ILHA DE FARO, Suécia ? Em vida, Ingmar Bergman (1918-2007) sempre manifestou
a amigos e parentes seu desinteresse pela celebração de efemérides como
aniversários. Ironicamente, diversas entidades suecas já começaram os
preparativos para as comemorações do centenário de nascimento do lendário
diretor, autor de mais de 60 filmes, dezenas de espetáculos de teatro e livros,
até hoje admirado por cinéfilos do mundo inteiro. Os projetos, que incluem
documentários, séries de TV, retrospectivas, digitalização de filmes e montagem
de peças já começam a inspirar iniciativas similares em outros países.
? Estamos convencidos de que será o maior jubileu jamais dedicado a um
cineasta antes! ? exulta Jan Holmberg, diretor da Fundação Ingmar Bergman, que
centraliza informações sobre a obra do diretor.
As primeiras iniciativas em torno do aniversário de 100 anos do autor de ?O
sétimo selo? (1957) estão em diferentes estágios de realização. O Swedish Film
Institute, órgão que apoia e promove a produção local de filmes, por exemplo,
comprometeu-se a fazer novas cópias digitais de todos os títulos da filmografia
de Bergman ? a de ?Persona ? Quando duas mulheres pecam? (1966) foi exibida
neste ano, no cinquentenário do longa protagonizado por Liv Ullmann e Bibi
Andersson, no Bergman Week, festival que acontece anualmente em junho para
celebrar o legado do diretor, na ilha de Faro, onde ele viveu por quase 40
anos.
O Royal Dramatic Theatre, um dos mais antigos palcos de Estocolmo, que teve
Bergman como administrador entre 1963 e 1966, e onde o realizador encenou
dezenas de espetáculos, abrigará, em 2018, um festival dedicado ao diretor. O
programa incluirá tanto versões de textos de autores encenados pelo diretor,
como ?Espectros?, do norueguês Henrik Ibsen, e ?O pelicano?, do conterrâneo
August Strindberg, quanto adaptações de seus roteiros de cinema para o palco,
como ?Cenas de um casamento? (1973) e ?Saraband? (2003). Estas duas últimas já
foram montadas no Brasil.
? Hoje em dia, as peças inspiradas nos filmes do Bergman são encenadas no
mundo inteiro, com uma média de seis novas produções por ano. Acredito que
haverá uma explosão de montagens no ano do jubileu, em termos globais ?
contabiliza Holmberg, acrescentando que estão preparando também a publicação de
textos do criador, e que alguns projetos de alcance internacional ainda são
segredo. ? Durante o verão (no hemisfério Norte) de 2018, algumas partes de
Estocolmo se converterão em verdadeiros bairros Bergman, com festivais de
teatro, retrospectiva de filmes, e a exposição especial do Museum of Performing
Arts.
A menina dos olhos do jubileu imaginado pelo Swedish Film Institute é o
projeto batizado como ?Bergman revisited? (Bergman revisitado), no qual a
instituição convida seis diretores experientes para fazer curtas-metragens
inspirados no universo do cineasta. Cada um dos seis curtas terá 10 minutos de
duração e pode ser baseado em personagens, locações ou títulos específicos da
filmografia de Bergman. Os filmes serão exibidos no Festival de Gotemburgo, em
2018, e posteriormente na SVT, a rede de TV pública sueca.
Embora voltado principalmente para cineastas suecos, o ?Bergman revisited?
também aceita propostas de cineastas de outras nacionalidades, desde que tenham
alguma identificação comprovada com a obra. Cada projeto de curta deve ser
intermediado por produtoras suecas e, se aprovado, receberá uma verba de cerca
de ? 100 mil. Seus autores poderão se hospedar em uma das cinco propriedades de
Bergman em Faro para desenvolver as ideias.
? Esses curtas terão visibilidade enorme das telas do mundo durante o
centenário. Estamos muito curiosos para ver que tipo de releituras o universo
dos filmes de Bergman inspiraria nos realizadores hoje ? afirma Andrea Fock,
responsável pelo comitê de curtas do Swedish Film Institute.
DOCUMENTÁRIO ?ÍNTIMO?
A SVT também é coprodutora do documentário ?Ingmar Bergman?, da jornalista e
documentarista Jane Magnusson, uma das atrações mais aguardadas do jubileu de
2018. Autora de ?Trespassing Bergman? (2013), no qual diretores como Martin
Scorsese, Michael Haneke, Lars Von Trier, Woody Allen e Claire Denis, entre
outros, falam sobre as influências do colega sueco em seus trabalhos, Jane agora
promete buscar um retrato mais íntimo.
? Meu documentário anterior era sobre Bergman como ícone do cinema mundial.
Tinha relatos de gente que não teve contato direto com ele. Espero, com este
novo filme, aproximar-me mais da pessoa que Bergman foi. É por isso que estou
entrevistando somente aqueles que o conheceram de perto ? explica Jane, que
antecipou detalhes do projeto durante o Bergman Week deste ano.
Palco de intensos debates sobre a obra do diretor sueco, o Bergman Center,
que há 14 anos abriga o Bergman Week, prepara mudanças em suas instalações para
a edição de 2018. A área reservada a eventos audiovisuais vai ser reformulada
para acolher uma exposição sobre a relação do diretor com a ilha. Helen
Beltrame-Linné, a brasileira que assumiu a instituição em 2014, planeja chamar
um curador convidado para bolar a programação da semana comemorativa no ano do
centenário:
? Vamos convidar uma grande personalidade do cinema para definir os eventos
dedicados ao jubileu. Essa pessoa receberá um orçamento específico para montar a
agenda. Ela terá carta branca para definir a programação.
*Carlos Helí de Almeida se hospedou a convite do Bergman Center