Cotidiano

Adotado, menino vendido pelo Estado Islâmico reencontra a família

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MOSSUL, IRAQUE ? Ele recebeu o nome de Ahmed do casal que o comprou por US$ 500 e o trouxe de volta para a sua família no Iraque, onde teve a família atacada pelo Estado Islâmico. Parte da minoria religiosa yazidi, vários de seus parentes foram massacrados. Os que sobreviveram foram vendidos como escravos. Foi assim que o garoto Ayman, de 4 anos, chegou aos cuidados do casal islâmico Umm e Abu Ahmed. Por 18 meses ele viveu com os Ahmed. Seus parentes biológicos acharam que Ayman havia morrido, um dos milhares de sua etnia que desapareceram desde que militantes do EI invadiram suas casas e fizeram o que a ONU categorizou como genocídio. Quando forças iraquianas retomaram o Leste de Mosul na semana anterior, encontraram Ayman e o levaram ao que restava de sua família.

Falando em sua nova casa para a agência de notícias Reuters, Abu Ahmed contou como adotou Ayman. Foi a esposa que teve a ideia de adotar uma criança. Ela ouviu dizer que o Estado Islâmico estava vendendo órfãos numa cidade próxima.

? Meu objetivo era ganhar favor (com Deus) ? disse Umm, vestindo uma burca que só mostrava seus olhos. ? Para ser honesta, queria o ensinar minha religião, o Islã.

Aos poucos, Ayman se acostumou com a nova vida, o que incluia aprender árabe, ao invés do dialeto curdo falado pelos yazidis. Os Ahmed apresentavam o garoto como seu sobrinho e o matricularam em uma escola sob o nome de Ahmed Shareef. Eles, inclusive, o incentivaram a falar sobre sua vida na aldeia. Mas o instruíam a não falar para ninguém sua origem.

Os yazidis são taxados de infiéis pelo IE, pois sua religião combina elementos de diversas crenças do Oriente Médio. Por isso, a família de Ayman foi atacada, com sua irmã e meio-irmão também sendo vendidos como escravos.

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Com a recuperação da cidade de Mossul, o Exército iraquiano recebeu informações sobre o menino mantido em cativeiro. Os Ahmed não tiveram outra opção além de o entregar aos soldados. Um vídeo mostra Umm implorando para ter mais tempo com a criança.

A avó e tio biológicos de Ayman souberam do resgate do garoto pela internet, através de um post no Facebook. Eles vivem em um campo de refugiados nas proximidades.

? Eu fiquei sem palavras ? conta Samir Rasho Khalaf, o tio. ? Foi um milagre. Ele voltou dos mortos.

Na mesma noite, o garoto foi entregue a família. Ainda que o reencontro fosse feliz, o corte de laços que ele havia desenvolvido com seus pais adotivos foi um novo motivo de tristeza. Em outro vídeo mostrado à Reuters, a avó de Ayman chora ao reencontrar o neto que considerava perdido.

? Nós todos choramos ? conta o major Wathiq Amjad Naathar, o oficial do exército que fez a entrega aos familiares. Porém, o garoto ficava inconsolável, querendo se reunir com os pais adotivos.

Agora, em visita feita pela Reuters a sua casa, ele está mais calmo e feliz. Ao ser perguntado se havia sido feliz com seus pais adotivos, ele respondeu que sim. E se estava feliz de voltar a sua família biológica, a resposta também foi sim.