Cotidiano

Janot quer ouvir Aécio em inquérito que investiga senador por irregularidades em Furnas

BRASÍLIA – O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que o senador Aécio Neves (PSDB-MG) seja ouvido em inquérito no qual o parlamentar é investigado por irregularidades em Furnas, uma das estatais do setor elétrico que faz parte do sistema Eletrobras. Janot também pediu que sejam realizados os depoimentos de outras três pessoas: o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, atualmente preso no Paraná em razão da Operaçao Lava-Jato; o ex-senador Delcídio Amaral, delator que acusou Aécio de participar do rateio de propina em Furnas; e o ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira. O procurador-geral argumentou que há ?necessidade de aprofundamento das investigações?.

As informações são do jornal “O Estado de S. Paulo”. Janot também pediu que sejam juntados ao inquérito cópias de relatórios do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria Geral da União (CGU) sobre irregularidades envolvendo Furnas, e os autos de um processo que tramita no Rio de Janeiro em que houve quebra de sigilo bancário do ex-diretor da estatal Dimas Toledo. Como o caso não envolve a Petrobras, não é considerado um inquérito da Lava-Jato, mas um desdobramento. Assim, o relator não é o ministro Edson Fachin, que cuida dos processos da operação no STF, mas Gilmar Mendes. Caberá a ele tomar uma decisão aceitando ou nãos os pedidos de Janot.

A eventual participação de Aécio no esquema que desviava dinheiro de Furnas já tinha sido apontada por dois delatores da Lava-Jato: o doleiro Alberto Youssef e o ex-senador Delcídio Amaral. Aécio teria patrocinado a indicação de Dimas, que seria o arrecadador de propinas na estatal.

O senador e o ex-diretor negam as acusações, mas, no começo de fevereiro deste ano, outro delator reforçou as suspeitas: o lobista Fernando Moura. Ele disse que foi informado pelo próprio Dimas Toledo de que um terço da propina iria para o PT de São Paulo, um terço para o PT nacional e um terço para Aécio. Posteriormente, Fernando Moura chegou a fazer uma acareação com Dimas Toledo. Nela, o ex-diretor de Furnas negou ter discutido com o delator distribuição de propinas. Mas Fernando Moura reiterou o que já tinha dito sobre os valores desviados da estatal.

“Com efeito, o depoimento de Fernando Antônio Guimarães Horneaux de Moura confirma as informações dos colaboradores de que existia um esquema de pagamento de vantagens ilícitas no âmbito da empresa Furnas, comandado por Dimas Fabiano Toledo, diretor de Engenharia de Furnas, indicado por Aécio Neves. Conquanto o diretor tenha negado participação em qualquer esquema, as declarações de Fernando Antônio Guimarães Horneaux de Moura se coadunam com os elementos trazidos pelos colaboradores”, escreveu Janot.

Em 12 de fevereiro do ano passado, Delcídio afirmou em sua delação que Aécio recebeu “sem dúvida” pagamentos ilícitos de Furnas. Segundo ele, Aécio possui vínculo “muito forte” com Dimas Toledo. O esquema em Furnas, segundo Delcídio, “funcionava de maneira bastante ‘azeitada’ e de maneira bastante competente”.

“Questionado ao depoente quem teria recebido valores de Furnas, o depoente disse que não sabe precisar, mas sabe que Dimas operacionalizava pagamentos e um dos beneficiários dos valores ilícitos sem dúvida foi Aécio Neves, assim como também o PP, através de José Janene; que também o próprio PT recebeu valores, mas não sabe ao certo quem os recebia e de que forma”, diz trecho do termo de colaboração de Delcídio.

Dimas Toledo foi diretor de engenharia de Furnas, cargo que, segundo Delcídio, era “joia da coroa” da Eletrobras, uma vez que era usada sistematicamente para repassar valores a partidos, como PSDB, PP e PT. Segundo o termo de colaboração do senador, “não há dúvidas que Furnas foi usada sistematicamente para repassar valores para partidos” e que “o que se vê hoje na Petrobras ocorreu sem dúvida em Furnas em vários governos, e talvez a figura mais emblemática neste sentido seja o próprio Dimas, que passou muitos anos na diretoria, tendo grande longevidade”.

Delcídio relata um diálogo que teve com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 6 de maio de 2005. Segundo o senador, Lula perguntou quem era Dimas Toledo. Delcídio respondeu que era um companheiro do setor elétrico bastante competente. Lula então disse: “Eu assumi e o Janene (o ex-deputado José Janene, já falecido) veio pedir pelo Dimas. Depois veio o Aécio e pediu por ele. Agora o PT, que era contra, está a favor. Pelo jeito ele está roubando muito!”. De acordo com Delcídio, Lula disse isso porque seria necessário muito dinheiro para fazer pagamentos a três partidos importantes.

A delação de Delcídio levou ainda à abertura de um outro inquérito contra Aécio, também relatado por Gilmar Mendes. Segundo Delcídio, o senador atuou para maquiar dados do Banco Rural obtidos pela CPI dos Correios. Isso porque a quebra dos sigilos da instituição financeira, envolvida no escândalo do mensalão, comprometeria vários políticos tucanos, entre eles o próprio Aécio. O delator disse inclusive que a operação teve participação do ex-prefeito do Rio de Janeiro Eduardo Paes (PMDB), na época deputado pelo PSDB e integrante da CPI, que funcionou de 2005 a 2006 e era presidida por Delcídio. Delcídio e Paes negam irregularidades.