RIO – A obesidade e o sobrepeso vêm aumentando no Brasil assim como em toda a América Latina e Caribe, com um impacto maior nas mulheres e uma tendência de crescimento entre as crianças, aponta relatório conjunto da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e a Organização Pan-americana de Saúde (Opas) divulgado recentemente. De acordo com o levantamento, intitulado ?Panorama da Segurança Alimentar e Nutricional na América Latina e Caribe?, mais da metade da população brasileira está com sobrepeso e a obesidade já atinge a 20% das pessoas adultas no país, enquanto 58% da população latino-americana e caribenha estão com sobrepeso, num total de 360 milhões de pessoas, e a obesidade afeta 140 milhões, ou 23% da população regional.
Segundo o documento, elaborado com base em dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), o sobrepeso em adultos no Brasil passou de 51,1% em 2010, para 54,1% em 2014. A tendência de aumento também foi registrada na avaliação nacional da obesidade. Em 2010, 17,8% da população era obesa; em 2014, o índice chegou aos 20%, sendo a maior prevalência entre as mulheres, 22,7%. Outro dado do relatório é o aumento do sobrepeso infantil. Estima-se que 7,3% das crianças menores de cinco anos estão acima do peso, sendo as meninas as mais afetadas, com 7,7%.
– O Panorama acende um alerta para toda a sociedade e também para o governo. Ao mesmo tempo em que o Brasil conseguiu superar a fome, alcançando níveis inferiores a 5% desde 2014, quando o país saiu do mapa da fome da ONU, vem aumentando nos últimos anos os índices de sobrepeso e obesidade. Essa situação gera impactos importantes na saúde e deve ser um tema prioritário nas agendas das famílias e das autoridades – afirmou o representante da FAO no Brasil, Alan Bojanic.
O ministro da Saúde, Ricardo Barros, informou que a prevenção é marca da atual gestão da pasta:
– O Brasil vem enfrentando aumento expressivo do sobrepeso e da obesidade em todas as faixas etárias, e as doenças crônicas são a principal causa de morte entre adultos. O setor da saúde tem importante papel na promoção da alimentação adequada e saudável. Desta forma, o ministério tem reforçado os programas e as iniciativas que buscam mudar o hábito da população e incentivar práticas mais saudáveis.
O crescimento econômico, a urbanização e a mudança nos padrões de consumo são alguns aspectos que explicam o crescente aumento do sobrepeso. O relatório aponta que muitas famílias têm deixado de consumir pratos tradicionais e aumentado a ingestão de alimentos ultra-processados e de baixa qualidade nutricional.
Combater essa realidade implica em adotar sistemas alimentares saudáveis e sustentáveis que unam agricultura, alimentação, nutrição e saúde. É necessário fomentar a produção sustentável de alimentos frescos, seguros e nutritivos, garantir a oferta, a diversidade e o acesso, principalmente da população mais vulnerável. Isso deve ser complementado com educação nutricional e advertências para os consumidores sobre a composição nutricional dos alimentos ricos em açúcar, gordura e sal.
O relatório, no entanto, também destaca iniciativas adotadas pelo governo brasileiro para promover a alimentação saudável e alertar a população para os riscos da má alimentação. Uma delas é a criação de legislações que regulam a comercialização e a publicidade de alimentos para lactantes e crianças, além de outros alimentos voltados à primeira infância. Também foi citada a campanha ?Brasil Saudável e Sustentável?, que tem por objetivo sensibilizar e alertar a população brasileira dos benefícios da alimentação saudável.
Outro avanço é o Plano Nacional de Redução de Sódio em Alimentos Processados, que já retirou 14.893 toneladas de sódio dos produtos alimentícios. O Brasil também contribuiu ativamente para a aprovação da Década de Ação pela Nutrição (2016?2025) ? estabelecida na última Assembleia Mundial da Saúde, em maio de 2016 ? para promover o fortalecimento das ações na área de nutrição, com foco na Agenda 2030 das Nações Unidas.
Realidade Regional
Ainda de acordo com o relatório, com exceção de Haiti (38,5%), Paraguai (48,5%) e Nicarágua (49,4%), o sobrepeso afeta mais da metade da população de todos os países da América Latina e Caribe, sendo Chile (63%), México (64%) e Bahamas (69%) os que registram as taxas mais altas. Já com relação à obesidade, as maiores prevalências são observadas em países do Caribe: Bahamas (36,2%) Barbados (31,3%), Trinidad e Tobago (31,1%) e Antígua e Barbuda (30,9%). A obesidade também impacta mais as mulheres: em mais de 20 países de toda região, a taxa de obesidade feminina é 10% maior que a dos homens.
– As taxas alarmantes de sobrepeso e obesidade na América Latina e Caribe devem chamar a atenção dos governos da região para criar políticas que abordem todas as formas de fome e má nutrição, vinculando segurança alimentar, sustentabilidade, agricultura, nutrição e saúde – diz Eve Crowley, representante regional da FAO.
Carissa F. Etienne, diretora da Opas, por sua vez, explicou que a região enfrenta ?uma dupla carga da má nutrição que deve ser combatida com uma alimentação balanceada que inclua alimentos frescos, saudáveis, nutritivos e produzidos de forma sustentável, além de abordar os principais fatores sociais que determinam a má nutrição?, dando como exemplos a falta de acesso a alimentos saudáveis, à água e saneamento, serviços de educação e saúde e programas de proteção social, entre outros.
Desnutrição infantil cai, mas ainda afeta os mais pobres
De acordo com o Panorama, a região conseguiu reduzir consideravelmente a fome e hoje apenas 5,5% da população está subalimentada, sendo o Caribe a sub-região com maior prevalência (19,8%), devido ao fato de o Haiti ter a prevalência de subalimentação mais alta do planeta: 53,4%.
A desnutrição crônica infantil (altura e peso baixos para a idade) na América Latina e Caribe também registrou uma evolução positiva: caiu de 24,5% em 1990 para 11,3% em 2015, uma redução de 7,8 milhões de crianças.
Apesar desse importante avanço, atualmente 6,1 milhões de crianças ainda sofrem de desnutrição crônica na região: 3,3 milhões na América do Sul, 2,6 milhões na América Central e 200 mil no Caribe. Destas, 700 mil crianças sofrem com desnutrição aguda, sendo 1,3% menores de cinco anos.
Praticamente todos os países conseguiram melhorar a nutrição das crianças, mas cabe destacar que a desnutrição afeta mais a população mais pobre e de áreas rurais.
– São nesses locais que os governos devem concentrar os esforços – salienta Eve Crowley.
As prevalências mais altas de desnutrição crônica infantil na região são registradas na Guatemala (2014-2015), e Equador (2012-2013), já o Chile e Santa Lúcía têm as menores taxas. A desnutrição crônica apresenta níveis superiores em áreas rurais de todos os países analisados.
Aumenta o sobrepeso infantil
No outro lado da questão, o relatório aponta também que na América Latina e Caribe 7,2% das crianças menores de cinco anos estão com sobrepeso, o que representa um total de 3,9 milhões, sendo que 2,5 milhões moram na América do Sul, 1,1 milhão na América Central e 200 mil no Caribe.
As taxas mais elevadas de sobrepeso infantil entre 1990 e 2015 foram registradas ? em números totais ? na América Central (onde a taxa cresceu de 5,1% para 7%). O maior aumento na prevalência foi registrado no Caribe (cuja taxa aumentou de 4,3% a 6,8%). Já na América Sul ? a sub-região mais afetada pelo sobrepeso infantil ? houve uma leve diminuição de 7,5% para 7,4%.
Melhorar a sustentabilidade da agricultura
Outra preocupação levantada no relatório é melhorar a sustentabilidade da agricultura na região. Segundo o levantamento, a trajetória atual de crescimento da produção agrícola é insustentável devido, entre outros fatores, às graves consequências impostas aos ecossistemas e recursos naturais da região.
– A sustentabilidade da oferta alimentar e sua diversidade futura estão sob ameaça, a menos que mudemos a forma como estamos fazendo as coisas – alerta Eve Crowley, destacando que 127 milhões de toneladas de alimentos se perdem ou são desperdiçados anualmente na América Latina e Caribe.
Segundo a FAO e a OPAS, é necessário tornar mais eficiente e sustentável o uso da terra e dos recursos naturais, melhorar as técnicas de produção, armazenamento e transformação e processamento dos alimentos, e reduzir as perdas e os desperdícios de alimentos para assegurar o acesso equitativo dos mesmos.