BRASÍLIA – A equipe do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ainda tem uma série de pedras no caminho para o reequilíbrio das contas públicas. Uma delas tem que ser retirada já nas próximas semanas, quando será definido o cronograma de pagamento do abono salarial de 2016. Segundo técnicos do governo, ele precisará ser estendido para 2017 para não prejudicar o Orçamento deste ano. A outra pedra vai aparecer no meio do ano, quando será preciso encaminhar ao Congresso o Orçamento de 2017 com base numa meta fiscal que deve ser um novo déficit, desta vez, em torno de R$ 100 bilhões.
Para tentar minimizar o rombo fiscal de 2015, o ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy negociou um alongamento do cronograma de pagamento do abono salarial do ano passado. Uma parte foi paga no segundo semestre e outra ficou programada para o primeiro semestre de 2016. Com isso, uma parte do Orçamento deste ano, de R$ 9,18 bilhões, já foi usada para pagar as despesas de 2015. Por isso, se não houver uma nova extensão de prazo agora, haverá um desequilíbrio nas contas.
O problema é que há uma queda de braço no Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), a quem cabe decidir o cronograma de pagamento. Numa reunião do grupo técnico do Codefat, ocorrida no dia 18 de maio, os representantes dos trabalhadores fecharam acordo contra a proposta de alongamento e defenderam o cronograma antigo para que se pague tudo num único ano. Para ganhar a disputa, os representantes do governo no colegiado estão tentando ganhar o apoio dos empregadores. O Codefat é tripartite e paritário (formado por representantes do governo, empregadores e trabalhadores, com presidência rotativa).
Caso o governo consiga vencer a queda de braço, ele conseguirá uma economia que pode chegar a R$ 13 bilhões nas contas deste ano, segundo conselheiros do Codefat. Isso porque também entram em vigor em 2016 as alterações nas regras do abono. A principal delas é que o valor do benefício será proporcional ao tempo de serviço no ano anterior. Antes, quem tivesse trabalhado apenas um mês no ano anterior já recebia automaticamente um salário-mínimo.
Outro problema está no Orçamento de 2017, que precisa ser encaminhado ao Congresso em agosto e estar baseado na meta fiscal fixada pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017. A equipe econômica da presidente afastada Dilma Rousseff já encaminhou ao Congresso um projeto de LDO para o ano que vem prevendo um resultado primário igual a zero, mas com a possibilidade de abater desse número uma frustração de receitas e gastos com investimentos num limite, o que transformaria o resultado num déficit de R$ 65 bilhões.
Com um discurso de realismo fiscal, no entanto, a equipe de Meirelles prefere fixar uma meta única, batizada por alguns integrantes do governo de meta cowboy, ou seja, sem abatimentos. Como ainda não será possível fazer um superávit primário em 2017, ela deverá ser um déficit. Segundo o ex-ministro do Planejamento e senador Romero Jucá (PMDB-RR), a equipe econômica ainda está definindo os novos parâmetros da LDO do próximo ano, mas trabalha com um teto de R$ 100 bilhões para o rombo das contas públicas.
Não tem mágica. O cenário era de trovoadas. Agora ele será de chuvas até chegar no céu azul disse Jucá ao GLOBO.
Ao ser perguntado se estão computados neste déficit as medidas de ajuste fiscal, anunciadas recentemente pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, Jucá respondeu que este governo não vai considerar receitas sobre as quais não tem controle, como fez o anterior.
Se houver esforço, o resultado será melhor. O número teto é R$ 100 bilhões disse o senador.
Ele mencionou ainda que o governo terá tempo para fechar os números do orçamento e disse acreditar que o cenário ficará mais claro à medida em que a equipe econômica e todos os técnicos que compõem o governo começaram a trabalhar e entregar resultados.
Com um novo rombo em 2017, pela segunda vez, um Orçamento Federal será encaminhado ao Congresso já prevendo um déficit. No ano passado, a equipe econômica de Dilma também fez isso. Naquele momento Levy e o então ministro do Planejamento Nelson Barbosa não chegaram a um entendimento sobre a forma de reequilibrar o Orçamento. Barbosa defendia que não houvesse cortes adicionais de gastos para não prejudicar investimentos e gastos sociais. O Palácio do Planalto, no entanto, que havia considerado propor a recriação da CPMF naquele momento decidiu recuar e o texto foi enviado ao Legislativo prevendo um déficit de R$ 30,5 bilhões.
A decisão rendeu duras críticas ao governo. E logo depois da apresentação da proposta, a agência de Classificação de Risco Standard & Poor´s (S&P) retirou o grau de investimento do Brasil atribuindo a decisão ao orçamento deficitário.
Economistas ouvidos pelo GLOBO afirmam, no entanto, que desta vez o quadro será diferente. A nova equipe adotou o discurso do um realismo fiscal e conta com a boa vontade do mercado financeiro.
O contexto hoje é mais favorável afirma o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas.
Ele lembrou que os analistas já esperam que o número venha deficitário e que a equipe econômica já deixou claro que não há como voltar a realizar uma poupança para o pagamento de juros da dívida pública num prazo curto. Segundo o último boletim Prisma Fiscal, relativo ao mês de abril, o mercado ainda espera um déficit primário de R$ 92,080 bilhões para o governo central em 2017. No Prisma de março, o valor apontado era pior: de R$ 103,514 bilhões. O documento é feito pela Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Fazenda com base nas estimativas do mercado financeiro para o comportamento de diversos indicadores fiscais.
O economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, diz que o governo pode até contar com boa vontade do mercado, mas será preciso dar uma sinalização de como será a trajetória fiscal para frente e quando a dívida pública vai se estabilizar e voltar a cair:
O mercado gosta da equipe do Meirelles, mas se começarem a fazer as contas e os modelos mostrarem que o fiscal ruim vai apontar para um aumento da inflação, o cenário muda. A paciência do mercado é curta.