Cotidiano

Carina Casuscelli, estilista: ?Pessoas com nanismo são segregadas na moda?

201609192142246677.jpg?Tenho 37 anos, sou filha de italiano e nasci em São Paulo. Desde adolescente, faço cursos de teatro, e me formei em Moda na Universidade Anhembi Morumbi e em Artes Cênicas pelo Teatro Escola Macunaíma. Faço mil projetos, produzindo, dirigindo, atuando, assinando figurinos ou todos de uma só vez.?

Conte algo que não sei.

As pessoas com nanismo são as mais segregadas na moda. Não há roupas criadas especialmente para anões. Eles têm que se vestir usando peças infantis, fazendo adaptações ou encomendando sob medida. Não existe nada pronto no mercado.

E por quê?

Os empresários são muito medrosos. E as pessoas com nanismo recebem pouco foco. Acredito que seja pela identificação: se você não é anão ao nascer jamais o será. Bem diferente de uma pessoa que perde uma perna, por exemplo. Isso pode acontecer com qualquer um, a qualquer momento da vida. Por essa incapacidade de se reconhecer naquela situação, pessoas com nanismo são muito excluídas.

Você trabalha com a diversidade na moda e na arte há mais de 15 anos. O que percebe de mudança nesse tempo?

Lá atrás, pessoas com nanismo ficavam mais acuadas. Com frequência, acontece uma coisa um tanto grosseira: as pessoas comentam e fotografam pessoas com nanismo. Elas ficavam intimidadas por isso. Hoje, quando alguém vem fotografar, por exemplo, elas fazem pose e se exibem, em vez de se esconderem. A mudança na autoestima é algo lindo, e acho que meu trabalho ajudou a quebrar esse paradigma. Elas estão empoderadas, bem resolvidas e queria que isso chegasse a todas elas. Ano passado, em Paris, aconteceu a terceira edição do Dwarf Fashion Show, que também faz desfiles com meninas com nanismo, e recebeu um destaque enorme pelo mundo.

Como seu trabalho ajuda a elevar a autoestima?

Com desfiles-performance de moda que quebram barreiras e acabam com o estigma em cima delas. Faço uma coleção, com roupas feitas para cada um dos modelos. Elas desfilam, se expõem, mostram sua exuberância, inspiram e seduzem a plateia.

Quais os desafios de fazer uma coleção assim, sem seguir um padrão?

Eu faço no esquema da alta-costura. Primeiro construo a moulage em cada uma delas, levo para o tecido plano e depois finalizo no corpo. Todas as modelos são muito diferentes, não há padrão nem mesmo dentro do nanismo. E eu adoro isso. Mas esse processo de produção é lento e nada comercial. Para mudar isso, a minha última coleção foi feita com tecidos que se adaptam ao corpo, como o elastano.

Quando você começou a se interessar pelo nanismo?

Durante o curso de teatro que fiz na adolescência, tinha uma anã na turma que virou uma grande amiga. Por conta do nosso convívio, notei o quanto é difícil a pessoa ser diferente. Foi ela quem me fez olhar e ter cumplicidade pela causa e me inspirou muito criativamente. No meu trabalho de fim de curso, apresentei as roupas em duas modelos, uma com nanismo e outra com gigantismo. Foi um sucesso.

Como você as ajuda a se posicionarem como modelos e artistas?

Eu respeito a limitação de cada uma, mas instigo para que elas transformem isso em potência. Todos os artistas que estão comigo são provocados durante o processo. Quero que eles transcendam e não sejam vistos como pessoas com deficiência. Frida Kahlo não conseguiu isso? Eles também podem.