Cotidiano

Produtores estão vendendo rebanho para pagar dívidas

Marechal Cândido Rondon – A região oeste do Paraná detém o título de maior bacia leiteira do Estado, chegando a produzir 1 bilhão de litros de leite por ano. Mas a atividade que sofre com a falta de uma política de incentivos e de preço mínimo que deveriam ser definidos pelo governo federal, passa por uma das piores crises da sua história.

Isso sem contar o elevado custo de produção, que tem obrigado muitos pecuaristas da região a vender as cabeças de gado para honrar as dívidas contraídas com as instituições financeiras.

Para agravar ainda mais a situação, os produtores de leite brasileiros sofreram com os reflexos negativos provocados pela concorrência desleal com o leite vindo do Uruguai.

Como último recurso na tentativa de proporcionar um fôlego para a atividade, as frentes parlamentares da agricultura familiar e da Bovinocultura de Leite da Câmara Federal recorreram ao Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) esta semana para suplicar a extensão do prazo para renegociação dos contratos de custeio e investimento estabelecidos pelos produtores de leite nas instituições financeiras e cooperativas de crédito.

O presidente da Associação Leite Oeste, sediada em Marechal Cândido Rondon, Rodrigo Bellé, relata que, diante dessa fusão de fatores negativos, a queda na produção de leite na região ano que vem deverá chegar a 15%. “Muita gente tem desistido da atividade por não suportar mais o elevado custo de produção e por não conseguir dar conta das parcelas de financiamento dos investimentos feitos no setor”, revela Bellé.

Na semana passada ocorreu o encontro anual da entidade, que costumeiramente reunia perto de 600 produtores. “Este ano, para se ter uma ideia do cenário negativo, participaram pouco mais de 300 produtores”, relata. Ele acredita que 30% do pessoal que antes fazia parte da associação já abandonou a atividade.

Segundo o líder pecuarista, essa é a maior crise dos últimos 20 anos na região. Hoje quem insiste na atividade são apenas os grandes produtores. “Os pequenos estão procurando outras atividades de manejo no campo. A inadimplência é muito grande”, segundo Bellé.

Diante desse cenário nada favorável, as frentes parlamentares reivindicaram também apoio para a ampliação dos termos de renegociação para que as parcelas a vencer no próximo ano também sejam atendidas e por fim, a retomada das discussões de um antigo anseio dos produtores de leite, que é a definição de uma política do preço mínimo.

Entressafra agrava crise

A situação na pecuária leiteira é ainda pior neste período, por conta da entressafra e das altas temperaturas que acabam influenciando tanto na demanda quanto na produção do rebanho leiteiro, elevando ainda mais os custos.

O cenário é ainda mais desanimador por conta de uma sucessão de fatores envolvendo o atraso no plantio do milho safrinha, a quebra provocada pelas intempéries climáticas, que vai aumentar o custo da alimentação do gado, levando muitos produtores a ventilar a hipótese de abandonar a atividade. Diante disso, as perspectivas de mercado para o início do próximo ano não são as melhores.

De acordo com o consultor da área de leite, representante do setor rural da Conseleite-Paraná, José Manoel Mendonça, ao longo deste ano o preço pago ao produtor pelo litro do leite permaneceu em patamares baixos, com o custo de produção não cobrindo o preço pago no campo. “Quem fez investimentos para pagar no futuro está com dificuldades”, admitiu ele, que confirma a existência de vários produtores do Paraná com grandes dificuldades para honrar as parcelas dos investimentos feitos no segmento. “Tudo por conta de uma oferta maior do que o normal, fazendo com que o mercado se comportasse muito mal por parte da demanda”.

Exportação de lácteos deve elevar a produção, diz EUA

Se na região oeste do Paraná a produção de leite deve sofrer uma dura queda, no Brasil os especialistas acreditam em uma reação de 1,8% em 2018, chegando a 23,98 milhões de toneladas ante as 23,55 milhões de toneladas esperadas para o total de 2017, segundo estima o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos. A elevação da produção tende a ser impulsionada pelas exportações de lácteos, como o leite condensado, principalmente para o mercado africano, e o leite em pó.

Outro fator que influencia neste aumento é a suspensão das importações de produtos lácteos do Uruguai. O Usda – departamento norte-americano de agricultura – destaca que, em 10 de outubro, o Ministério da Agricultura brasileiro suspendeu as compras do país vizinho e solicitou comprovante de rastreabilidade, para verificar se 100% do produto vindo do Uruguai era, de fato, daquele país, diante da suspeita de que o produto estava sendo adquirido pelo Uruguai da Austrália e o revendia para o Brasil. A maior produção doméstica do setor e a demanda mais amena resultaram em importações limitadas de leite em pó.

Quanto ao mercado interno, o relatório ressalta que o consumo da bebida tende a permanecer em volumes baixos ano que vem, em linha com o desempenho de 2017. “O cenário é derivado do excesso de leite no mercado e da fraca demanda dos consumidores, mesmo que indicadores mostrem que a situação econômica do Brasil está melhorando gradualmente”, diz o documento.

Com isso, as empresas do setor estão apostando nos derivados em vez da matéria-prima em si. Para 2018, a expectativa é de que o consumo doméstico de leite fique estável em 10 milhões de toneladas.