Cotidiano

Produção sobre arte rupestre paranaense é a única brasileira exibida em festival na Itália: 'Um filme sobre arqueologia é uma resistência', diz diretora

Pinturas encontradas na região dos Campos Gerais são de cerca de oito mil anos atrás. Exibição será em festival de Firenze

Produção sobre arte rupestre paranaense é a única brasileira exibida em festival na Itália: 'Um filme sobre arqueologia é uma resistência', diz diretora

Registros de artes rupestres encontrados nos Campos Gerais do Paraná serão exibidos nesta sexta-feira (4) em um festival de cinema em Firenze, na Itália. A história e a cultura relacionadas às pinturas, com datação superior há oito mil anos, são tema de episódio da série “O Lugar Antes de Mim”, de uma produtora paranaense.

O projeto foi o único brasileiro a ser selecionado pelo evento italiano. .

Uma das idealizadoras do projeto, Karla Nascimento destaca a importância de retratar a riqueza e “a história das pessoas que moravam aqui antes da gente”. Ela afirma que a iniciativa busca divulgar conhecimento e também conscientizar sobre a preservação.

“Fazer um filme sobre arqueologia é uma resistência. A importância [de exibir] é que o patrimônio cultural brasileiro, principalmente esse a céu aberto, tem risco de tudo. […] É preciso viver em harmonia com desenvolvimento econômico e preservação ambiental, que vai gerar uma preservação cultural, porque isso é cultura. Uma pintura rupestre, uma gravura, isso é expressão humana. A gente precisa da preservação ambiental”, disse.

 

O episódio a ser exibido nesta sexta-feira (4), em Firenze, levou um ano para ser gravado e conta histórias dos municípios de Ponta Grossa, Jaguariaíva, Tibagi, Ventania e Piraí do Sul.

“Você tem o patrimônio paleontológico de interesse mundial, não é interesse só nosso. Ele é um bem da humanidade, você entender o que era a geologia 200 milhões de anos, 400 milhões de anos, é de interesse do mundo. A gente tem que entender isso, primeiro o ambiente, e depois entender como as pessoas interagiam com ele, é de uma relevância extrema pra hoje e para o futuro”, explicou Karla sobre a escolha da região.

Ainda segundo ela, a produção busca unir entretenimento com rigor científico, mantendo a fidelidade à ciência como um dos pilares principais do projeto.

Antes de ser exibido na Itália, a produção foi exibida no Cine Tornado, um festival brasileiro, nos Estados Unidos, além do País Basco, na Espanha, e também em um festival em Narbona, na França.

“A importância de ele ser exibido fora é que o assunto começa a ser discutido no âmbito nosso. Infelizmente, a gente tem essa referência de que a gente precisa ter o aval, uma chancela, de pessoas de fora para achar que aquilo é importante. No cinema essa chancela vem via festivais”, explicou.

 

A produtora explicou, ainda, que as principais dificuldades enfrentadas são relacionadas à captação de recursos. A produção de cada episódio tem custos altos com equipamentos, pessoal, alimentação, hospedagem, por exemplo.

No caso do episódio, chamado “A Arte Rupestre nos Campos Gerais”, a empresa conseguiu suporte também em um edital do Governo do Paraná, o Programa Estadual de Fomento e Incentivo à Cultura.

“São vários recursos que custam muito caro e que para a gente acessar é muito difícil. Mas, se a gente com pouco consegue estar lá, você fica satisfeito. Importante é a forma que a gente faz, com qualidade”, frisou.

Produção participou de edital do Programa Estadual de Fomento e Incentivo à Cultura do PR — Foto: Foto Cedida/O Lugar Antes de Mim

Produção participou de edital do Programa Estadual de Fomento e Incentivo à Cultura do PR — Foto: Foto Cedida/O Lugar Antes de Mim

Escolha para o festival

 

Para ser exibido no Firenze Archeofilm – Festival Internazionale Del Cinema di Archeologia Arte Ambiente, a série passou por um processo de seleção.

O material foi traduzido para três línguas e será exibido com legendas na Itália.

episódio é o único produto brasileiro a participar desta edição e um dos dois da América do Sul – o outro é argentino.

Segundo Karla, a maior parte dos filmes participantes é dos Estados Unidos ou de países da Europa – reflexo do maior investimento e incentivo à cultura nessas regiões.

Nos Campos Gerais do Paraná, datação supera os oito mil anos — Foto: Foto Cedida/O Lugar Antes de Mim

Nos Campos Gerais do Paraná, datação supera os oito mil anos — Foto: Foto Cedida/O Lugar Antes de Mim

Por conta das participações em festivais, o episódio ainda não está disponível na íntegra na internet. Contudo, depois disso, a produção pode ser acessada por qualquer pessoa, gratuitamente.

Ainda segundo Karla, essa característica do produto também gera um “efeito rebote” na educação. Apesar de não ser foco da produção, o conteúdo acaba sendo utilizado por professores e pedagogos como material de apoio na hora de ensinar.

Gravura com movimento

 

Em Piraí do Sul, "gravura com movimento" chamou a atenção de equipe — Foto: Foto Cedida/O Lugar Antes de Mim

Em Piraí do Sul, “gravura com movimento” chamou a atenção de equipe — Foto: Foto Cedida/O Lugar Antes de Mim

Em Piraí do Sul, um dos municípios visitados pela produção do episódio, uma gravura a cerca de sete metros de altura chamou a atenção de toda a equipe. Veja na imagem acima.

“É uma cena lindíssima, bem complexa. Primeiro que ela está a sete metro de altura. Para a gente filmar foi bem difícil, porque é mata fechada, e o drone não subia. Não é uma pintura simples. É uma pintura que mostra uma cena com música, tem os instrumentos musicais, tem tipo uns chocalhos”, relembrou.

 

Segundo Karla, que também é funcionária concursada da Universidade Federal do Paraná (UFPR), a figura também traz simbolismo e é tema de publicações em revistas internacionais.

“É uma pintura incrível, bonita, bem complexa. A gente fica mais impactado quando tem esse nível de complexidade”, afirmou.

Outros episódios

 

O segundo episódio que será apresentado na Itália compõe uma série de quatro partes, sendo que uma foi publicada e também participou de festivais internacionais.

No primeiro episódio, o tema também são pinturas rupestres, mas desta vez em São Desidério, na Bahia. A produção foi disponibilizada gratuitamente na internet e, segundo Karla, aborda mais os registros.

“É mais de registro porque não tem pesquisa ainda, dados, datações e é um patrimônio em risco por vandalismo, e a gente trata isso no filme”, contou.

Os outros dois episódios que fecham a série, o terceiro e o quarto, ainda não estão finalizados. Eles voltam a contar histórias no Paraná, mas desta vez no litoral e também em Curitiba e região.

“O três será feito em Guaraqueçaba, no litoral, e em Adrianópolis, na Região Metropolitana de Curitiba, sobre os sambaquis litorâneos. Esse é um assunto muito instigante e tem muita pesquisa. O quarto episódio também já está na fila de produção, que é sobre a megafauna e os primeiros habitantes do território que hoje é Curitiba. A gente vai trabalhar com Curitiba, mas com a pré-história, o que estava acontecendo antes dos europeus chegarem”, contou.

G1 Paraná