Cotidiano

Acervos e coleções compõem exposição na Casa França-Brasil

RIO – Foi numa viagem a Toledo, na Espanha, que o curador e professor Marcelo Campos se deparou com um pintura de El Greco (1541-1614) na catedral da cidade. ?O espólio? (1579) mostra Cristo com um túnica vermelha pouco antes da crucificação.

? A pintura me fez pensar sobre a ideia da propriedade, o que deixamos de verdade ? diz Campos. ? Esse momento da túnica é aquele em que ele vai ser espoliado, algo será roubado dele.

A ideia, ampliada para abrigar noções como memória e herança, é o ponto de partida da coletiva ?Espólios?, que será inaugurada nesta quarta-feira na Casa França-Brasil, onde Campos é curador. Ele e os curadores assistentes João Paulo Quintella, Laura Cosendey e Poliana Quintella reuniram oito artistas cujo trabalho se insere em ramificações do conceito inicial. José Rufino e Brígida Baltar, por exemplo, apresentam obras que tratam da noção do corpo (a primeira propriedade) e do sudário. Rufino, através de monotipias produzidas a partir de documentos encontrados na fazenda de cana de açúcar de seu avô, na Paraíba; Brígida, com os lenços nos quais bordou autorretratos exagerando os efeitos do tratamento a que se submeteu para tratar uma leucemia.

Mais diretamente ligado à ideia de espólio é o trabalho de Thales Leite. Fotógrafo, ele era chamado por parentes de pessoas mortas para documentar os objetos deixados, com o objetivo de avaliá-los e vendê-los depois.

? Nessas fotografias você vê como o valor na arte contemporânea é flutuante ? diz Campos. ? Uma família que não tem ideia do que cada coisa vale empacota tudo, de um casaco de pele a um lustre, um bibelô.

Um outro desdobramento, a noção de acervo, está presente na obra de Renato Bezerra de Mello. Em ?Inventário do esquecimento?, o artista trabalha com grafite sobre fichas de prostitutas francesas, catalogadas entre os anos de 1929 e 1960, que encontrou numa caçamba de lixo em Paris.

? Ele cria uma instalação, anulando os nomes e as informações. Trata-se de um espólio indesejado, Claudia Hersz_Cildo Desvi(i)inho (1).jpgque a sociedade rejeita ? comenta o curador.

Há ainda o gaúcho Rafael Pagatini, com espécies de fotogravuras originadas de material garimpado no arquivo do Dops do Espírito Santos: fotos e descrições contidas no verso podem ser combinadas de diversas formas, evidenciando a arbitrariedade dos agentes da política e a aleatoriedade das informações. Já a dupla formada por Louise Ganz e Inês Linke desenvolve um trabalho baseado na ideia de propriedade, mas de modo mais político, tratando da posse da terra e dos bens públicos.

Há ainda um trabalho concebido especialmente para o Cofre da CFB: Claudia Hersz vai expor ali ?A minha coleção?, composta por réplicas em miniatura de obras emblemáticas, aludindo a questões de desejo e aos acervos de arte contemporânea.

?Espólios?

Onde: Casa França-Brasil ? Rua Visconde de Itaboraí 78, Centro (2332-5120). Quando: Abertura 11/1, às 18h. Ter. a dom., das 10h às 20h. Até 5/2. Quanto: Grátis. Classificação: Livre.