Cotidiano

Relator vota pela admissibilidade de processo contra Bolsonaro por apologia à tortura

BRASÍLIA – O deputado Odorico Monteiro (PROS-CE), relator do processo contra Jair Bolsonaro (PSC-RJ) no Conselho de Ética da Câmara, votou, nesta terça-feira, pela admissibilidade do processo contra o deputado pela prática de abuso de prerrogativa parlamentar, por crime de apologia à tortura, o que pode, em última instância, cassar o mandato de Bolsonaro. O deputado Sandro Alex (PSD-PR) pediu vista, o que adiou a votação do parecer do relator.

No dia 17 de abril, ao tomar o microfone para votar a favor do impeachment da agora ex-presidente Dilma Rousseff, o parlamentar elogiou o torturador Carlos Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-Codi de São Paulo entre 1970 e 1974 e responsável por dezenas de mortes, torturas e desaparecimentos durante o regime militar, e disse que ele era “o pavor de Dilma Rousseff”.

A representação foi apresentada pelo Partido Verde, e aberta pelo Conselho no fim de junho.

Para o relator, são “robustos” os indícios de que houve quebra de decoro e apologia à tortura por parte de Bolsonaro ao homenagerar Ustra. Ele afirma que, em vez de o deputado, ao proferir o seu voto, ter falado de pedaladas fiscais ou decretos orçamentários, os objetos do impeachment, ele homenagou o torturador sem exaltar supostos “predicados positivos” do coronel, e sim dizendo que ele é “o pavor” não só de Dilma Rousseff, mas de diversas outras pessoas torturadas por ele durante a ditadura militar.

? Em vez de tratar de pedaladas fiscais ou de decretos orçamentários, retomou o ano de 1964 e, ao homenagear o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, não o ligou a predicados positivos, mas o vinculou ao epíteto de ‘pavor de Dilma Rousseff’ ? disse Monteiro:

? A manifestação parlamentar não se prestou para fundamentar o voto pela admissibilidade do impeachment, mas para enaltecer uma pessoa que teria causado ‘pavor’, convenhamos, não apenas à presidente, mas, supostamente, a outras pessoas, de diversas orientações políticas, como se percebeu da vultosa reação social ? afirmou, em seu voto.

Para o relator, há materialidade política na representação apresentada pelo PV contra Bolsonaro. Odorico Monteiro afirma ainda que esse caso é uma oportunidade “preciosa” para que se faça um debate sobre até onde vai o limite ético do discurso parlamentar, para que os deputados não trabalhem num ambiente de “vale-tudo”:

? Será, realmente, que é possível se dizer qualquer coisa quando se sobe à tribuna? ? ponderou o relator.

Ele ressaltou que todos os deputados têm direito de discursar com independência, mas que não podem usar esse poder para fazer discursos com o objetivo de “suprimir direitos e garantias fundamentais”:

? Todavia, tal garantia não poderia se prestar, segundo se depreende da representação, para veicular discursos tendentes a suprimir direitos e garantias fundamentais, mediante a apologia ao crime de tortura.

Jair Bolsonaro foi notificado pelo Conselho de Ética, mas não compareceu e nem mandou um representante para defendê-lo na reunião desta terça-feira. Caso o processo seja aberto por quebra de decoro parlamentar, será investigado se houve abuso de prerrogativa parlamentar e apologia à tortura