Cotidiano

Atores saltam no escuro com autor iraniano Nassim Soleimanpour

RIO ? Quatro anos após ter seu trabalho apresentado pela primeira vez no Brasil ? no Rio, dentro do Tempo Festival ?, o dramaturgo iraniano Nassim Soleimanpour está de volta ao país, desta vez como uma das principais atrações do Festival de Curitiba, que inicia hoje à noite a sua 26ª edição ? a abertura da mostra oficial ficará por conta de quatro trabalhos diferentes: a leitura ?Nelson Rodrigues por ele mesmo?, que faz sessão única guiada por Fernanda Montenegro, além das peças ?E se elas fossem para Moscou??, de Christiane Jatahy, ?Protocolo elefante?, da Cia. Cena 11, e ainda a intervenção urbana ?Campeonato interdrag de gaymada?, todas com duas sessões, amanhã e sexta.

O dramaturgo iraniano inicia a sua participação na sexta-feira, com a estreia de ?Blank?, sua mais recente criação. Em 2013 Soleimanpour apresentou ?Coelho branco coelho vermelho? no Rio e em São Paulo, uma obra que trazia aspectos comuns a ?Blank?: ambas são interpretadas por diferentes atores a cada noite, sempre em formato solo, e sem que os intérpretes tenham ensaiado ou saibam quaisquer detalhes do texto até o instante em que sobem ao palco.

Para a nova experiência curitibana, os curadores Guilherme Weber e Marcio Abreu selecionaram seis atores: Du Moscovis realiza a primeira sessão ? depois dele se apresentarão Debora Bloch (1º/4), Caio Blat (2/4), Camila Pitanga (7/4), Julia Lemmertz (8/4) e Gregorio Duvivier (9/4).

?Blank? é um roteiro enigmático e inconcluso, em que seu autor oferece ao espectador uma história repleta de lacunas, em aberto, e que dependerá justamente da intervenção do público para se desenvolver em cena e chegar a um desfecho, que deve ser diferente a cada noite. ?Blank? é um novo desdobramento de uma longa pequisa de ?dramaturgia colaborativa? desenvolvida pelo autor, e que teve em ?Coelho branco…? o seu ponto alto até o momento.

? Decidi criar mais uma obra colaborativa após a resposta que tive de ?Coelho…?. Recebi milhares de e-mails das pessoas que assistiram à peça ? diz ele. ? Naquele trabalho eu compartilhava uma história pessoal e pude realmente dividi-la com o mundo. Em resposta, muitos espectadores decidiram enviar a mim as suas próprias histórias, e foi aí que pensei em criar uma espécie de máquina de histórias a partir dos relatos que recebia.

66002360.jpgNas palavras do autor, ?Blank? é o ponto ?mais extremo e final? desta pesquisa, em que o teatro se faz à medida que existe a participação ativa do espectador e da sua imaginação.

? É uma estrutura que vim desenvolvendo desde as minhas primeiras peças. Criar uma forma e um lugar em que o autor, o ator e o público estão no mesmo nível, na mesma página, para que possam criar juntos uma nova história em cena, a cada noite ? diz.

A empreitada exige coragem e esforço. Afinal, a cada sessão autor e atores se expõem e avançam em cena às cegas, ou de olhos vendados, como sugere a imagem escolhida pelo autor para ilustrar seu trabalho.

? Não é fácil construir uma estrutura dramatúrgica assim, ainda mais se o texto pode vir a ser traduzido para outras línguas ? diz. ? Preciso considerar diversas possibilidades em diferentes línguas, porque um pequeno erro pode fazer toda a estrutura desabar. É por isso que, quando escrevo, penso simultaneamente em três idiomas, para ter a certeza de que a estrutura funciona.

Até 9 de abril, ?Blank? será apresentada ao lado de mais 29 espetáculos, que compõem tanto a mostra oficial como a nova plataforma do festival, a Movva, dedicada à dança. Para esta edição ? a segunda com curadoria de Abreu e Weber ? o festival apresenta um programa que une entretenimento e reflexão e busca, em seu viés mais engajado, fazer pensar sobre o conceito de alteridade e sobre as lutas e os avanços do feminino e dos movimentos feministas, assim como os dos negros e LGBTQ. Para isso, apresenta um bom punhado de peças escritas, dirigidas ou protagonizadas por mulheres, negros, gays e trans.