Vivian Weiand
Quem dera pudesse passar o dia inteiro com meu bebê deitado sobre meu corpo. Sons inteligíveis e gestos sem sentido se combinam em uma linguagem que apenas nós dois conhecemos. Quem dera fosse eterna a sensação de paz e infinita serenidade que sentimos ao ter sobre o nosso corpo um filho descobrindo as mãos dele e a textura do tecido que envolve o peito de sua mãe. Se não eterno, que durasse uma hora, tempo suficiente para esquecer meu nome, meu trabalho e quantos anos já vivi para simplesmente mergulhar no paraíso sem padecimento nem hora para voltar. A maravilha de ver um ser humano, o meu humano, se desenvolvendo, a ramificação do pequeno galho que agora faz parte da minha árvore genealógica, esta que foi regada por meus antepassados, pessoas que se quer conheci, mas que, por meu intermédio, continuam gerando frutos.
O telefone toca. Covardia, nem deu uma hora. O filho entrego para a babá. Coisas da sala de redação. Hora de voltar à vida. Afinal, dia 05 devem ser pagos escola, celular, condomínio e empregada, a mesma que faço de conta que não sei estar levando para casa metade do meu sabão em pó e o leite desnatado. As delícias de se ter um filho não vem de graça, você tem despesas e uma boa dose de sacrifício. E eles exigem muito, exigem tempo, um tempo que não temos mais. Filhos precisam de dedicação, afeto, compreensão, companheirismo e uma boa dose de bom humor para não pararmos em um psiquiatra. Filho faz a gente descobrir que existe um poço enorme em algum lugar do nosso peito onde são trancadas nossas frustrações, nossas angústias e tudo mais que nos faz padecer no paraíso, como ver uma caixa de sabão em pó reduzida a nada.
Não, ter filhos não é ruim, é bom, é consequência da vida, mas é fonte de preocupação e da eterna nuvem da culpa que acompanha nossa cabeça, a marca registrada de que não estamos conseguindo ser as mães que acreditamos ser a melhor para eles, bebês que crescem independente de você estar ou não acompanhando. As melhores fases, as delícias de se ter um filho são usufruídos, a maior parte do tempo, pelas babás e avós do que pela pessoa responsável por ele.
Os prazeres da maternidade fazem com que você reveja alguns conceitos, como aguentar as fofocas da sogra e não substituir a empregada que some com o sabão em pó, mulher que só não conhece o olho da rua porque meu filho a adora. Começar tudo de novo, agência de emprego e entrevistas, é dor de cabeça certa. Essa pelo menos eu sei que o problema é com o sabão, e outra seria o quê?
Para usufruir das delícias de ter um filho é necessário puxar o feio de mão e dedicar mais tempo à família, pessoas que estão na árvore de seu filho, gente que ele gosta, gente de que ele precisa. Não posso mais dizer que não quero saber da vida dos outros e isso inclui a avó do meu filho. Maridos gostam que suas mães recebam atenção de suas esposas, afinal, todas pessoas de uma mesma família, a família de um menino, o seu menino, mesmo que essas concessões constituam o padecimento no paraíso, fazem parte do pacote “filho” e não podem ser descartadas.
Mas ele existe, o paraíso, tem nome e sobrenome e agora um par de mãozinhas que pegam tudo. Não, infelizmente não é eterno esse momento e se quer posso passar meio turno vivenciando essa maravilha, por isso que aproveito aquelas horas que antecedem minha ida ao trabalho. É o jeito, é o que pode ser vivido, e é o preço que eu pago além do sabão em pó.
A autora é jornalista