As evidências de pesquisas científicas sugerem: dispositivos tecnológicos de telas e mídias oferecem benefícios e riscos para a saúde das crianças e adolescentes, tornando-se necessário o planejamento de familiares, professores e cuidadores para que manter o processo de desenvolvimento de forma adequada. “Diante da relevância da interdisciplinaridade e do tempo em que as crianças permanecem nas escolas, entende-se que o papel do educador nas escolas é fundamental para a formação de um ser humano saudável”, observam especialistas na área.
O assunto mereceu atenção de documento científico recém-lançado pela SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria). Conjuntamente, dois de seus Departamentos – o de Desenvolvimento e Comportamento e o de Saúde Escolar da Sociedade Brasileira de Pediatria – publicaram o texto “Uso saudável de telas, tecnologias e mídias nas creches, berçários e escolas”.
O objetivo é partilhar conhecimentos da literatura científica médica com as equipes de pedagogos, professores, auxiliares escolares e educadores sobre o uso correto da tecnologia em prol de um desenvolvimento neuropsicomotor satisfatório na infância e adolescência.
Segundo o documento, o desenvolvimento da criança é de responsabilidade da equipe de saúde, da família e do educador, que ajudam no processo de formação, sobretudo pelos exemplos e ações. Nesse sentido, têm relevância o tempo de permanência na escola, o conteúdo repassado e a atuação dos educadores, entre outros.
Riscos
Segundo o documento, entende-se como riscos os efeitos negativos para a saúde nas áreas do sono, da atenção, do aprendizado, do sistema hormonal (com risco de obesidade), da regulação do humor (com risco de depressão e ansiedade), do sistema osteoarticular, da audição, da visão, além do risco de exposição a grupos de comportamentos de risco e a contatos desconhecidos, com possibilidade de acesso a comportamentos de autoagressão, tentativas de suicídio e crimes de pedofilia e pornografia.
Esses efeitos deletérios já haviam sido abordados, de modo genérico, em outro documento lançado pela SBP em 2016. O trabalho “Saúde das crianças e adolescentes na Era Digital”, que deve ser lido e consultado por pais, professores, educadores, cuidadores, escolares e adolescentes sobre esse assunto, recomendava o tempo adequado de exposição às telas e à internet para cada idade, de acordo com a maturação e desenvolvimento cerebral.
Os dois estudos produzidos pela SBP dialogam ao demonstrar evidências que, quão mais nova a criança, menor a capacidade do cérebro de discernir a ficção da realidade. Além disso, durante os primeiros anos de vida a formação da arquitetura cerebral é acelerada e servirá de suporte para todo o aprendizado futuro.
“Torna-se essencial que cuidadores e educadores priorizem atividades que auxiliem o aproveitamento do potencial dessas crianças e, portanto, o uso consciente das telas é fundamental. As escolas são fontes de conhecimentos e possuem papel importante em fornecer bons exemplos para pais e cuidadores. O seguimento das diretrizes que protegem e estimulam as crianças de forma adequada pode gerar mudanças significativas em toda a sociedade”, destacam os especialistas.
Legislação precisa ser adequada
Dentre as conclusões apontadas pelo trabalho, está a necessidade de adequação da Lei 12.965, de 23 de abril de 2014, que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil, às atividades realizadas em escolas e creches de maneira a garantir o pleno desenvolvimento das crianças e protegê-las dos excessos e perigos do mau uso dos recursos tecnológicos na era digital.
“Os nativos da Era Digital têm direito à utilização e desfrute dos recursos tecnológicos para sua aprendizagem e auxílio ao seu desenvolvimento, mas as famílias e as instituições precisam se adequar no sentido de diminuir os riscos do mau uso dessas ferramentas”, observam os especialistas.
De forma complementar, o texto “Uso saudável de telas, tecnologias e mídias nas creches, berçários e escolas” reitera resultados obtido em 2013 a partir de um estudo científico que demonstram que crianças de 6 meses a 3 anos, cujos cuidadores usavam livros com hábito frequente de leitura dirigida e linguagem gestual, exibiram mais conhecimento sobre os significados dos símbolos linguísticos.
Elas também obtiveram melhores resultados na avaliação da linguagem e das habilidades sociais, comparadas com outro grupo que passava o mesmo tempo de leitura do grupo acima, mas em aplicativos infantis de estímulo à linguagem e em programas e vídeos educativos na TV e em smartphones.
Esse estudo mostra que a interação cuidador-criança e as brincadeiras livres não podem ser substituídas pela tecnologia do século XXI. Essa interação entre a crianças e os adultos e entre as próprias crianças é fundamental para o desenvolvimento e a socialização.
“A SBP, pelos Departamentos Científicos de Pediatria do Desenvolvimento e Comportamento e de Saúde Escolar, entende que a tecnologia, quando usada de forma adequada e apropriada, é uma ferramenta que pode melhorar a vida diária das crianças e ajudá-las em todas as facetas do seu desenvolvimento. Mas, quando usada de forma inadequada, abusiva ou sem planejamento, a mídia pode ocupar o espaço de atividades importantes para o desenvolvimento infantil, como pelo brincar, interação face a face, tempo familiar de qualidade, brincadeiras ao ar livre, exercícios físicos, tempo de inatividade e ócio criativo”, salientam os especialistas.