Cotidiano

Crítica: Mano Brown mostra sentimento em primeiro álbum solo

1 (1).jpgRIO – O barulho da rua aos poucos se mescla ao de uma festa. ?Poesia e música, coração e mente, sinta-se bem com Boogie Naipe?, anuncia o mestre de cerimônias. E em seguida um funk, daqueles inconfundivelmente setentistas, dá a partida na viagem do primeiro álbum solo de Mano Brown, dos Racionais MC?s.

Em ?Boogie Naipe?, o rapper não abre mão nem da contundência e tampouco da crueza de seus versos: é o velho Brown de sempre, só que em embalagem r&b, num projeto de celebração da herança da black music brasileira ? em primeiro lugar ? e da americana. Um disco definido pelo artista como ?uma análise mais profunda da sua comunidade, das vidas das pessoas? (…), ?mudando o foco do coletivo para o individual, dialogando com as pessoas de uma forma mais sentimental?.

Mano Brown – Mal de Amor (feat. Lino Krizz, Ellen Oléria)Nascido de uma parceria com o cantor Lino Krizz, ?Boogie Naipe? é um disco sobre amor, sim, mas não exatamente romântico. ?Mal de amor?, um festival de falsete e de sopros black, tem um Brown quase cantor, em versos de puro desencanto: ?Pra não morrer de mal de amor/ um outro dia, um outro amor?.

O balanço escorre malandro e teclados passam zunindo por esse disco que, em certa altura, assume o seu Marvin Gaye com ?Boa noite São Paulo? ? parceria com o tecladista da Banda Black Rio, William Magalhães, em que a cidade é vista como uma mulher.

Mano Brown – Mulher Elétrica (feat. William Magalhães)Abre-se aí a galeria de personagens femininos do disco, dos quais temos ainda, com destaque, a ?Mulher Elétrica? (?ela é Capão Redondo, ela é Xerém/ ela é Black Love, ela é Soul Train?) e a de ?Foi num Baile Black?, que Brown divide com o mestre da Black Brasil Hyldon, em clima de saudade e de flash back (?o monopólio do brilho dos olhos dos homens/ o ódio das outras, é óbvio que você vê?).

Em ?Flor do gueto?, com Max de Castro, há um mea-culpa (?como eu pude te tratar assim?/ prisão perpétua pra mim?) e, em ?Louis Lane?, o papo é reto: ?Quero ser seu Superman, seja minha Louis Lane?.

Mano Brown – Dance, Dance, Dance (feat. Don Pixote, Seu Jorge)Seu Jorge dá as caras em dois momentos festeiros de ?Boogie Naipe?: na house disco ?Dance, dance, dance? (também com o novo talento do rap Don Pixote) e na romântica (mas dispensável), ?Você e eu… Só?, que recria os embalos de sábado à noite. Momentos desviantes do disco são a hipnótica ?La onda?, as místicas ?Nova Jerusalém? e ?Nave mãe? (?dizem que ela traz um tempo bom/ a luz da nova era dela vem?), e a dura ?Adicto? (?aprendi a amar, sofro desde então, mas dessa vez, não?).

Mano Brown – Felizes/Heart to Heart (feat. Leon Ware)Num disco que tem a participação de Leon Ware (parceiro de Marvin Gaye), Brown não poderia deixar de dar o braço a torcer ? e se entregar ao sentimento. ?O bicho homem é o que é/ preta, tente me ver, tente me dar, tente ajudar?, versa ele em ?Felizes/ Heart 2 Heart?, que fez com Leon. Extenso (um tanto demais), ?Boogie Naipe? acaba em clima dark, mas esperançoso, com ?Felizes?, dos versos ?pelos mais e melhores dias de nossas vidas/ eu te proponho lutar para ser feliz?. Por trás dos raps de Brown também bate um coração.

Cotação: Bom