Cotidiano

“Quem estuda domina, quem não estuda é dominado”

A pandemia provocou uma transformação nos escritórios do mundo inteiro, forçando ao home office, ao distanciamento entre colegas de trabalho e alterando as rotinas de trabalho

“Quem estuda domina, quem não estuda é dominado”

A pandemia provocou uma transformação nos escritórios do mundo inteiro, forçando ao home office, ao distanciamento entre colegas de trabalho e alterando as rotinas de trabalho. Para o coach e criador da ®Bioliderança, Juliano Gazola, esse novo conceito veio para ficar, mas muitos ainda resistem às mudanças, perdendo a oportunidade para crescer, e não só financeiramente. “É no meio do caos que desenvolvemos novas habilidades, novos conceitos, novas crenças”.

Gazola, que é também colaborador do Jornal O Paraná, recebeu a reportagem para um bate-papo sobre essa nova dinâmica nas relações de trabalho e destacou dois grandes conceitos com os quais trabalha: a maturidade e o conhecimento: “Quem estuda domina, quem não estuda é dominado”, resume.

 

 

O Paraná – Ano passado, houve uma mudança muito significativa dentro das empresas que precisaram se adaptar ao home office. Você acha que era algo que aconteceria no futuro ou houve alguns atropelos?

Juliano Gazola – Percebo que as grandes empresas, corporações líderes de mercado, na maioria dos casos, vão continuar prosperando com home office porque têm mais estrutura, dinheiro, condições de investimento, algumas até fizeram investimentos nas casas dos funcionários.

As empresas pequenas e médias estão, sim, sofrendo e tendo dificuldades de adaptação, porque o home office não é apenas colocar o funcionário trabalhar em casa. É preciso estrutura, tecnologia e segurança da informação, condição de trabalho. Numa empresa você prepara todo o ambiente e tem estrutura necessária e numa casa exige uma adaptação. Quais empresas possuem condições de adaptar da mesma forma do local de trabalho original para a residência?

As pequenas empresas vão continuar tendo dificuldades porque requer paciência do gestor, que até então tinha uma sala cheia de funcionários e agora tem menos. Antes você tinha meios visuais de saber se o funcionário estava trabalhando e agora você tem que confiar. Tem uma rotina diferente, uma organização digital, coisas que os gestores nascidos nas décadas de 1950, 1960 não estão acostumados.

 

O Paraná – Com relação à essa confiança, esse controle não depende só do gestor, mas também do funcionário. Um dos conceitos que você sempre destaca é o nível de maturidade. Eles estão atentos a isso?

Gazola – A maturidade é um dos pilares da Bioliderança, que eu desenvolvo há algum tempo, e que, a meu ver, resume tudo. Por mais que tenha 30, 40 anos, mas estou na camada de maturidade da adolescência, que é a fase da rebeldia, “trabalho quando eu quero”, “faço se alguém me cobrar”…

Tem muito gestor dono da empresa imaturo, aquele paizão, que precisa ter todo o mundo próximo para mandar, comandar, observar… é preciso ter maturidade para entender o novo modelo de gestão.

A maturidade hoje se faz obrigatória e precisa de uma série de fatores para acontecer: obviamente a cronologia é um deles, ou seja, o tempo precisa passar, as experiências precisam acontecer, mas tenho outros dois muito importantes, que é a literatura e a modelagem, ou seja, estudar, procurar literaturas para aperfeiçoar o meu eu, e também a modelagem, ou seja, quais as pessoas maduras no meu meio social ou de trabalho que eu conheço? E se eu tenho um escritório com 10 ou 15 pessoas e nenhum desses tem o processo de maturidade elevado? Terei um home office com nível de confiança muito baixo e, quando isso acontece da parte do gestor para os funcionários, ele pode prejudicar seu intelecto, se sentir desvalorizado e começam todos os problemas biológicos que vão acarretar em queda e desemprego.

 

O Paraná – A gente só amadurece quando se dá conta e esse não é um processo que acontece de um dia para o outro. Nem todo o mundo tem essa percepção de que é preciso ter maturidade…

Gazola – Dentro das experiências, que é um dos caminhos para a maturidade, existe o caos, que na vida do ser humano é libertador, só que nem todo o mundo enxerga assim. É no meio do caos que desenvolvemos novas habilidades, novos conceitos, novas crenças. Para algumas pessoas, trabalhar de casa com filho chorando, cachorro latindo é o caos.

Então, fomentar esse desenvolvimento faz parte de uma nova habilidade do gestor, identificando o nível de maturidade de cada um e desenvolvendo de acordo com a necessidade. Identificar para ajudar.

 

O Paraná – Temos a cultura de “bater cartão”. Muda esse conceito de horário de trabalho para a entrega de resultado?

Gazola – Muda muito. Preciso de uma habilidade chamada confiança e, para isso, preciso de um nível de consciência de minhas entregas. Pergunto sempre para os meus clientes, por que somos contratados? São dois motivos essenciais: dar resultado e resolver problema. Essa mudança cultural de horários de 8h05, 8h10 é necessária no Brasil porque fomos criados para estudar, procurar emprego, casar, ter filhos e morrer. Precisamos urgentemente da ideia de dar resultado, entregar o meu melhor no trabalho, 110% de resultado, senão ficamos na cultura de sempre alguém nutrir a mim. Das 12 [camadas de amadurecimento], a sétima camada mais evoluída é quando consigo entregar meus resultados. O horário pouco importa, preciso entregar.

 

O Paraná – Você sempre pergunta “que livro você leu em 2020, o que você aprendeu em 2020”. As pessoas têm essa consciência?

Gazola – É cultural: o brasileiro vai mais ao açougue comprar carne para churrasco do que a livrarias. É só parar para analisar a cidade que a gente vive: quantas livrarias existem e quantas farmácias têm? Atendo executivos com mais de R$ 200 mil por ano de salário e que o último livro que leu completamente faz cinco ou dez anos.

 

O Paraná – Existem empresários que pensam que “já sabem” de tudo e funcionários que não têm disposição para a leitura. Isso tem a ver com a falta de maturidade ou é cultural?

Gazola – Vejo como cultural e depois falta de maturidade. Não é cultural no meu negócio transformar meus funcionários em leitores, porque, quanto mais eles lerem, corro o risco de no próximo dia eles não estarem mais aqui, de se libertarem, empreenderem, buscarem sua própria vida ou aquela frase famosa: cuidarem da própria vida.

Estamos acostumados que as pessoas cuidem da nossa vida, um pai, uma mãe, um marido que vira pai, uma esposa que vira mãe… “Vou ficar aqui porque as pessoas cuidam de mim”.

Mas, quanto mais eu leio, mais eu me liberto, quanto mais eu leio, mais eu domino e não sou dominado e, quanto menos eu leio, mais dominado serei, no sentido de “fique aqui até morrer”. É lógico que não estou aqui incentivando as pessoas a pedirem as contas e saírem dos seus trabalhos, mas existe um ciclo.

As empresas já estão se dando conta de que, por mais que corram o risco de o funcionário sair, ter funcionário com o nível de cultura elevado faz bem, porque tem as melhores margens, consegue vender melhor, fidelizar melhor o cliente e, com isso, o gráfico é automático: a margem da empresa aumenta quando fideliza mais.

 

O Paraná – Cabe ao gestor tomar essa iniciativa?

Gazola – Não. Ele pode ser um estopim, um propulsor, mas seria ótimo se a responsabilidade fosse automática, autorresponsável. Falo sempre aos meus clientes e para as pessoas que convivem comigo: se eu entrar em uma empresa hoje e permanecer igual ao cachorrinho que fica na porta da panificadora esperando ganhar algo, ficar esperando que a empresa planeje minha carreira, estarei fadado ao marasmo, a ser excluído e a gente sabe que, ao me sentir excluído, existe uma série de doenças que podem acontecer comigo. Posso, por que não, apresentar para o meu gestor o meu plano de carreira? Obviamente entrar em contato com o RH sobre como funciona a remuneração, as promoções, se existe planos de cargos e salários…

Brinco com os meus clientes perguntando “qual é o tamanho do teu teto?”. É um teto baixo, comum, com bom salário, uma casa, ou você tem um teto alto, onde deseja mais? Não pela ambição e sim pelo propósito de prosperar e trazer pessoas com você, porque aquele que prospera sozinho terá dificuldades de convivência com a humanidade. Preciso prosperar com todo o mundo.

Como seria se você fosse minha funcionária, está aqui há um ano e me procurasse para apresentar um plano de carreira? Olha que maravilha! Como gestor, nunca vou me acomodar porque terei a todo momento um funcionário novo me apresentando um projeto de carreira e, se eu não ajudar essas pessoas a desenvolver essa carreira, não sou gestor.

 

O Paraná – De maneira geral, as pessoas conseguiram evoluir ou não veem a hora de voltar ao que era antes?

Gazola – Pessoas que permaneceram inconscientes continuam sofrendo. Inconsciência é obter acesso a informações que vão te manter no medo, não só com relação à doença, mas na questão da necessidade de acreditar e não pesquisar os fatos. Um exemplo são as redes sociais. Veja seu Instagram. Se você segue mil pessoas, quantas são para te ensinar algo? Faz uns dois ou três anos que sigo apenas quem vai me ensinar alguma coisa dentro da minha necessidade. Se você está no automático, esperando que algo mude, você terá dificuldade em lidar com o retorno. Você está ansioso por uma vacina para voltar à sua vida, mas a sua vida está aqui, você continua a viver.

Quantos livros você leu, quantas pessoas você conheceu virtualmente, quantos contatos você excluiu [em 2020]? Tem uma passagem bíblica que diz que, se você olhar para trás, você vai ver a pedra. Para quantas pessoas que te puxam para trás você está olhando?

 

O Paraná – Tem um comentário seu muito interessante: “Quantas pessoas você influenciou”, ou então, “você compartilhou algo positivo com aquela pessoa”…

Gazola – Sou leonino, gosto de ter o meu cantinho, a minha savana africana onde eu possa conquistar meu território. Mas 2020, em especial, mostrou que a comunidade tem muita força.

Atendi um empresário que tem clínicas da área de pet que disse “Você, agora, às 21h, foi a pessoa com quem conversei no dia que mais me ensinou”. Se passa uma semana toda e você não aprendeu nada novo, significa que está no modelo automático, naquela ciranda do medo. E o pior: não ensinou ninguém?!

A gente pode escolher. As escolhas que não fiz em 2020, decido fazer em 2021. As escolhas que te desafiam, que doem, são as melhores. É somente atrás do teu pior medo que está a vitória. Vocês vão continuar como em 2020, com as mesmas paredes, os mesmos medos, as mesmas pessoas que te puxam para trás?

Muitos ensinamentos bíblicos mostram que Deus fez a gente no sexto dia, mas por que não no primeiro? Porque ele deixou tudo pronto e falou “dominem céus e terra”. O que é isso? Dominar é ter comando da nossa própria vida.

 

O Paraná – Seja empregado ou empregador, qual movimento ele pode fazer para identificar a maturidade?

Gazola – Temos 12 camadas de maturidade, algumas bem visíveis. Pessoas que querem mostrar o poder toda hora são pessoas de quinta camada. Quem mostra toda hora se está feliz ou infeliz, quarta camada. Violentas que conquistam resultados através do grito, são pessoas da terceira camada. Por exemplo, duas crianças brincando e uma pega o brinquedo da outra, bate, morde… existem pessoas assim em empresas.

O primeiro passo como gestor é saber e identificar através de clusters ou quadrantes na equipe e apresentar para eles terem autoconsciência. Apenas Deus alcançou a 12ª camada. Pensar como Deus pensaria, agir como Deus agiria… Gandhi atingiu a 11ª camada, Sócrates, Platão atingiram camadas superiores. Eu não preciso ter esse nível na minha empresa, mas a pessoa precisa ter um sujeito maduro na equipe.

 

O Paraná – Qual seria o nível mínimo de camada satisfatória?

Gazola – Oitava camada. E ela é interessante porque é quando o sujeito consegue olhar para trás, ver a própria vida e responder a pergunta: “O que fiz da minha vida?” com nível de autoconsciência tão grande que não consegue colocar a culpa em ninguém. Ver todos os erros da vida, se responsabilizar, não culpar ninguém e ao mesmo tempo o sujeito maduro vê que resolveu todos os problemas da vida.

 

O Paraná – Você consegue atingir uma camada pulando outra?

Gazola – Vamos supor que passei pela terceira camada, depois mostro a quarta camada que é o poder pessoal, de provar que posso (adolescente) e vai evoluindo. Estou numa sétima camada, do propósito, do trabalho, mas ainda tenho assuntos para resolver com os meus pais. Tenho que resolver as diferenças com pessoas que não gostam de mim, entregar o meu melhor para as pessoas que decepcionei para então ter o nível de maturidade elevado e isso a gente atinge acima dos 50 ou 60 anos, mas pode ser antecipado com literatura, com experiências, com caos e com modelagem…

 

O Paraná – E com disposição?

Gazola – Obvio. Quando o caos bate, algumas pessoas têm disposição para enfrentar e outras se escondem, que é de onde vêm as depressões oriundas da infância. A depressão tem três origens: sistêmica (parentes que estou honrando), gestação (como a mãe nutriu a minha gestação) e pessoal (eu mesmo, com o meu crescimento no seio familiar desenvolvi a depressão). Preciso identificar esses caminhos.

Na experiência, o caos é libertador. A pandemia, para muitos, foi o caos porque perdeu emprego, pessoas. O primeiro órgão que vai ser afetado quando eu me isolar são os rins. “Eu me senti abandonado, vou reter líquido para ter mais energia para sobreviver”. Uma doença só existe porque existem fatores como o forte impacto emocional. Meu cérebro vai receber isso como médio, grave ou leve e destinar qual órgão específico vai ser acometido pela doença.

Me isolar, ter medo de morrer, como aconteceu com a covid-19, tenho rins e pulmões afetados. É preciso ter calma, mas a calma só vem com a maturidade. Tem uma frase que falo sempre para meus clientes e eles se magoam muito comigo “Você tem a vida que merece”.

 

O Paraná – Independente de ser funcionário ou gestor, a desordem em casa se reflete na empresa?

Gazola – Totalmente! A empresa que aplica o mesmo treinamento durante anos tem um problema sistêmico. Efeito espiral. Tenho um gestor de 47 anos que não consegue trabalhar com mulheres porque comandou sempre homens. Ele muda de empresa e lá 90% dos funcionários são mulheres e ele vai substituindo. Consegue prosperar porque mudou o time, mas um dia a diretoria resolve tirar o gestor dele, que era homem, e colocar uma mulher. Qual o enfrentamento? Saber lidar com a nova chefe ou olhar para trás e perceber que passou a vida toda renegando a própria mãe porque tratava a avó como mãe? Ele precisa pedir desculpas para ela [mãe], agradecer pela decisão dela de tê-lo deixado nascer. Se eu tiver problemas sistêmicos, eu terei problemas com gestor.

 

O Paraná – Como o gestor vai identificar os problemas num primeiro momento? Investiga?

Gazola – O primeiro sinal é comportamental. Se o funcionário te questiona, não quer cumprir ordens, existem indícios. Se você perguntar a ele como é a relação dele com o pai, e a resposta for “mais ou menos”, ou você perguntar três lembranças boas com o pai e ele cita coisas da infância e não fala da vida adulta…

Você fala de investigar. Por que não? No meu conteúdo de Bioliderança, eu ensino o gestor a investigar. As empresas não têm as fichas dos funcionários? Lá constam prêmios, advertências… por que não podemos ter mais informações? Tem funcionários que estão há dez anos na empresa e você só sabe que ele tem pai, mãe filho e cachorro, às vezes nem isso.

 

O Paraná – E em qual momento o gestor ou a empresa deve buscar ajuda?

Gazola – Existe um erro bastante comum não só no Brasil, mas nos países em desenvolvimento. Busca-se ajuda quando as coisas já estão tenebrosas, perto do fim. Mas empresas que vêm prosperando há mais de dez anos também viveram situações de caos. O melhor momento para procurar um coach é quando está tudo bem.

Veja bem. A melhor forma de mudar de comportamento é viver o caos, mas você pode antever o caos conscientemente. Você se pergunta: “como seria se perdesse o emprego amanhã?” A pessoa imagina o caos. E, através dessas possibilidades, você constrói essas mudanças, lembrando que, quanto maior o nível de consciência, mais eu posso projetar o caos e, quanto menor a consciência do que eu sou e da vida que eu tenho, mais dificuldades terei ao passar pelo caos.

 

O Paraná – Como a pessoa desperta e busca ajuda?

Gazola – Algumas quando recebem um feedback não muito bom. Tem outras que percebem oportunidades e por isso precisam melhorar. Estão em uma camada de maturidade que diz que precisam de mais, então elas vêm pelo caos, por oportunidades de promoções e outras vezes porque querem um aperfeiçoamento.

 

O Paraná – As pessoas conseguem se desenvolver sozinhas ou precisam sempre de orientação?

Gazola – Tenho dois mentores: a Bíblia e o Papai do Céu, mas tenho também uma pessoa que vejo a cada seis meses, que já ganhou prêmio Jabuti de literatura, que tem uma biblioteca com mais de 3 mil livros lidos. As pessoas precisam de mentores, precisam de ajuda, precisam ser orientadas, mas não a vida toda para o mesmo assunto, porque aí vira uma carência não resolvida.

 

O Paraná – Todo o mundo tem conflitos, a questão é resolvê-los?

Gazola – Nossa vida é um canteiro de obras em construção, em completo desenvolvimento, mudando que não está bom. Quem estuda domina, quem não estuda é dominado.

Você adoece porque a pessoa do lado adoeceu, porque a mãe está sofrendo… Isso dói e, na Bioliderança, na Reprogramação Biológica ou na Medicina Germânica, 95% das dores vêm na fase de cura, mas quando fico cinco meses com dor estou na fase crônica, estou relendo conflito.

2021 é o ano da força, servir as pessoas e não encher o saco, cuidar da própria vida. Ano em que decidi trazer pessoas comigo. Transbordar mais gente, saber do conteúdo, saber que a maturidade faz bem, faz ser forte, saber enfrentar o caos, se manter de pé, não adoecer ou, se estou com a dor, já consigo identificar o que é.

Como é para você olhar para o funcionário com problema na cervical 1? Essa é uma vértebra ligada à hierarquia, e se você estiver provocando isso? É mais fácil mandar embora ou entender o que está acontecendo? Será que, se resolver isso, o funcionário não vai ser mais grato, comprometido, engajado?

Fotos: Silmara Santos