Cotidiano

Sjoerd ter Borg, pesquisador artístico: 'A arquitetura esqueceu o lado social e sobrevalorizou a estética'

201607221729220174.jpg “Tenho 29 anos. Sou formado em Ciência Política pela Universidade de Amsterdã, mas decidi fazer mestrado de Arquitetura de Interiores no Instituto Sandberg , mais voltado para a arte. Tive meu trabalho exposto no Museu Stedelijk e fiz residência em documentário no verão de Nova York. Gosto de misturar. Aliás, não penso muito sobre o que é arte. Pesquiso cidades, gentrificação, arquitetura. É preciso e difícil convencer as pessoas de que pensar artisticamente é socialmente importante.”

Conte algo que não sei.

A arquitetura esqueceu o lado político-social e sobrevalorizou a estética. É como se tivéssemos criado um sistema em que mostramos lindas apresentações de projetos no computador e as pessoas escolhem pela imagem, não pela função. É crítico que poucos arquitetos estejam conectados com os problemas da sociedade. Isso tem mudado um pouco, por profissionais que consideram o desenvolvimento social importante, de forma a mostrar novas maneiras de pensar.

Como exatamente?

Um dos projetos que eu e o arquiteto Pedro Varella (parceiro de Borg no Hobra) idealizamos vai contar a história do Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes, conhecido como Pedregulho. É uma habitação social, o que não se vê tanto mais. Vai ajudar a pensar o papel da arquitetura na vida em igualdade. Arquitetura significa prover moradia, trabalho ou lazer. Normalmente, é muito sobre construções sofisticadas que, por vezes, apresentam problemas ao sair da tela do computador. Custam muito e não servirão daqui a 30 anos.

Algumas ficam até vazias…

Na Holanda, há organizações que gerem construções desocupadas, e dizem não poder fazer nada com elas. Convidei escritores para elaborarem histórias ficcionais que pensassem no redesenvolvimento de um certo prédio. Foi importante registrar o quanto é possível fazer.

Isso vale para o Brasil também, imagino.

Havia uma espécie de armazém vazio na Zona Portuária do Rio. Nas últimas décadas, foi construída ali a comunidade Nova Equador, que traz um espaço público, como uma praça, envolto por casas, sem que houvesse qualquer planejamento ou atuação do Estado. Criaram ali uma forma interessante de viver junto. Podemos aprender muito com a arquitetura informal do Rio, que envolve as ruas, as favelas. Ao mesmo tempo, perto dali, o conjunto de apartamentos luxuosos Porto Vida, ainda por construir, está parado. A pergunta é o que acontece com esse tipo de prédio quando não é mais usado.

Em que a sua arte no Brasil difere da dos outros países em que trabalhou?

Em Nova York, a arte esbarra na economia. O artista é um empreendedor, que precisa conectar a história que quer contar à pessoa certa, à rede de contatos certa. Isso tem acontecido, um pouco menos, na Holanda. No Brasil, o que percebo é uma arte sincera, de pessoas interessadas em diferentes disciplinas. É interessante observar se haverá mais dessa mistura no futuro.

Essa mistura quebra a supervalorizada especialização?

Especialistas são muito importantes. Mas é possível variar as disciplinas e trabalhar com um especialista. Pensar conceitos e levar ao parceiro para conectar as ideias. Trata-se de sustentar um ideário.

A ciência fez as pazes de vez com a arte?

A ciência pode muito bem ser aplicada à arte, para inspirar e propor diferentes conexões. Claro, a arte não pode diminuir a ciência ou torná-la basicamente estética. Mas é um mundo a se explorar, que permite criar uma terceira ideia ou estrutura.

Qual a importância de o espectador entender o que o artista quis dizer?

É importante, para mim, que o espectador ao menos compreenda a direção do que a peça artística quer dizer. Mas ele vai ter as próprias associações ao experimentá-la. É importante que não seja mero receptor. No projeto do Pedregulho, ouvimos vários moradores, afinal, eram os especialistas ali.