Cotidiano

Turquia amplia caça às bruxas

TOPSHOT-TURKEY-POLITICS-MILITARY-COUPANCARA – O governo do presidente Recep Tayyip Erdogan ampliou ainda mais a repressão a golpistas e opositores desde a fracassada tentativa de golpe de Estado na noite de sexta-feira para sábado. Ontem, foi anunciado que nove mil policiais foram destituídos, assim como 29 governadores provinciais, totalizando assim cerca de 20 mil servidores civis e militares presos ou afastados desde o fim de semana. E, após intensificar o expurgo contra o que chamou de ?poder paralelo? liderado pelo clérigo Fethullah Gülen ? exilado nos EUA e acusado pelo presidente de estar por trás do fracassado golpe ? o governo turco diz ter encontrado o autor direto da quartelada: o general e ex-comandante da Força Aérea Akin Öztürk, que teria confessado ter planejado a ofensiva, segundo a agência estatal Anadolu.

O jornal ?Daily Sabath?, próximo ao governo, acusa Öztürk ? general de quatro estrelas, que chefiou a Força Aérea turca entre 2013 e 2015 ? de ser ligado a Gülen. Segundo a Anadolu, ele é um dos 112 generais ou almirantes detidos, 50 em prisão preventiva. Mas as informações são ainda desencontradas. Duas redes de TV privadas informaram que Öztürk, detido no sábado e interrogado por suspeita de terrorismo e traição à pátria, negou qualquer participação na tentativa de golpe. Fotografado depois de preso, o general apresentava marcas de violência no rosto e nos braços.

? Eu não sou alguém que planejaria ou agiria diretamente numa tentativa de golpe. Eu não sei quem fez isso ? disse, segundo a NTV.

ERDOGAN VOLTA A DEFENDER PENA DE MORTE

A caça às bruxas aos envolvidos na ofensiva ? agora chamados oficialmente de ?terroristas? ? que começou atingindo militares e magistrados, incluindo juízes do Tribunal Constitucional e do Supremo, já se estendeu a outros ramos do Estado. Enquanto o Ministério do Interior exonerou até 30 governadores, o das Finanças afastou 1.500 funcionários por suspeitas de serem ligados à rede do clérigo, que vive nos EUA desde 1999. O governo também suspendeu férias de três milhões de funcionários públicos.

Erdogan, por sua vez, irritou-se com a sugestão de que estaria usando o golpe como pretexto para aumentar a repressão. Ele vem tentando mudar a Constituição para ampliar seus poderes ? que pela lei são quase cerimoniais ? e enfrenta forte oposição da imprensa independente e de partidos políticos contrários.

? É uma difamação. Se eu fosse uma figura opressiva, não teria obtido 52% dos votos nas eleições presidenciais ? rebateu o presidente turco na rede de TV CNN, afirmando ter escapado por dez a 15 minutos de ser morto na quartelada.

Ontem, a UE e Estados Unidos fizeram um apelo à Turquia e advertiram o governo contra ir longe demais na repressão. Os EUA também voltaram a afirmar que Ancara não pediu formalmente a extradição de Güllen ? Erdogan disse que o faria nos próximos dias. O secretário de Estado John Kerry ainda lembrou que o regime turco deve apresentar ?evidências, e não alegações? contra o opositor de 75 anos.

? Nós pedimos com firmeza ao governo que mantenha a calma e a estabilidade no país.

Mais cedo, especialistas do Conselho da Europa divulgaram um comunicado condenando as detenções em massa de juízes: ?Não são um meio aceitável de restaurar a democracia?, diz a nota. O governo brasileiro também manifestou ?preocupação com relatos de cerceamento de liberdades individuais de milhares de membros do Poder Judiciário?.

A repressão desencadeada por Erdogan pode ter consequências também no plano estratégico. Para Soner Cagaptay, diretor do programa de pesquisas sobre a Turquia no Washington Institute, os expurgos devem levar ao enfraquecimento das capacidades de intervenção militar do país.

Erdogan voltou a insinuar que pode endurecer as punições a culpados com a reintrodução da pena de morte, suspensa em 2004. Em entrevista à CNN, afirmou que caberá ao Parlamento decidir.

? Como presidente aprovarei qualquer decisão que sair do Parlamento ? afirmou o presidente.