Cotidiano

Freira uruguaia ajuda garotas de programa da Vila Mimosa há 10 anos

2016 913381659-201606012355509397.jpg_20160704.jpgRIO – Em qualquer parte do mundo, o movimento das zonas de prostituição é mais ou menos o mesmo: durante a noite ou a madrugada, muitos homens disputam a atenção de mulheres com pouca ou nenhuma roupa, nomes falsos, bebidas e drogas à disposição, em um ambiente à meia-luz, que reforça a atmosfera marcada pela clandestinidade. É pelo amanhecer quando, por conta própria, a natureza trata de desmontar este cenário sombrio com a luz do sol, que entra em cena a irmã Maribel Perez León. Há 10 anos, a freira uruguaia, da ordem Thalita Kum, é responsável pela Capela São José, localizada dentro da Vila Mimosa, e realiza um trabalho de acolhimento das garotas de programa.

Atualmente, de acordo com estimativa do grupo que trabalha com a religiosa, a área abriga cerca de duas mil profissionais do sexo. Maribel destaca que sua atuação desafia o senso comum: ela não está ali para tirar as meninas da prostituição.

? Vamos uma vez por semana, para um bate-papo. É um encontro como o de quem visita um amigo: não as julgamos e não pedimos nada. A atuação da ordem tem como objetivo resgatar a autoestima destas mulheres, mostrá-las o valor que têm e, a partir disso, elas decidem o que fazer. Há quem esteja por lá há 30 anos. Quem sou eu para dizer o que essas mulheres devem fazer? Nós tentamos ajudá-las, mas as que saíram o fizeram por conta própria ? orgulha-se.

Adaptar-se à nova missão não foi fácil para a religiosa que, até então, passara toda a vida na pequena San José, cidade do interior do Uruguai, de onde só sairia aos 19 anos, para o seminário, em Cordes-sur-Ciel, um vilarejo do sul da França, de pouco mais de mil habitantes. Foi aos 23 anos que, sem jamais ter pisado em uma cidade grande, Maribel colocou os pés pela primeira vez na Vila Mimosa, e ficou chocada.

? É um lugar feio, sujo, com pessoas muito sofridas, mas que têm trajetória. Descobri que ninguém está ali porque gosta, para ganhar mais ou para ser feliz. A maioria se droga e ou é alcoólatra, porque este é um trabalho muito difícil de se fazer sobriamente. A nossa equipe faz um trabalho de formiguinha, dez anos não é nada para isso. Nossa maior dificuldade é trabalhar o amor próprio das moças, que são muito sofridas e não acreditam no próprio potencial ? analisa a freira, que comanda um grupo oscilante de voluntários e estuda Teologia.

Graças à atuação da capela, a Vila Mimosa fez parte do roteiro da Cruz Peregrina e do Ícone de Nossa Senhora, símbolos da Jornada Mundial da Juventude que rodaram a cidade em 2013. O evento atraiu os olhos do mundo para a comunidade, mas a aproximação entre o sagrado e o profano, muitas vezes, dificultava o trabalho missionário. Frequentemente, as garotas de programa ficavam inibidas de entrar na capela, seja por estarem sob efeito de substâncias diversas, ou pelas roupas que usavam. A situação começou a mudar no ano passado, quando a ordem inaugurou, em uma residência, na Praça da Bandeira, a Casa Irmã Verônica. Próximo à principal zona de prostituição da cidade, mas fora dela, os trabalhos cresceram. Atualmente, incluem atendimento social, além de passeios, peregrinações e distribuição de roupas e cestas básicas para as que vêm de famílias carentes. Doações podem ser feitas na sede da instituição, na Rua Paraíba 38. Apesar de as ainda incipientes oficinas profissionalizantes ofereceram a possibilidade de um novo rumo profissional às participantes, são os passeios que entusiasmam Maribel:

? A casa não intimida, como um templo. Elas se sentem à vontade. Chegam antes ou depois do trabalho, é uma situação diferente. Nós já as levamos ao Cristo Redentor, a Aparecida do Norte, já fizemos churrascos. É incrível ver que, neste momento, elas se transformam, interagem, conversam, levam os filhos, trocam experiências. Assim temos acesso a uma nova dimensão destas mulheres.

Além de contribuições para expandir a obra, ela busca parcerias, para ter condições de oferecer empregos às garotas de programa.