Cotidiano

Respeitar os idosos? Depende....

Na década de 70, Tio Inácio ganhou muito dinheiro com a construção civil. Comprava um terreno, construía e depois vendia para comprar outro e depois mais outro. Boa parte do que adquiriu, tio Inácio acabou perdendo em um grande empreendimento que não decolou, mas mesmo assim sobrou o suficiente para lhe garantir um bom padrão de vida.

Aos 70 anos, tio Inácio decidiu morar na praia. A pescaria pela manhã,, as caminhadas à beira mar e os jantares com os amigos estariam de bom tamanho para coroar  a velhice de meu tio. Ele , porém, só faz reclamar. Ainda mais essa época do ano. No mês de outubro tem inicio o seu martírio, quando aquela gurizada começa a invadir o litoral em busca das primeiras ondas, o que deixa tio Inácio furioso, uma vez que uma bengalinha desenhada no chão não vai impedir a juventude de estacionar bem perto da praia, esta cada vez menor e com precária estrutura para receber tantos veranistas. A ira de meu tio já o fez apertar o braço de uma moça, na fila de uma lavanderia, até ele ficar roxo, resultado da educação que seus pais esqueceram de lhe dar, diz meu tio, mas foi na delegacia que a moça deu sua versão. De acordo com ela, tio Inácio entrou no estabelecimento querendo a prioridade do idoso, o que fez empurrando meio mundo. A moça fincou o pé: “isso aqui não é fila de banco, tio”.

Pra quê…

Uma pessoa não conhece tio Inácio, pode até ficar revoltada  lhe dar  toda  a razão. Para quem o conhece, e isto inclui seus parentes, tio Inácio deveria ficar quieto, bem quietinho, e parar de exigir, a plenos pulmões, respeito à terceira idade. Em sua aura juventude, não importava quantos filhos a pessoa tivesse ou sua vontade de trabalhar, tio Inácio não aceitava pessoas com mais de 50 anos em suas obras, gente que, segundo ele, vivia com dor e era devagar, “um atraso na minha vida”, dizia ele, no auge de seus 38 anos, se referindo até mesmo ao seu pai. A velhice pode revestir um homem e deixá-lo com cara de papai noel; a essência, contudo, permanece intacta, e a soberba de meu tio só o impede de ser ainda mais grosseiro porque não dispõe de forças nem de empresa para prosseguir com seu ponto de vista e sua irresponsável maneira de tratar as pessoas.

Não fosse casado com minha tia, Tio Inácio é daqueles indivíduos que jamais faria parte de meu grupo de relações. Arrogante e nem sempre honesto, sua casa frequento em função de meus primos, pessoas que vale a pena conviver. Escutar os comentários dele às vezes dá vontade de parar tudo, chutar o balde, colocar o dedo na frente do nariz de meu tio e dizer o que ele esperava depois de distratar tanto o ser humano idoso. Mas aí vejo que é com tio Inácio que estou tratando e me dou conta de que não adianta mais falar…

Vivian Weiand