Cotidiano

Crítica: As músicas de Lenine em olhar jazzístico

61799054_SC 26-09-2016 Lenine e Martin Fondse Orchestra no projeto The Bridge.jpg

RIO – Em determinado momento do DVD ?The Bridge ? Live at Bimhuis? (Coqueiro Verde, também em versão CD), que une Lenine e a holandesa Martin Fondse Orchestra, o compositor brasileiro diz que o grupo tem ?o pé atolado no jazz?, algo que sua música não tem. Noutro trecho, ele constata que há na orquestra ?naipes e timbragens que foram benéficos para um determinado tipo de composição que eu faço?. Nessas duas falas, Lenine sintetiza o que é o encontro: um olhar jazzístico que estranha a (e se entranha na) música de alma pop e raízes locais (samba, maracatu, baião) do compositor brasileiro. No caso, em 16 canções suas, um repertório repleto de sucessos como ?A ponte?, ?Paciência? e ?Leão do Norte? ? a 17ª, ?Maurício de Nassau bridge?, é a única feita por Fondse.

A síntese não contempla, porém, a perspectiva que talvez seja a mais interessante para se aproximar do projeto: a riqueza rítmica e a sofisticação do violão de Lenine, evidenciada no contato com a linguagem sofisticada do grupo (reconhecida como tal, por pertencer à nobreza das salas de concerto, do circuito jazz). É de seu instrumento que Fondse tira combustível para o que há de mais potente em seus arranjos, para sobrepor (em cadências inusuais no jazz) as camadas de piano, cordas, sopros, bateria e baixo. De alma cancioneira, radiofônica, o brasileiro traz a orquestra para jogar em seu terreno. Mais do que isso, leva seu violão e melodias para jogar no terreno deles ? e é aí que o DVD/CD se mostra mais luminoso.

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Há momentos específicos em que isso se afirma com mais clareza. Quando Lenine dialoga diretamente com o violino de Herman van Haaren em ?O dia em que faremos contato?. Ou quando faz o mesmo com a violoncelista Annie Tangberg em ?Relampiano?. Mas isso se espalha, de forma mais sutil, por todo o DVD/CD, como na expansão das possibilidades harmônicas que Fondse propõe tendo o violão do brasileiro como centro.

O conceito óbvio ? como nota Lenine ? de ?bridge? (ponte) se mostra legítimo e preciso em canções do pernambucano que tratam exatamente da possibilidade do encontro, como a própria ?A ponte? e ?O dia em que faremos contato?. Porque é disso que se trata ali. As versões são melhores que as originais? Quase nunca. Mas as ampliam para lugares novos. O sentido está nos versos de Lula Queiroga: ?A ponte não é para ir nem pra voltar/ A ponte é somente pra atravessar?.

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