição. ? Avellar era sempre produtivo, desde o início, quando acumulava os cargos de diagramador do ?Jornal do Brasil? e crítico de cinema, até o final. Ele escrevia até no ônibus.