SÃO PAULO – Críticas ao presidente turco Recep Tayyip Erdogan, até recentemente elogiado como exemplo de líder de uma democracia no Oriente Médio, marcaram a conferência internacional sobre dimensões do movimento Hizmet, que reuniu especialistas e diplomatas na USP, em São Paulo. O dirigente é acusado de forçar o Parlamento a lhe garantir superpoderes, censurar redes sociais e perseguir jornalistas e opositores.
? O que se vê é a formação de um ditador, mas com votos, porque ele foi eleito. Um grupo político que começou liberal e democrático se entregou as ambições pessoais de poder de Erdogan ? disse o embaixador brasileiro aposentado Luiz Henrique da Fonseca, que foi cônsul por quatro anos em Istambul.
Com a ressalva de que falava como embaixador aposentado, e não mais como representante do Ministério das Relações Exteriores, Fonseca lembrou que o atual presidente deixou de ser apoiado por Fethullah Gülen quando apareceram as primeiras denúncias de corrupção contra ele e foram dados passos mais consistentes no combate a jornalistas críticos ao regime.
? Erdogan vem dificultando o trabalho de empresários, escolas e universidades, de programas culturais e daqueles dispostos a contribuir para o diálogo ? disse o embaixador.
Fonseca defendeu que o Itamaraty mantenha a posição de não interferir em política interna de outros países, mas disse considerar importante que o Brasil mantenha o debate sobre a importância da liberdade de expressão e de imprensa em fóruns internacionais, onde há presença da Turquia.
Para o embaixador aposentado, apesar dos problemas, Erdogan tem prestado uma importante contribuição ao receber refugiados sírios na Turquia. Ele lembrou que o Brasil também colabora neste quadro, ao oferecer visto de turista a sírios que buscam apoio na embaixada brasileira em Istambul.
Presidente do Centro Cultural Brasil Turquia e um dos organizadores do encontro na USP, Mustafa Göktepe lamentou a deterioração da situação política na Turquia e lembrou que o país já foi, para o mundo, “estrela da região e exemplo de democracia no Oriente Médio”.
? No passado, nosso caminho se cruzava, na defesa da democracia e do direito das minorias na Turquia. Desde 2013, ocorreu uma guinada e Erdogan passou a perseguir seus críticos. Jornalistas comunistas ou lideranças liberais são tratados da mesma forma pelo governo: como traidores ? lamentou, citando o fechamento de jornais no país e a prisão de jornalistas estrangeiros.
Göktepe relativizou até mesmo o desempenho da Turquia na recepção de refugiados sírios, país vizinho com conflitos constantes. Atualmente, cerca de 2 milhões de sírios vivem no país.
? Erdogan usa muito esta carta na diplomacia internacional, já que a invasão da Europa por estes refugiados é um temor da União Europeia ? criticou.